Desigualdade

Países do G20 tributam quatro vezes mais no consumo do que na riqueza

Documento a ser divulgado nesta terça-feira pela Oxfam revela que cada dólar arrecadado com tributação por países do G20, menos de oito centavos vêm de impostos sobre as fortunas, enquanto mais de 32 são oriundos de impostos sobre consumo

As vinte maiores economias do mundo arrecadam quatro vezes mais impostos sobre o consumo do que com a taxação sobre riqueza. Segundo pesquisa a ser divulgada pela Oxfam nesta terça-feira (27), a cada dólar arrecadado com tributação por países do G20, menos de oito centavos vêm de impostos sobre as fortunas, enquanto mais de 32 são oriundos de impostos sobre produtos e serviços, ou seja, sobre o consumo, que impacta principalmente as famílias mais pobres. Taxas sobre a riqueza incluem propriedades, heranças, fundos, entre outras posses.

O levantamento é publicado às vésperas da reunião com ministros das finanças e presidentes de Bancos Centrais do G20, que ocorre na quarta e quinta-feira em São Paulo. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que preside o encontro, declarou recentemente que o Brasil vai propor ao bloco a criação de uma taxação global aos super-ricos.

O estudo revela ainda que, nos últimos quarenta anos, houve um movimento de aumento da renda da população mais rica, mas com uma diminuição nos impostos pagos por ela. O crescimento da renda do 1% mais rico foi de 45%, enquanto as taxas caíram de 60% em 1980 para 40% em 2022. Em alguns países, como Brasil, Estados Unidos, França, Reino Unido e Itália, os super-ricos pagam uma taxa menor de impostos do que o trabalhador médio.

Os países do G20 reúnem quatro dos cinco bilionários mais ricos do mundo. O bloco representa 80% da economia global. Ao todo, o 1% mais rico dessas nações colheram rendimentos de mais de US% 18 trilhões apenas em 2022, superando o PIB da China. “A gente sabe que uma série de mudanças de legislação, de alteração de alíquotas, foram implementadas nesses países. É o que a gente chama de uma guerra à tributação justa”, explicou ao Correio a gerente de Programas e Incidência da Oxfam Brasil, Maitê Gauto. 

Em entrevista ao jornal O Globo publicada no sábado, Haddad adiantou que a criação de uma iniciativa global para taxação dos super-ricos será um dos temas tratados na primeira reunião da Trilha de Finanças do G20, que começa nesta quarta (28). “A agenda de tributação da riqueza e da progressividade sobre a renda são essenciais para enfrentar os entraves econômicos da desigualdade e promover o crescimento econômico sustentável”, declarou o ministro. Ele também já expôs a intenção no cenário global, no ano passado, ao participar das reuniões do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional (FMI), no Marrocos. 

Maitê ressalta que, com o agravamento da crise climática e a necessidade de apoio aos países em desenvolvimento – os mais afetados – a discussão sobre a taxação das fortunas se torna cada vez mais urgente. “Tudo isso vai demandar uma série de investimentos, e para isso a gente precisa constituir fundos que de fato vão conseguir dar suporte. O 1% mais rico, independentemente o país, é muito mais resiliente”, apontou. 

De acordo com a Oxfam, um imposto de 5% sobre a parcela mais rica dos países do G20 poderia gerar até US$ 1,5 trilhão por ano, montante que poderia ser usado para acabar com a fome, ajudar países em desenvolvimento na adaptação às mudanças climáticas e cumprir as metas de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas. 

A taxação dos mais ricos também é debatida em outras esferas, como a própria Organização das Nações Unidas (ONU), e ganha apoio crescente. Em janeiro deste ano, um grupo de 260 multimilionários e bilionários divulgou uma carta aberta defendendo o aumento de impostos. “Nosso pedido é simples: nós, os muito ricos em nossa sociedade, queremos ser taxados por vocês”, diz o documento. Já no ano passado, um outro grupo de 300 economistas, políticos e milionários pediram ao G20 medidas no mesmo sentido. 

No ano passado, o governo federal conseguiu aprovar no Congresso medidas para taxar as offshores e os chamados fundos dos super-ricos. Em janeiro, a arrecadação estimada foi de R$ 4 bilhões apenas com o novo dispositivo. 

Sobre as propostas implementadas no Brasil, Maitê disse que a Oxfam celebrou a reforma tributária e as taxas para os mais ricos, mas que ainda é preciso discutir a regressividade do sistema brasileiro, que continua com uma tributação forte sobre o consumo. “Ainda precisamos avançar nacionalmente, em algo que ficou para uma segunda fase da reforma tributária, que é a taxação sobre patrimônio e renda. Estamos aguardando a retomada da discussão”, frisou.

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