Dívida dos estados

Dívida dos estados leva a nova queda de braço entre Haddad e Pacheco

Ministro afirmou não se negar a rever o indexador, desde que seja mantido o equilíbrio das contas. O presidente do Senado, por sua vez, refutou que não tenha havido negociação. Já AGU pediu, no STF, que Minas volte a pagar a dívida

O projeto de renegociação de dívida dos estados, apresentado pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), promete ser mais um caldo entornado na difícil relação entre o governo e o Parlamento. Ontem, em sabatina no mesmo evento, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad e o autor do projeto, mandaram recados mútuos sobre o tema.

Em paralelo, a Advocação-Geral da União, apresentou ao Supremo Tribunal Federal (STF) o pedido para que o governo de Minas Gerais — estado de Pacheco — retome o pagamento da dívida com a União, paralisado desde 2018.

Em sua fala no 19º Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo, Haddad admitiu que o indexador de IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) 4%, como é usado atualmente, é "insustentável", mas será preciso criar uma nova fórmula que não comprometa as contas federais, como faz o programa criado por Pacheco.

"Penso que 4% de juro real em cima do IPCA é realmente insustentável, porque a arrecadação não cresce 4% ao ano. Eu sou a favor, eu entendo o pleito dos governadores. Mas você não pode cobrir a cabeça e descobrir o pé, você tem que fazer um jogo que acomode as contas estaduais sem prejudicar as contas nacionais, esse é o meu ponto de vista. No meu entendimento, o projeto apresentado precisa passar por uma revisão", disse.

A proposta do Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag) tem como base a redução dos juros das dívidas a partir da entrega de ativos pelos entes ao governo federal e compromisso de investimentos públicos. Atualmente, os débitos dos governos estaduais com a União são corrigidos pela variação da inflação mais 4% ao ano.

O texto de Pacheco propõe que os 4% sejam calculados de diferentes formas: Com 1% revertido em investimentos em educação, infraestrutura e segurança; 1% para um fundo de equalização ainda a ser criado; 1% perdoado, caso o estado devolva de 10% a 20% da dívida; e 2% perdoados se entregar mais de 20%.

Sendo assim, pode acabar havendo uma redução da taxa de juros paga ao governo para 1%, mantendo o IPCA na fórmula de correção monetária. O temor é em relação ao impacto direto nas contas primárias. "O presidente Pacheco apresentou um texto diferente da Fazenda, com parâmetros que destoam daquilo que nós imaginávamos", argumentou Haddad.

"Eu tive a oportunidade de, muito cordialmente, conversar com ele na sala do presidente da República, e nós combinamos de tentar sentar junto ao relator para ajustar o texto, inclusive porque o texto apresentado tem impacto nas contas primárias do governo federal. Fora a questão da trajetória da dívida", contou o ministro.

Diálogo

Na sua vez, Pacheco disse estar "aberto ao diálogo" com o governo, mas rebateu as falas de Haddad, ao afirmar que a proposta foi amplamente debatida. O parlamentar cobrou da pasta que seja "propositiva" e traga soluções. "Alguns pontos aqui ou acolá podem ser melhorados na redação, nós estamos totalmente abertos a isso. Mas, na essência, isso foi muito discutido com o Ministério da Fazenda, que esteve mais de uma vez comigo, inclusive na residência oficial do Senado Federal, para debater esse tema", contou.

Em tom mais duro, o parlamentar disse que não vai aceitar que o Senado seja chamado de "irresponsável fiscal" e classificou como "asneiras" as especulações de que a proposta causaria um rombo aos cofres públicos. "O que espero do Ministério da Fazenda e do governo federal é que tenham a decência de desmentir as mentiras que estão sendo ditas sobre o projeto", alfinetou o senador.

O chefe da Casa Alta reforçou que as dívidas hoje são impagáveis. "O projeto nada mais é do que a possibilidade de o estado pagar a dívida, entregando ativos, [além de] uma correção do indexador da dívida", pontuou. São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Goiás lideram a lista dos maiores devedores. Somada, a dívida de todos os estados e do Distrito Federal é estimada em R$ 764,9 bilhões.

No Supremo

No final do dia, a AGU enviou ao STF a manifestação na qual defende que eventual nova prorrogação do prazo para o ingresso do estado de Minas Gerais no Regime de Recuperação Fiscal (RRF) esteja condicionada à observância das contrapartidas previstas no programa e, em especial, à retomada do pagamento das parcelas de refinanciamento do débito com a União.

O governador Romeu Zema havia pedido ao Supremo que o início dos pagamentos fosse postergado até a regulamentação do programa em discussão no Congresso Nacional, ou ao menos até a retomada do julgamento pelo STF da ação em que o estado pede a prorrogação de prazo.

O retorno do tema à pauta da Corte está previsto para o dia 28/08. O STF já concedeu duas prorrogações para o início do pagamento da dívida mineira, primeiro por 120 dias e depois por 90 dias.

Na manifestação ao STF, a AGU sustenta que o estado de Minas Gerais ainda não atendeu plenamente às contrapartidas de reequilíbrio fiscal exigidas para a adesão ao RRF, e que a prolongada falta de amortização da dívida tem a consequência de agravar a situação financeira do estado.

Extremismo

Ainda no Congresso, Haddad comentou sobre as eleições presidenciais nos Estados Unidos, e afirmou que o ex-presidente Donald Trump é um "risco à democracia". "Está provado, ninguém está inventando nada. A pessoa fomentou uma reação ao resultado eleitoral, que ele nunca reconheceu. Ele nunca reconheceu. E no debate, agora, ele também disse que não aceitaria o resultado", disse.

O ministro se esquivou de opinar sobre a possibilidade do atual presidente norte-americano e candidato à reeleição, Joe Biden, desistir da candidatura. Ele argumentou ainda que as instituições brasileiras demonstraram mais força em comparação com as dos Estados Unidos frente à extrema direita, ao lembrar da invasão ao Capitólio em 2021.

 

Mais Lidas