O Banco Central entra na contagem regressiva de nova reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que ocorrerá nos dias 18 e 19 deste mês. Entre os analistas, crescem as apostas de que, por enquanto, o ciclo de redução da taxa básica da economia (Selic), iniciado em agosto de 2023, deve estacionar nos atuais 10,50% ao ano, pelo menos, até o fim deste ano.
Se confirmada a decisão, o processo de desaceleração da atividade econômica, que está em curso, passará a ser mais concreto e o mercado não descarta até mesmo um aumento dos juros neste ano.
As previsões mais recentes da taxa Selic têm piorado devido ao aumento das incertezas no mercado externo e também pela mudança nas metas fiscais pelo governo. O entendimento dos agentes financeiros foi de que o compromisso com o equilíbrio das contas públicas ficou no discurso do ministro da Fazenda, Fernando Haddad. A avaliação é de que, na prática, o governo petista segue expansionista, gastando mais do que arrecada — mesmo com aumentos sucessivos na receita tributária — e deixando para o futuro o ônus do aumento do endividamento público.
O aumento das incertezas internas e externas — que estão sendo puxadas pelos sinais do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) de que os juros na maior economia do planeta tendem a ficar elevados por um período mais prolongado — contribuiu para que US$ 35 bilhões em recursos estrangeiros deixassem a Bolsa de Valores de São Paulo (B3) neste ano.
As projeções macroeconômicas pioram, apesar das surpresas positivas da atividade, com o Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre levemente acima das expectativas — em grande parte, por conta dos estímulos fiscais e do impacto positivo do processo de redução de juros, que demora a ser percebido na economia —, não há muito otimismo nas estimativas recentes.
O impacto das enchentes no Rio Grande do Sul na atividade ainda é uma incógnita, mas há um consenso em formação de que a pressão nos preços dos alimentos não deverá ser elevada. Além disso, depois de crescer 0,8% no primeiro trimestre, o carregamento estatístico desse PIB para o resto do ano ficou em 1%, ou seja, mesmo se não houver crescimento nos meses seguintes, o PIB deverá registrar alta de 1% no acumulado do ano.
Analistas reconhecem ainda que a atividade econômica segue desacelerando o ritmo de crescimento desde 2021 e um dos desafios para o país será conseguir crescer acima do potencial, em torno de 2%, sem que a inflação avance junto. Caio Megale, economista-chefe da XP Investimentos, por exemplo, manteve as projeções para o PIB deste ano, com avanço de 2,2%, mas não descarta a desaceleração para 1,7%, no ano que vem, em grande parte devido ao cenário cada vez mais incerto, tanto doméstico quanto no exterior.
"O que está acontecendo é um impulso importante no PIB com a turbinada de alguns programas e com a queda dos juros que aconteceu no ano passado. O efeito dos cortes na Selic está aparecendo e a atividade deve seguir firme e mais resiliente do que o esperado", destaca.
Ele reconhece que as dúvidas em relação ao quadro fiscal ocorrem porque as despesas do governo aumentam em ritmo mais forte do que a inflação e, mesmo que a arrecadação do governo continue crescendo, as contas públicas continuam no vermelho. "O mercado de trabalho continua forte, o que é uma boa notícia, mas será que esse quadro é compatível para o BC conseguir entregar uma inflação de 3%, que é a meta?", questiona.
Pelas estimativas de Megale, se a economia continuar forte como no primeiro trimestre e o custo de vida ficar em torno de 4% e 4,5%, o Banco Central deverá manter a Selic em 10,50% até 2025. "O mercado já aposta, nos juros futuros, em alta na Selic no ano que vem. Mas, acho que não precisa tanto e prevemos que o Banco Central vai deixar os juros em 10,50% ao ano. Agora, se a inflação cair, ou ficar parada, e a atividade começar a desacelerar, aí haverá espaço para o Copom cortar um pouco mais (a Selic)", afirma o economista.
Inflação acima da meta
As projeções para a inflação oficial, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) deste ano e no próximo estavam em queda, mas voltaram a subir e estão acima do centro da meta, de 3%. Em algumas previsões já estão acima de 4% e podem se aproximar do teto, de 4,5%. No último Boletim Focus, do Banco Central, a mediana das projeções do mercado vem subindo há quatro semanas e está em 3,88%. A mediana para a taxa Selic no fim do ano passou de 10% para 10,25% anuais. Enquanto isso, as projeções de crescimento do PIB, neste ano e no próximo, estacionaram em torno de 2%.
"O Copom tem deixado claro que o problema é a desancoragem das expectativas, não a inflação corrente. Assim, mesmo com um IPCA favorável que deverá ser divulgado nesta semana, a tendência do Comitê será de manter a Selic onde está", afirma José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator.
Para ele, os juros não estarão mais altos, mas ficarão onde estão por um tempo maior. "Isto é, os efeitos defasados e cumulativos da queda já realizada devem continuar a ajudar a atividade", acrescenta ele, que também prevê a Selic encerrando o ano em 10,50% anuais.
Apesar dos ruídos no mercado com algumas declarações do ministro Haddad sobre a meta de inflação, classificando-a de "exigentíssima", Caio Megale, da XP, acredita que o governo não deverá radicalizar e tentar mudar a meta atual.
Mudança na gestão do BC
O mandato do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, — que tem sido elogiado pelos analistas por uma condução independente do mercado e do governo, mas vem sendo extremamente criticado por Lula e integrantes do partido do presidente — termina em dezembro.
Lula poderá indicar outros dois diretores, totalizando sete dos nove integrantes do Copom. Logo, as incertezas são grandes sobre quem ficará no comando do BC e se a autoridade monetária continuará independente das pressões do governo para aumentar o ritmo de corte dos juros. O mais cotado para assumir o cargo até o momento é o diretor de Política Monetária, Gabriel Galípolo, ex-secretário da pasta comandada por Haddad.
Eduardo Velho, economista-chefe da JF Trust Gestora de Recursos, reconhece que a mudança do comando do BC continua no radar dos analistas do mercado, especialmente para 2025. "Há o risco ainda de uma tentativa de alguma intervenção indireta e de haver uma forçada na queda dos juros. Mas o que vai definir isso é a inflação. Na verdade, eu acho que até Junho do ano que vem até bem factível o BC manter o juros, mas dizer que eles não vão cair no semestre 2025, no ano pré-eleitoral, acho difícil. Vamos ver", destaca.
Para Gustavo Cruz, estrategista-chefe da RB Investimentos, existe uma pressão grande na curva de juros para que o Copom pause o corte na taxa Selic. "Mas isso não significa que o Banco Central vai manter os juros em 10,5% até o fim de 2024. Imagino que se o Fed começar a cortar juros em setembro, o Copom ainda poderia reduzir a Selic em novembro e dezembro", explica.
Cruz ainda faz um alerta sobre os riscos dos juros mais elevados para a atividade. "Os dados do mercado de crédito divulgados seguem mostrando um comprometimento de 48% da renda das famílias, em 12 meses, com empréstimos. Logo, existe pouco espaço para mais endividamento das famílias. Além disso, as empresas estão criticando abertamente a taxa de juros elevada e reduzindo possibilidades de investimentos", acrescenta.
Na contramão, o consultor André Perfeito, ex-economista-chefe da Necton Investimentos, acredita que o mercado poderá errar novamente ao apostar em juros cada vez mais altos no Brasil. "Acredito que sim por alguns motivos,mas o principal é que quando cortarem a taxa básica nos EUA vai se criar um clima que era para cortar mais aqui", afirma. Ele destaca que, no ano passado, o mercado financeiro errou no início do ano ao apostar em uma Selic mais elevada por muito tempo e para corrigir o erro "virou a mão" para um otimismo exagerado.
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