Com a sanção da Lei 14.995/2024, que institui o Programa Acredita no Primeiro Passo, além de outras medidas, o acesso ao microcrédito no Brasil deve ser facilitado, com redução da burocracia, juros menores e um estímulo ao empreendedorismo pela população de renda mais baixa que está inscrita no Cadastro Único (CadÚnico) do governo federal. Para este ano, a Caixa Econômica Federal já anunciou um aporte adicional de R$ 300 milhões para financiar o microcrédito em duas regiões — Centro-Oeste e Norte — que vão receber, ambas, a metade deste valor até dezembro. Os recursos têm origem nos fundos constitucionais de financiamento do Norte (FNO) e do Centro-Oeste (FCO). Para o ano que vem, o banco estima um investimento total de R$ 2 bilhões em todo o país. O diretor de produtos de varejo da Caixa Econômica Federal, Luiz Francisco de Barros, explica que a aplicação é uma “oportunidade”, com a sanção da lei, na última semana. “A gente está com um plano bastante ambicioso de atuar nesse mercado de microcrédito”, disse, em entrevista ao Correio. Confira os principais trechos da entrevista:
O que representa e o que levou a Caixa a este novo aporte de R$ 300 milhões em microcrédito ainda em 2024?
Apareceu uma oportunidade, por conta de uma mudança na legislação, no que diz respeito aos recursos do Fundo Constitucional de Financiamento do Norte (FNO) e do Fundo Constitucional de Financiamento do Centro -Oeste (FCO). Então, as instituições financeiras públicas passaram a ter as mesmas condições que os bancos administradores desses fundos, que no caso do FNO, é o Banco da Amazônia, e no caso do FCO é o Banco do Brasil. E dessa maneira, o que aconteceu? Surgiu uma oportunidade da gente operar recursos desses Fundos. FCO e do FNO. Por isso que nós pedimos para esse ano de 2024, R$ 150 milhões de recursos do FNO e R$ 150 milhões de recursos do FCO.
Então, será voltado apenas para o Norte e Centro-Oeste?
Sim, neste primeiro momento. Nós vamos começar operando com FCO e FNO, porque têm algumas condições específicas. São operações em que nós vamos usar o Pronaf-B — que se destina a pequenos agricultores, para a agricultura familiar. É uma operação que não tem risco de crédito. Só tem risco operacional. O Pronaf-B, por exemplo, tem uma taxa de juros de 0,5% ao ano e tem o prazo de até 36 meses. Então, incentiva o pagamento.
Como seria esta estratégia?
A gente montou uma estratégia para começar operando no FNO e no FCO com recurso desses fundos, porque no Nordeste tem um banco público que já opera com os recursos por lá (Banco do Nordeste). Não significa que nós não vamos operar lá, mas priorizamos Centro-Oeste e Norte, onde não tem a aplicação desses recursos. Estamos buscando também outros recursos. Então, nós vamos começar a nossa estratégia com recursos do FCO e do FNO — R$ 300 milhões — para esse ano, aplicando na agricultura familiar, podendo expandir isso para outras regiões do país. Estamos com um plano bastante ambicioso de atuar no microcrédito. Para 2025, foram anunciados mais R$ 2 bilhões para microcrédito na última sexta-feira.
Como será a distribuição deste valor?
A gente tem a intenção, para o ano de 2025, de operar com mais de R$ 1 bilhão. No que diz respeito aos fundos, FCO e FNO, a gente tem os recursos obrigatórios, esses recursos hoje, pelo saldo de depósito à vista que a gente tem aqui no banco, sairia, talvez, por um pouquinho menos de R$ 1 bilhão de recursos por ano. Por isso que o Carlos (Vieira, presidente da Caixa) comentou esse montante da ordem de R$ 2 bilhões.
Durante o discurso de sexta, Vieira revelou que conversa com o ministro Paulo Teixeira sobre a questão da agricultura familiar. O que já pode ser adiantado dessa parceria?
O Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) tem o CAF, que é o Cadastro de Agricultores Familiares. Então o que imaginamos? Com essas duas operações, esse recurso do FCO e do FNO, a gente vai atender, basicamente, pequenos agricultores familiares, com recursos que a gente pretende conseguir, junto ao Orçamento Geral da União, também, para esses pequenos agricultores familiares. Então, a ideia é a gente avançar na questão da agricultura familiar.
Quais são as características principais desse novo impulso ao microcrédito?
A primeira delas é a orientação, que é básica. Ajudar a pessoa a fazer um plano de negócios, para dar tudo certinho. A outra coisa é que essas operações sejam em um prazo mais curto. A gente planeja atuar com operações de 12 meses, porque assim vai girando mais rápido.
E o que pode atrapalhar isso?
O grande problema do microempreendedor, seja na questão rural, seja na questão do urbano, é que, muitas vezes, ele mistura o dinheiro dele com o dinheiro do negócio, e aí recebe dinheiro e compra um celular. Não é nada disso. Na verdade, tem que ter todo um mecanismo para se garantir que ele esteja investindo naquele negócio e que ele possa, obviamente, ter um retorno daquilo.
Como a Caixa atua para impedir que o dinheiro seja aplicado em outras destinações?
Essa é uma das coisas que está bem cravada na nossa estratégia. Vamos imaginar um futuro cliente que vai fazer uma compra. Quando ele faz essa compra, qual é a nossa preocupação? Que ele tenha uma nota fiscal, que ele faça o upload dessa nota, dentro de um aplicativo. Ou seja, a gente libera o recurso e vê liberar diretamente para quem comprou. Então, você vai criando uma série de mecanismos para garantir que ele está bem orientado, que ele tem um plano e que ele não vai misturar as estações: o recurso do negócio com recurso dele, do dia a dia.
O Procred 360 prevê um benefício para as mulheres. Esse é um passo importante para o empreendedorismo feminino?
Isso é muito legal. O empreendedorismo feminino é uma coisa que a gente vê no dia-a-dia. A maioria dos empreendedores informais são mulheres, inclusive, são mães de família, muitas delas que tocam sozinhas a vida com seus filhos, e que estão à frente desse negócio. A lei fala que, no caso das mulheres empreendedoras, em vez de (o limite de crédito) ser de até 30% da renda bruta anual da empresa, pode chegar até 50% da renda bruta anual, respeitadas, naturalmente, as políticas de crédito de cada uma das instituições. Isso vem totalmente ao encontro da realidade do país, em que as mulheres estão à frente dos negócios e estão tendo uma valorização dentro desse processo.
O Brasil ainda carece muito de educação financeira. Como evitar a inadimplência?
O segredo é acompanhar o ciclo do crédito inteirinho, desde o momento em que o cliente está planejando tomar o dinheiro. Depois, ele toma e, eventualmente, se ele não tiver a capacidade de pagamento, ajudar a resolver o problema. Se ele ficar inadimplente, precisa ver como se resolve essa questão. É preciso acompanhar o ciclo do crédito todo, do começo ao fim.