A equipe econômica do governo confirmou o novo corte de R$ 15 bilhões no Orçamento deste ano para conseguir cumprir uma meta fiscal mais frouxa, após aumentar em R$ 20,7 bilhões as estimativas de despesas no Orçamento deste ano. Técnicos evitaram criticar a política de valorização do salário mínimo, que ajudou a explodir os gastos previdenciários e ainda colocaram a culpa na prorrogação da desoneração da folha como um dos principais fatores que justificam a contenção de despesas.
O valor do corte foi antecipado, na semana passada, pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. “A desoneração da folha de pagamentos está pesando bastante na arrecadação até este momento”, afirmou o secretário da Receita Federal, Robinson Barreirinhas, ontem, a jornalistas. Ele participou da apresentação do relatório de avaliação de receitas e despesas do terceiro bimestre de 2024, ao lado do Secretário de Orçamento Federal substituto, Clayton Luiz Montes, e do Secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron.
De acordo com Barreirinhas, com base nos dados do Fisco desde janeiro até o dia 20 deste mês, o volume estimado de perdas de receita com a desoneração da folha é de R$ 26,2 bilhões. Desse total, R$ 15,7 bilhões são referentes à isenção fiscal dos 17 setores beneficiados com a medida, e outros R$ 10,5 bilhões, com a renúncia fiscal a favor de municípios de até 156,2 mil habitantes. “Essas projeções de receita são feitas pelos técnicos da Receita a partir de metodologia distinta das estimativas feitas pelo Congresso”, disse o titular da Receita Federal.
Barreirinhas adiantou que, amanhã, deverá divulgar o resultado da arrecadação de junho com aumento nominal de 15,75% na comparação com o mesmo mês de 2023, e, real (descontada a inflação) de 11,2% e, no acumulado de do ano, de 13,6%. Novas projeções Os parâmetros macroeconômicos do relatório bimestral de avaliação de receitas e despesas foram atualizados e a previsão de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) passou de 2,45% para 2,54% e as estimativas para a inflação oficial, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) deste ano passaram de 3,7% para 3,9%. Conforme os dados do relatório, a previsão de receita líquida neste ano encolheu R$ 13,2 bilhões na comparação com a projeção anterior, para R$ 2,268 trilhões. Mas receitas extraordinárias, como as ações do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), tiveram redução ainda maior nas projeções, passando de R$ 55 bilhões para R$ 37 bilhões devido à diminuição do prazo previsto para o pagamento das negociações, de acordo com Barreirinhas.
A estimativa para as despesas deste ano cresceu R$ 20,7 bilhões, para R$ 2,229 trilhões. E a previsão para o resultado primário para este ano passou a ser um um deficit primário de R$ 14,5 bilhões para R$ 32,6 bilhões. E, para adequar a programação orçamentária ao novo arcabouço fiscal, o governo precisará fazer um bloqueio de R$ 11,2 bilhões em decorrência do aumento de despesas obrigatórias (Benefícios de Prestação Continuada (BPC) e benefícios previdenciários, de acordo com os órgãos.
Segundo técnicos da equipe econômica, as variações para o BPC foram de R$ 6,4 bilhões, que decorre principalmente do aumento nos quantitativos de benefícios concedidos face ao Programa de Enfrentamento à Fila da Previdência Social. Já os benefícios previdenciários apresentaram uma variação de R$ 4,9 bilhões, que justificada, principalmente, “pelo fato de as despesas dos últimos dois meses terem sido executadas acima do previsto inicialmente em decorrência de mudanças de fluxos internos e comportamentos inesperados de entrada de pedidos”, considerando a dotação prevista de R$ 927 bilhões. A previsão financeira dos benefícios previdenciários cresceu R$ 8 bilhões em relação ao relatório anterior, somando R$ 923,1 bilhões.
O novo corte no Orçamento, de R$ 15 bilhões, ainda ficou abaixo do necessário para o cumprimento da meta fiscal de deficit zero neste ano, de acordo com analistas que apontam a necessidade de cortes adicionais nos próximos meses. Pelas contas da economista Tatiana Pinheiro, economista-chefe da Galapagos Capital, o relatório continua otimista pelo lado da arrecadação e, portanto, “seria necessário um contingenciamento de R$ 33 bilhões” em vez da contenção de R$ 15 bilhões.
Os especialistas ainda olham com preocupação o fato de, agora, o governo perseguir o limite inferior da meta fiscal, que permite um rombo de até 0,25% do PIB, ou R$ 28,8 bilhões, em vez do deficit zero. Ao serem questionados sobre isso, os secretários negaram qualquer afrouxamento no compromisso fiscal e minimizaram a preocupação de analistas sobre o afrouxamento da meta. “Eu gostaria de enfatizar que o centro da meta está sendo buscado, continua sendo buscado e vai ser buscado sim”, afirmou Clayton Montes, acrescentando que essa mudança é resultado da interpretação de leis complementares com a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e da Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO).
Segundo ele, é crível que o governo conseguirá, neste ano, reduzir as despesas em R$ 9 bilhões com a revisão de sim poderia especificar melhor a questão do contingenciamento, que deveria ser realizado apenas no valor que supera o limite mínimo da conta.
O secretário do Tesouro Nacional também minimizou o afrouxamento da meta pela banda. “A meta está sendo cumprida e o objetivo fiscal para o exercício será cumprido. Não tenho dúvidas”, afirmou. Segundo ele, o próprio Marco Fiscal estabelece essa possibilidade da amplitude da meta, e portanto, ela precisa ser observada. “Não há qualquer tipo de relaxamento ou afrouxamento para isso”, reforçou Ceron.
A especialista em contas públicas Vilma Pinto, diretora da Instituição Fiscal Independente (IFI), contudo, fez um alerta sobre o relatório divulgado ontem. “O relatório apresentado materializa alguns riscos apontados nos relatórios da IFI nos últimos meses, A questão do crescimento das despesas obrigatórias em ritmo diferente do crescimento das despesas limitadas pela regra do arcabouço fiscal”, disse.
Na avaliação do economista-chefe da Warren Investimentos, Felipe Salto, os benefícios previdenciários continuam subestimados em R$ 9 bilhões, mas as despesas obrigatórias com controle de fluxo parecem conter um espaço fiscal. O fato é que, mesmo após a revisão das projeções de receitas, as despesas com controle de fluxo (alguns itens desse grupo são vinculados à receita) permaneceram em R$ 359,5 bilhões”, afirmou. Ele destacou que a despesa discricionária (não obrigatória) foi revisada para baixo em R$ 8,3 bilhões, para R$ 200,4 bilhões, sem contar os R$ 3,8 bilhões em contingenciamento necessário indicado no relatório e o bloqueio de R$ 11,2 bilhões. “Total após contingenciamento, bloqueio e revisão já contida no relatório chega a R$ 23,3 bilhões de redução das despesas discricionárias”, acrescentou.
Decreto
O detalhamento dos cortes por órgão e ministérios, constará de anexo ao Decreto de Programação Orçamentária e Financeira que será publicado no próximo dia 30, no Diário Oficial da União (DOU). Após a publicação do decreto, os órgãos terão cinco dias úteis para indicar as programações a serem bloqueadas ou contingenciadas, de acordo com a equipe econômica.
Ao ser questionado pelo Correio se o presidente Lula escolheu alguma despesa ou pasta que fosse poupada dos cortes, Ceron disse que não houve essa determinação do chefe do Executivo. “A discussão não foi posta. Não foi discutido com o presidente o detalhamento dos cortes. O processo decisório vai acontecer ao longo da semana para ser feita a publicação do decreto de programação orçamentária”, explicou. Os secretários informaram que cada órgão precisará definir quais as despesas discricionárias (não obrigatórias) e emendas parlamentares que serão cortadas para atingir o bloqueio e o contingenciamento de R$ 15 bilhões previsto no Orçamento.
A ministra do Planejamento, Simone Tebet, em entrevistas recentes, garantiu que os investimentos em saúde e educação serão preservados, assim como as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) já iniciadas. A meta fiscal deste ano permite um rombo de até 0,25% no PIB e limita o crescimento das despesas em 70% da expansão das receitas, com limite de 2,5% de aumento real (descontada a inflação).
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