Lisboa — Maioria da população mundial, as mulheres ainda enfrentam enormes barreiras para galgarem postos de destaques no setor de tecnologia e, pior, viram o sexismo e o assédio aumentarem no último ano. Pesquisa realizada pela Web Summit aponta que quase dobrou o número daquelas que não veem as startups tomando as medidas adequadas para combater a desigualdade de gênero nos ambientes de trabalho.
Essa posição foi endossada por quase metade (47%) das entrevistadas contra 26% do levantamento de 2022. Mais: 53,6% foram assediadas no emprego, ante 49,5% do relatório anterior.
Para 77,2% das mulheres que atuam na área de tecnologia, elas precisam trabalhar mais do que os homens para provar que são capazes de exercer as funções para as quais foram designadas. Mesmo com esse ambiente hostil, 76,1% se consideram empoderadas o suficiente para alcançar ou manter uma posição de liderança. A pesquisa mostra, ainda, que menos de um terço das startups foi fundada por mulheres e que 41,8% das entrevistadas têm de escolher entre a carreira e a família. “Esses números não me surpreendem”, afirma Valéria Carrete, sócia e diretora da startup r2u.
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Ela ressalta que o preconceito no mundo da tecnologia ainda é grande, não apenas contra as mulheres, mas também contra os negros. “A cara do startapeiro é masculina e branca”, diz. O mercado é tão desigual, ressalta, que, neste momento de crise enfrentada pelas empresas, com cortes maciços nos investimentos, as mulheres foram as principais afetadas pelo enxugamento das equipes. “Nas demissões, as startups priorizaram as mulheres, isso é real”, assinala. Diante dessa realidade, Carrete acredita que é preciso fomentar o empreendedorismo feminino tecnológico. “As mulheres criam uma série de negócios, mas acham que são incapazes de progredir na área da tecnologia”, frisa.
Diversidade faz diferença
Pelos dados da Web Summit, que, pela primeira vez, é comandada por uma mulher, Katherine Maher, o total de participantes do sexo feminino no evento deste ano ficou em 43%, praticamente estável em relação a 2022 (42%). “Esse quadro reforça o grande caminho que ainda precisa ser percorrido em relação à igualdade de gênero”, destaca Cleo Barral, desenvolvedora de negócios no setor de tecnologia. Ela, que trabalhou por cinco anos na Irlanda, onde participou de um programa de inclusão de mulheres nesse segmento, acredita que, quando as startups ou empresas de outros ramos optam pela diversidade, as chances de sucesso dos negócios se tornam muito maiores.
Para Barral, as mulheres precisam se colocarem mais no mercado, fundando as próprias startups, pois, do ponto de vista de preparo, são mais capacitadas que muitos homens. “Historicamente, a formação das mulheres é melhor. Elas têm mais anos de estudos e priorizam a educação. E temos de lembrar: inovação combina com diversidade”, frisa. Ela recomenda que as universidades se engajem mais no enfrentamento das barreiras que impedem a presença de mais mulheres na tecnologia. “Não posso aceitar que, num jantar de trabalho com 10 pessoas, apenas três sejam mulheres, como ocorreu comigo em Lisboa.”
Fundadora da Associação Empresarial dos Imigrantes em Portugal e da Associação Lusofonia, Cultura e Cidadania, Nilzete Pacheco afirma que as empresas, no geral, se recusam a enfrentar de verdade a desigualdade de gêneros. Esse problema, complementa ela, não se resume ao setor de tecnologia. “Há muita resistência na contratação de mulheres que têm filhos ou que acabaram de se casar e vão ter filhos”, afirma. “Esse tipo de postura tem de acabar, assim como a sobrecarga que recai sobre as mulheres, que têm duas, três jornadas diárias por causa dos cuidados com os filhos e com a casa”, complementa.
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