Mesmo com uma ampla variedade de opções de alimentos, um item que praticamente não pode faltar na mesa do brasileiro é o arroz. No entanto, a compra do produto tem pesado cada vez mais no bolso do consumidor. De acordo com a Associação Brasileira de Supermercados (Abras), o preço médio do arroz nos estabelecimentos de revenda no país subiu 3,2% em setembro, como indica a última pesquisa Consumo nos Lares Brasileiros.
Segundo a Abras, o aumento no preço do alimento não é de agora. Desde o início do ano, o valor do arroz nas prateleiras acumula uma alta de 10,28%. Nos últimos 12 meses, o encarecimento é ainda maior — de 16,21%. Em um supermercado no Cruzeiro, região administrativa do Distrito Federal, o preço do pacote com 5kg está acima dos R$ 30. Para a secretária escolar Eliane Santana, de 50 anos, que costuma levar um pacote por mês, a opção continua sendo comprar o produto em mercados mais próximos de casa, mesmo que o preço pese um pouco mais no bolso.
- Excesso de chuvas no Sul atrapalhou colheita e influenciou projeções do IBGE
- Preço do arroz dispara e consumidores relatam pagar até R$ 42 no pacote
"Hoje em dia, para a gente ficar procurando, às vezes não compensa. A diferença de R$ 2 ou R$ 3 de um mercado para o outro é a gasolina que você gasta. Então, praticidade é melhor, com certeza", afirmou a secretária, que ainda completou: "Diminuiu o feijão, mas aumentou o arroz". Já para a professora Joane Macedo, de 38 anos, a melhor opção tem sido comer fora de casa e evitar comprar nos supermercados.
"Na maioria das vezes, eu almoço fora. Aí eu vejo o valor e, assim, nem compensa comprar aqui perto, porque você faz refeições fora, em restaurante", disse a professora, que mora apenas com o filho. "Pela quantidade de tempo que a gente fica em casa, que é muito pouco, a gente faz a opção de comer fora", completou.
Fatores climáticos
Diversos fatores levaram à alta nos preços, segundo Alcido Wander, especialista da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), mas os eventos climáticos extremos que atingiram a Região Sul, maior produtora de arroz do país, foram decisivos. "Na última safra, colhida no início de 2023, nós tivemos uma redução de área de plantio no Rio Grande do Sul, motivada por problemas de seca", explicou.
A estiagem severa levou a uma perda estimada de 40 mil a 50 mil hectares de área cultivada no estado gaúcho em relação à safra anterior, segundo Wander. Andressa Silva, diretora executiva da Associação Brasileira da Indústria do Arroz (Abiarroz), observou que a safra de 2023 representou a menor área plantada dos últimos 20 anos no Brasil.
Índia restringiu exportação
Em julho, a Índia, um dos maiores produtores de arroz do mundo, anunciou que restringiria as exportações do alimento para garantir o abastecimento interno. Apesar de o Brasil não ser grande importador de arroz indiano, a medida pressionou os preços no mundo inteiro, com consequências para o mercado brasileiro, segundo os especialistas ouvidos pelo Correio.
Eles explicaram ainda que o aumento dos preços é comum entre setembro e outubro, por se tratar do período de entressafra, com menor disponibilidade do alimento. No entanto, a soma dos diversos fatores — com destaque para os eventos climáticos — impulsionou a alta para além do habitual.
Previsões
Não há previsão de baixa nos preços para os próximos meses. "É improvável, a não ser que a Índia mude a política de restrição às exportações", explica Wander. Ao menos até fevereiro do próximo ano, momento da colheita da nova safra, o arroz deve continuar pesando no bolso dos brasileiros.
Além disso, a diretora da Abiarroz ainda alertou para uma possibilidade de novas altas nos preços, em decorrência dos desastres climáticos que atingiram, novamente, a região Sul do país neste ano. Desta vez, em vez da seca prolongada, foram as fortes chuvas que afetaram o ciclo do cultivo. "A gente observou essas enchentes bem no período de plantio do arroz, em setembro, e isso atrasou o processo em cerca de um mês", conta Andressa. Não é possível afirmar, segundo ela, que haverá quebra de safra, mas "a produtividade vai ficar comprometida"
Futuro incerto
"Até nos cenários mais otimistas, a previsão é de impacto nas principais culturas agrícolas", contou Giampaolo Pellegrino, agrônomo e pesquisador de mudanças climáticas da Embrapa. Não é só o arroz que deve sofrer com as mudanças do clima. Entre os alimentos analisados pelo órgão, "apenas a cana e a mandioca teriam algum benefício com o aquecimento", disse Pellegrino.
Segundo os pesquisadores, os riscos para a produção de alimentos no Brasil a médio prazo passam por dois pontos principais. Redução de área produtiva pode ocorrer em todo o país em decorrência do calor extremo e da irregularidade das chuvas. Além disso, quebras de safra — ou seja, colheitas menores do que o esperado — podem se tornar mais frequentes, como consequência de eventos extremos do clima.
Olhando para o cenário atual, no entanto, a diretora-executiva da Abiarroz garante que não há riscos de falta do produto no mercado interno nos próximos meses. "Mesmo com o custo mais alto e a oferta menor de importação, a gente não vê possibilidade de desabastecimento de arroz neste momento."
Saiba Mais