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Selic: Indústria cobra queda da taxa básica de juros

Em dia de Copom, dirigentes da CNI e da Fiesp criticam atuação do BC. Governo, por sua vez, publica decreto com corte de gastos, como deseja Campos Neto

No primeiro dia da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), os presidentes da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Ricardo Alban, e da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Josué Gomes da Silva, fizeram coro para que o Banco Central volte a reduzir a taxa básica da economia (Selic), atualmente em 10,50% ao ano.

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Em nota divulgada à imprensa, Alban afirmou que é fundamental que o Banco Central retome o ciclo de cortes nos juros, porque a taxa básica de juros é um dos principais fatores que elevam o custo do crédito no país. “Além da Selic elevada, ainda lidamos com a questão do spread bancário altíssimo, que faz com que o crédito seja ainda mais caro e com pouca oferta no mercado. A indústria é uma das maiores prejudicadas pelo nível das taxas de juros, que dificulta investimentos e a ampliação de capacidade produtiva”, afirmou o presidente da CNI. “No fim, os brasileiros perdem em oportunidades de emprego e aumento de renda, comprometendo o bem -estar da população. Sem reduzir os juros, ficaremos presos nessa armadilha”, acrescentou.

Com base em dados da MoneYou, a entidade destacou que, considerando a atual expectativa de inflação, de 3,8% para os próximos 12 meses, a taxa de juro real está em 6,45% ao ano, sendo a terceira maior do mundo, atrás de Rússia e do México. Apesar de as perspectivas do mercado para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) estarem sendo constantemente revisadas para cima, ficando cada vez mais distantes do centro da meta, de 3%, tanto para este ano quanto para 2025, de acordo com a nota da CNI, o Banco Central precisa levar em consideração na decisão de que a aceleração do indicador da inflação oficial, observada em maio, não se repetiu em junho, “mostrando que aquele movimento não se tratava de uma inflexão abrupta e sustentada na trajetória da inflação”. A prévia da inflação de julho, o IPCA-15, por exemplo, voltou a acelerar e, no acumulado em 12 meses, chegou a 4,45%, próximo ao limite superior da meta, de 4,50%.

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Em encontro com jornalistas, o presidente da Fiesp não poupou críticas ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e afirmou que uma eventual perda da autonomia da autoridade monetária será culpa exclusiva dele que, em 2022, foi votar com camiseta amarela, cor que representava os apoiadores do ex–presidente Jair Bolsonaro (PL). “Ele (Campos Neto) politiza quando aceita ser homenageado (por adversários do governo) estando ainda no cargo de presidente do BC”, disse. Josué ainda comentou sobre a ida de Campos Neto ao jantar oferecido pelo governador de São Paulo, Tarcisio de Freitas (Republicanos), no Palácio dos Bandeirantes, no mês passado.

Josué Gomes é filho do ex-senador José Alencar, que foi vice-presidente nos dois primeiros mandatos de Lula, de 2003 a 2010. A exemplo do que Lula faz agora, Alencar, que morreu em 2011, sempre foi um crítico feroz das altas taxas de juros praticadas no Brasil. De acordo com o presidente da Fiesp, Campos Neto politiza a atuação do BC quando vai a eventos no exterior e sinaliza que vai aumentar a taxa de juro, “desmontando” o forward guidance (indicação dos passos futuros da política monetária) de forma intempestiva, sem combinar com os demais diretores do banco, a ponto de surpreender um desses executivos, que estava a seu lado.

Além disso, ele reconheceu que Lula também “politiza” as questões relacionadas à política monetária quando faz críticas públicas a Campos Neto. No entender dele, isso ocorre porque o atual presidente não tem alguém como o seu pai ao lado dele.

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O presidente do BC, por sua vez, vem demonstrando preocupação com a política fiscal, conduzida pela equipe econômica do governo Lula, o que retardaria a flexibilização da política monetária. Dados do Banco Central mostram que o rombo fiscal e a dívida pública bruta seguem crescendo e retomaram patamares da pandemia da covid-19.

Enquanto isso, o mercado financeiro, que aposta na manutenção da taxa Selic no atual patamar, assim como na estabilidade dos juros dos Estados Unidos nesta “super-quarta”, deu sinais ambíguos com quedas tanto na Bolsa de Valores de São Paulo (B3) quanto no dólar. O Índice Bovespa, principal indicador da B3, recuou 0,64%, ontem, para 126.973 pontos. A divisa norte-americana, por sua vez, desvalorizou 0,15%, para R$ 5,617 para a venda.

Roberto Simioni, economista-chefe da Blue3 Investimentos, não vê uma tendência de subida da Selic até o fim do ano. Para ele, o Copom deverá manter a taxa no atual patamar até o fim da gestão de Campos Neto, que termina em dezembro. “Os desafios do ambiente econômico são similares aos enfrentados na última ata do Copom. No ambiente externo, vemos bancos centrais buscando a convergência das suas respectivas inflações às metas dentro de um cenário ainda pressionado pelo mercado de trabalho e por dados de atividade econômica que precisam ser melhorados”, afirmou. “No âmbito local, o efeito positivo de todo o processo de redução de juros promovido pelo Banco Central nos últimos meses, a retomada da atividade nos últimos trimestres e o crescimento da oferta de crédito, aquece o consumo. Porém, temos um maior endividamento das famílias, o que coloca (aos poucos) o futuro da inflação sob uma condição mais desafiadora. Diante disso, o Banco Central ajustou suas projeções de inflação para 2024 e 2025”, alertou.

Simioni ressaltou que é necessário que haja uma política fiscal crível e comprometida com a sustentabilidade da dívida. “Sem isso, não haverá processo de ancoragem das expectativas inflacionárias ou redução do prêmio de risco dos ativos financeiros”, alertou. Na avaliação dele, sem esse esforço coordenado de política monetária e de política fiscal, “a desancoragem das expectativas criará para dentro do segundo semestre e do início de 2025 um ajuste nos preços dos ativos, diante do cálculo de risco, e a perda de uma oportunidade de crescimento econômico”.

Corte de gastos

Já se aproximava das 23 horas, ontem, quando o governo publicou o decreto detalhando a contenção de R$ 15 bilhões no Orçamento deste ano. Conforme os dados publicados, em edição extra do Diário Oficial da União (DOU), o Ministério da Saúde foi o que sofreu o maior corte de despesas, de R$ 4,4 bilhões. Em seguida, o Ministério das Cidades, com tesourada de R$ 2,1 bilhões; o Ministério dos Transportes, com redução de R$ 1,5 bilhão de gastos e, em quarto lugar, o Ministério da Educação, com contenção de R$ 1,3 bilhão.

“A distribuição por órgão teve como diretrizes a preservação das regras de aplicação de recursos na Saúde e na Educação (mínimos constitucionais), a continuidade das políticas públicas de atendimento à população e o compromisso do governo federal com a meta de resultado fiscal estabelecida para o ano de 2024”, informou a nota do Ministério do Planejamento e Orçamento. Cada órgão tem até o dia 6 de agosto para definir os cortes. O corte inclui R$ 9,2 bilhões de despesas discricionárias do Executivo e R$ 4,2 bilhões em gastos discricionários do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O restante, de emendas parlamentares de bancadas e de comissão. (Com informações da Agência Estado)

 

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