Reuniões de organismos multilaterais costumam terminar junto com a divulgação de uma declaração conjunta, mas não é o que tem acontecido sob a presidência do Brasil no G20. A 1ª reunião de ministros de finanças e presidentes de Bancos Centrais do grupo, que aconteceu na semana passada em São Paulo, terminou mais uma vez sem consenso entre os países-membros.
Segundo o chefe da equipe econômica, ministro Fernando Haddad, o grupo convergiu nos temas financeiros, mas o alvo do impasse foram novamente as questões geopolíticas que envolvem os conflitos na Ucrânia e na Faixa de Gaza, que se sobrepõem à pauta econômica. O mesmo aconteceu na reunião de ministros das Relações Exteriores do G20, realizada na semana anterior, no Rio de Janeiro, que também terminou sem comunicado.
Para Cristina Pecequilo, professora de relações internacionais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), o saldo do encontro foi positivo em termos de agenda, mas traz um alerta para um risco de esvaziamento das prioridades econômicas ao longo da presidência brasileira do grupo. “Parece que essas pautas prioritárias, como taxação dos super-ricos, assim como a do comércio internacional, acabam ficando em segundo plano. Isso deixa uma certa preocupação para a reunião de novembro, dos chefes de Estado, de que há um risco de esvaziamento ao longo do tempo”, avaliou.
Pecequilo destacou que é impossível desconectar geopolítica e geoeconomia, como o Brasil tentou fazer no encontro dos ministros das finanças. “O que houve foi uma dificuldade em estabelecer consensos por conta de questões geopolíticas e não necessariamente ligadas à economia. Parece que existe esse descolamento de prioridades”, avaliou.
Tensões
Segundo a professora, não será possível avançar na pauta econômica enquanto as tensões ainda estiverem em primeiro plano: “A geopolítica, muitas vezes, foi colocada como um pano de fundo e se teve a ilusão de que daria para resolver o campo econômico sem levar em conta a questão do poder e do território. Mas esse momento, após 2022, mostrou que isso é impossível.”
Diante do fracasso na construção de um comunicado conjunto oficial, o governo brasileiro emitiu o “Resumo do Presidente”, com as conclusões das reuniões. O documento aponta que a probabilidade de uma desaceleração suave na economia global aumentou e destaca que as perspectivas de crescimento no médio prazo permanecem moderadas, com estimativas indicando uma estabilização do crescimento econômico global em níveis mais baixos.
O economista Denis Medina, professor da Faculdade do Comércio (FAC), avaliou que o texto destacou pontos importantes sobre os desafios no âmbito econômico que acabaram anulados. “O comunicado começa trazendo vários pontos de sinergia entre os integrantes, mas em determinado momento, traz os riscos que anulam todos eles. Fala de cooperação internacional, mas entre riscos de guerras e conflitos, fragmentação geopolítica, aumento de protecionismo, interrupção de rotas comerciais”, disse.
O principal desafio, de acordo com os países, é encontrar medidas que estimulem o crescimento econômico, mantenham a sustentabilidade dos orçamentos e criem reservas. “Reiteramos a necessidade de políticas fiscais, monetárias, financeiras e estruturais bem calibradas e comunicadas para promover políticas fortes, sustentáveis, crescimento equilibrado e inclusivo, manter a estabilidade macroeconômica e financeira e ajudar a limitar as repercussões negativas”, destaca o resumo.
Em uma nota incluída no rodapé, o Brasil afirmou que os ministros trocaram opiniões sobre os conflitos e crises humanitárias em curso, mas a presidência brasileira do G20 “observou que a trilha das finanças não é o fórum mais apropriado para resolver questões geopolíticas e propôs que essas questões continuem a ser discutidas em fóruns e reuniões relevantes.”
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