Um dos dados mais importantes no agronegócio brasileiro é o censo agropecuário, feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), desde 1920, mas as mulheres só tiveram sua primeira participação em 1995. Sob o sol escaldante ou sob a chuva que traz alívio e frescor, mais de um milhão de brasileiras, segurando a enxada nas mãos e lenço amarrado nos cabelos, lideram estabelecimentos agropecuários em todo o país.
Ana Euler, diretora de negócios da Embrapa, destacou a atuação dessas mulheres à frente do meio rural brasileiro durante o CB.Agro — uma parceria entre a TV Brasília e o Correio Braziliense — nesta sexta-feira (20/9), em entrevista aos jornalistas Vinicius Doria e Roberto Fonseca. Ela defendeu que a mudança vem do espírito corporativo e das federações e, apesar do meio ser majoritariamente masculino, a presença de mulheres no agronegócio é essencial e está em crescimento.
"O agro ainda é um setor majoritariamente masculino, mas isso vem mudando. Eu acho que vem mudando dentro do próprio espírito corporativo das federações e das associações. Além das duas ministras do agro que já tivemos, acho que também é importante dizer que, depois de 100 anos, também tivemos uma mulher presidente da sociedade rural brasileira que, inclusive é conselheira da Embrapa, a Tereza Vendramini. Ela é uma produtora rural, pecuarista e que muito nos inspira", disse.
Para a diretora, os desafios das mulheres que estão no campo são vários, mas podem ser superados por meio de políticas públicas e qualificação institucional. Euler defendeu que todos precisam estar qualificados para debater sobre equidade de gênero.
"Eu diria que são vários os desafios. Um programa que estamos gestando agora que é exatamente sobre mulheres produtoras, mulheres que promovem o bem-viver tem, por exemplo na Embrapa, um desafio interno que é de qualificação institucional. Às vezes pode-se pensar que para trabalhar com mulher precisa-se ser mulher ou que simplesmente ser mulher já é o suficiente para ter capacidades e ferramentas para promover melhores condições e oportunidades nas cadeias produtivas, mas não necessariamente. Todos nós precisamos entender esse viés de gênero e estar qualificados para interagir em qualquer um dos setores", afirmou.
Ana Euler acredita que falta incentivo técnico e informacional para aumentar a participação de mulheres na alta hierarquia do agro brasileiro. Ela argumentou que mulheres não apenas no Brasil, mas mundo afora, têm menos possibilidade de acesso a crédito do que os homens produtores.
O crédito rural é um financiamento destinado a agricultores e produtores rurais, ele serve para ajudar o custeio da produção e o investimento de propriedades. O crédito, que é fundamental para impulsionar o desenvolvimento do setor agropecuário e, consequentemente, o crescimento econômico do país, é pouco acessado pelas produtoras mulheres. Euler argumentou que não é um acontecimento unicamente no Brasil, mas no mundo inteiro. "O que acontece é que muitas vezes a mulheres estão no estágio inicial da cadeia produtiva, produzindo e comercializando produtos sem muito valor agregado então precisam que se tecnificar melhor, precisam de ajuda para agregar valor, às vezes precisam ser melhor instruídas para acessar o crédito que é fundamental para gerar oportunidades de desenvolvimento econômico. O crédito move a economia e historicamente as mulheres, mas não apenas aqui, mesmo nos Estados Unidos, as mulheres têm muito menos acesso a oportunidades de crédito do que os homens. Isso é importante por que culturalmente não foram educadas ou capacitadas para isso", explicou a diretora.
Euler comentou também sobre como o debate acerca da equidade de gênero, tanto no campo quanto na cidade, precisa ser feito entre sociedade e não apenas em mulheres. Para ela, isso é um processo em transformação e só poderá alcançar resultados satisfatórios se todos participarem. "Às vezes, não é porque não é maioria, mas já está bem melhor do que foi no passado. Essa cultura da mulher na cozinha, da mulher cuidar da família, muitas vezes, é cultura da própria mulher também. Não são só os homens que são machistas. Nós mulheres fomos criadas numa cultura machista. Tem mulheres que não criam seus filhos homens para fazer práticas domésticas com as mulheres, futuramente, suas esposas. Precisamos falar sobre isso, não apenas só entre mulheres, mas entre mulheres e homens, em sociedade e em família", afirmou ela, defendendo que os homens precisam ser parte da solução. "O desafio da equidade de gênero não é um desafio só das mulheres, é um desafio de toda a sociedade. Uma sociedade mais justa, mais equilibrada é melhor para todo mundo", resumiu.
A diretora aposta ainda na coragem das mulheres para desbravar cargos de lideranças no setor agrícola. Para ela, as mulheres têm tudo para conseguir se destacar e vencer no setor também e, nesse sentido, os homens também precisam ser parte da solução. "O desafio da equidade de gênero não é um desafio só das mulheres, é um desafio de toda a sociedade. Uma sociedade mais justa, mais equilibrada é melhor para todo mundo."
*Estagiária sob a supervisão de Rosana Hessel
Saiba Mais
Gostou da matéria? Escolha como acompanhar as principais notícias do Correio:
Dê a sua opinião! O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores pelo e-mail sredat.df@dabr.com.br