As mudanças climáticas afetam não apenas o equilíbrio dos ecossistemas e a biodiversidade, mas também a estabilidade econômica e social de milhões de pessoas. O aumento das temperaturas e as chuvas extremas, alguns dos diversos fenômenos associados, exercem impactos adversos no crescimento econômico ao afetarem setores-chave, como agricultura, energia e infraestrutura.
O Brasil sentiu na pele o alerta do planeta no ano mais quente da história — que promete ser superado em 2024. Enquanto a seca extrema castigava a região Norte, que viu a Amazônia encoberta por fumaça, os vendavais devastaram as regiões Sul e Sudeste do país.
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Um relatório do Fórum Econômico Mundial aponta que esses efeitos adversos podem causar uma perda anual de 4% da produção econômica mundial até 2050. Segundo Daniel Caiche, professor de MBA da Fundação Getulio Vargas (FGV) e especialista em mudanças climáticas e mercado de carbono, setores sensíveis às variações enfrentam desafios significativos em um futuro em que eventos climáticos extremos serão cada vez mais frequentes e intensos.
"Eventos climáticos extremos, como ondas de calor, secas e tempestades mais intensas, podem prejudicar a produtividade e a eficiência operacional, levando a perdas econômicas significativas. Portanto, a mitigação das mudanças climáticas torna-se crucial não apenas para a sustentabilidade ambiental, mas também para a estabilidade econômica global", afirmou.
De acordo com o pesquisador, setores responsáveis pela produção de energia e alimento, respondem por uma parcela significativa da produção econômica, além de serem estratégicos para a manutenção da nossa organização social.
Preço dos alimentos
No agronegócio, responsável por cerca de 30% do Produto Interno Bruto (PIB) do país em 2023, a onda de calor que teve início em setembro afeta, principalmente, as lavouras de milho e soja da segunda safra, que é plantada no segundo semestre. Essa safra é responsável por cerca de 70% da produção total de milho e soja do Brasil. De acordo com informações da Embrapa, a onda de calor pode reduzir a produtividade da soja em até 10% e a do milho em até 15%.
Segundo a economista Nadja Heiderich, professora da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (Fecap), as temperaturas acima de 40°C estão prejudicando o crescimento das lavouras, o que pode levar a uma redução da produtividade e, consequentemente, a um aumento dos preços dos alimentos. "A soja e o milho são as principais culturas agrícolas do Brasil, responsáveis por cerca de 40% da produção total de grãos do país. A soja é o principal produto de exportação agrícola do Brasil, e o milho é um importante ingrediente para a alimentação animal e humana", ressaltou.
Amazônia em alerta
A seca histórica na Amazônia foi devastadora em diversos aspectos, e os efeitos do El Niño podem se prolongar até o fim do primeiro semestre deste ano. Dados do ComexStat, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, constataram que a importação pelo modal aquaviário do Amazonas reduziu seu volume, entre setembro e outubro de 2023, em cerca de 83%. Comunidades no oeste do estado enfrentaram o desabastecimento de itens básicos, como alimentos, além da falta de energia.
O professor da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e diretor adjunto da Federação das Indústrias do Estado do Amazonas (Fieam), Augusto Rocha, apontou que as condições climáticas geraram um gasto excessivo para a chegada de contêineres que abastecem a região, evidenciando a vulnerabilidade da infraestrutura.
"É esperado que a chuva recomponha o trânsito de navios em dezembro, mas será que poderemos, como sociedade, construir uma alternativa para o rio se transformar em hidrovia? Há um território enorme na Amazônia e uma ausência histórica de realizações amplas de planos", disse.
Rocha avalia que o maior gargalo para o desenvolvimento econômico da região amazônica é a falta de infraestrutura, evidenciada em momentos críticos, como a seca enfrentada neste ano. "A presença do governo federal dificilmente é percebida como valiosa pelos moradores, além das ações voltadas para os aspectos mais sociais de presença do Estado", destacou.
Seguros catástrofe
O setor de seguros é apontado como uma alternativa para os desastres climáticos. Durante a 28ª Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas (ONU), a COP28, foi assinado um acordo de cooperação assinado entre a Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg) e o ICLEI, associação mundial de governos locais e subnacionais dedicada ao desenvolvimento sustentável.
A proposta visa consolidar no país um programa de seguros destinado especialmente aos municípios brasileiros, para suporte em caso de desastres. Segundo o presidente da CNSeg, Dyogo Oliveira, o tema está sendo tratado com o governo, e a ideia é oferecer algo parecido com o seguro rural, só que voltado para catástrofes.
"Temos que nos posicionar como parte da solução, no sentido do enfrentamento das consequências, mas também da prevenção e resiliência às mudanças climáticas. O setor de seguros tem um conhecimento sobre como prevenir danos e, hoje, é um comportamento bastante comum em segmentos como, por exemplo, o agronegócio", concluiu.