DESONERAÇÃO DA FOLHA

Desoneração da folha: governo espera vitória "razoável" com judicialização no Supremo

Expectativa de integrantes do governo é de que o ministro Cristiano Zanin seja o relator do pedido de judicialização da desoneração da folha — e ele pode ter uma avaliação parecida com a da Fazenda e da AGU

Cristiano Zanin -  (crédito: Carlos Moura/SCO/STF)
Cristiano Zanin - (crédito: Carlos Moura/SCO/STF)

A judicialização da desoneração da folha — prorrogada até 2027 pelo Congresso, sem previsão de receita equivalente —, está dando o que falar, gerando protestos dos segmentos beneficiados, mas recebendo elogios de especialistas em contas públicas. O governo, aliás, está otimista em conseguir uma vitória “razoável” no Supremo Tribunal Federal (STF) na ação protocolada no Supremo pela Advocacia-Geral da União (AGU) questionando a prorrogação do benefício que pode gerar mais de R$ 20 bilhões em despesas adicionais anuais para os cofres públicos. 

O ministro Cristiano Zanin, indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), no ano passado, para o STF, é o cotado para ser o relator da matéria. A expectativa de técnicos do governo é de que o ex-advogado de defesa do presidente no processo da Lava-Jato deverá sinalizar a mesma visão da Fazenda e da AGU em relação à inconstitucionalidade do benefício, que estava previsto para acabar neste ano e pressiona os cofres da União, que precisou mudar a meta fiscal diante da expectativa de frustração de receitas neste ano.

Apesar de analistas avaliarem que o governo acabou jogando a toalha nesse assunto junto ao Congresso e apelou para o Judiciário, fontes do governo negaram isso. “Judicializar foi a única saída que restou. Não foi jogar a toalha”, destacou.

No Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2025, enviado ao Congresso no último dia 15, a equipe econômica reduziu a meta fiscal do próximo ano, de um superavit primário (economia para o pagamento dos juros da dívida pública) de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) para zero, adiando para o último ano do mandato a volta das contas públicas para o azul.

Com a prorrogação do benefício, 17 setores da economia tiveram a alíquota previdenciária reduzida de 20% para 1,5% a 4,5% do faturamento até 2027. Já os municípios com população de até 156 mil habitantes sem programa próprio de Previdência Social foram beneficiados com a redução de 20% para 8% na alíquota da contribuição sobre a folha.

"A desoneração da folha foi um equívoco completo. A sua prorrogação, pior, é inconstitucional, porque fere a própria reforma da previdência, ao prorrogar contribuição sobre faturamento. Além disso, confronta a Lei de Responsabilidade Fiscal, porque não prevê compensação. Daí porque está correto o Executivo ao judicializar. Se o Congresso avança sem considerar essas questões essenciais, que o STF entre para corrigir isso, a meu ver”, afirmou Felipe Salto, economista-chefe da Warren Investimentos, ao Correio. Pelos cálculos dele, o custo para o erário com essa medida poderá ficar entre R$ 16 e R$ 20 bilhões, incluindo a desoneração dos municípios.

O saldo das despesas a mais com a desoneração dos municípios gera um impacto adicional de mais de R$ 10 bilhões ano nas contas da equipe econômica que, recentemente, precisou mudar a meta fiscal para tentar cumprir as regras do novo arcabouço fiscal, aprovado também pelo Legislativo no ano passado.

Derrubada de veto

Em comunicado da Warren para os clientes, o especialista em contas públicas lembrou que a prorrogação do modelo da desoneração atual, como fez o Congresso Nacional ao derrubar o veto presidencial, promove justamente a volta dos tributos sobre faturamento, “um regime que só fora autorizado até o prazo previsto quando da promulgação da emenda da reforma”.

Salto ressaltou que há uma questão técnico-jurídica adicional bastante relevante: a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF, ou Lei Complementar nº 101/2000) proíbe a aprovação de legislações que tenham impacto fiscal sem a devida compensação. “No caso da desoneração setorial e da redução de alíquota para os municípios, esse princípio é confrontado. Ademais, não se pode promover uma medida que desguarnece a Previdência Social sem indicar as fontes substitutas para o financiamento das suas despesas, que são obrigatórias”, acrescentou.

O economista da Warren destacou também que, em relação ao PL dos municípios, ainda não há relator. “A aproximação das eleições municipais é a peça-chave para o tema ficar parado na Câmara. Destacamos que não há um prazo para o STF se posicionar. Haverá um sorteio para definir o relator na Suprema Corte”, acrescentou.

Críticas da CMN

A Confederação Nacional de Municípios (CNM) repudiou a judicialização da desoneração da folha. Em nota divulgada na quarta-feira, a entidade criticou a decisão do governo federal de entrar com a AGU no STF contra a medida. “É lamentável retirar a redução da alíquota para aqueles que estão na ponta, prestando serviços públicos essenciais à população, enquanto há benefícios a outros segmentos, com isenção total a entidades filantrópicas e parcial a clubes de futebol, agronegócio e micro e pequenas empresas”, escreveu o presidente da entidade, Paulo Ziulkoski.

Segundo a CNM, o movimento municipalista reitera que a Lei 14.784/2023, que prorrogou a desoneração da folha até 2027, "garantiu uma economia de R$ 2,5 bilhões, nos primeiros três meses do ano, do total de R$ 11 bilhões estimados para 2024". O presidente da entidade informou ainda no comunicado que a instituição atua ainda pela aprovação de emenda à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 66/2023, que trata da desoneração da folha de pagamento dos municípios “e de outros desafios relativos à Previdência”.

“A proposta da Confederação à PEC 66 sugere incorporar junto ao novo parcelamento previdenciário das dívidas com os Regimes Geral e Próprio de Previdência Social, e ao novo regime especial de precatórios, a extensão aos municípios da última reforma previdenciária realizada para a União. Também trata da desoneração da folha dos municípios, propondo que a alíquota patronal do RGPS seja de 8% em 2024, 10% em 2025, 12% em 2026 e 14% a partir de 2027”, acrescentou.

Ziulkoski ainda informou que a entidade apresentou a proposta ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad; ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco; ao ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha; ao secretário-executivo do Ministério do Planejamento e Orçamento, Gustavo Guimarães; além de lideranças no Senado.

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postado em 25/04/2024 19:13 / atualizado em 25/04/2024 19:27
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