Entrevista | Daniel Moczydlower | presidente e CEO da Embraer X

Embraer investe em novas tecnologias em busca de sustentabilidade

Seguindo a política de redução das emissões de gases do efeito estufa, Embraer aposta firme na sustentabilidade e prepara lançamento de aviões elétricos e movidos a biocombustível. E conquista mercados no lucrativo segmento de defesa

 Daniel Moczydlower, presidente da Embraer X:  Estamos vivendo uma verdadeira reinvenção da indústria de aviação
Crédito: divulgação/CNI 
 -  (crédito: divulgação/CNI )
Daniel Moczydlower, presidente da Embraer X: Estamos vivendo uma verdadeira reinvenção da indústria de aviação Crédito: divulgação/CNI - (crédito: divulgação/CNI )
postado em 03/10/2023 04:30

Na próxima semana, a Embraer vai exibir ao público, pela primeira vez, o protótipo do seu avião elétrico, que vem sendo testado desde 2020 para avançar no conhecimento da eficiência energética e redução das emissões de carbono. Usado na lavoura, o experimento é considerado uma alavanca para outra pesquisa, que desenvolve o veículo elétrico de decolagem e pouso vertical para mobilidade aérea urbana, o eVTOL, conhecido como carro voador.

"Estamos vivendo uma verdadeira reinvenção da indústria de aviação", diz Daniel Moczydlower, presidente e CEO da Embraer X, braço da empresa voltado para a inovação. Em entrevista ao Correio, Moczydlower fala sobre os desafios da transformação energética, em que a aviação terá que se livrar dos combustíveis fósseis. E trata dos planos de expansão internacional da empresa, que acaba de fechar a venda do cargueiro KC390 Millenium para a Áustria e negocia com a Suécia.

O setor de aviação tem sido pressionado para que se torne uma indústria menos poluente. Como será o avião do futuro?

Estamos vivendo uma verdadeira reinvenção da indústria de aviação. É como se tivéssemos voltado ao tempo do Santos Dumont, quando cada inventor trazia uma ideia diferente. Se você olhar fotos da época, têm os veículos mais loucos, mistura de avião com dirigível, com helicóptero, qualquer coisa podia ser um avião. Com o avanço da tecnologia, os projetos foram convergindo para a solução ótima, e os aviões ficaram todos parecidos. Só que os aviões de hoje representam uma geração de tecnologia que agora, por conta da sustentabilidade, precisa ser completamente transformada. O avião do futuro não vai mais poder voar queimando combustível fóssil.

Quais as soluções em estudo na Embraer?

Pode ser combustível sustentável de aviação (SAF na sigla em inglês). É ter o bioquerosene para abastecer os aviões. Mas existem desafios enormes de disponibilidade, escalabilidade e custo. Ainda são muito altos.

Qual a matéria-prima a ser usada?

Não vai ter uma bala de prata para resolver esse problema. Vai ter uma combinação de tecnologias para cada tipo diferente de missão que a aeronave tem de cumprir. Outra coisa que a gente tem estudado é voo elétrico, avião a bateria. Para fazer um voo curtinho, dá conta. E a gente está com uma empresa nova que a Embraer lançou. Chama-se Eve.

A empresa do eVTOL, o carro voador?

Isso. Ela está desenvolvendo um veículo que decola como um helicóptero e, depois, voa como um avião. E é totalmente movido a bateria. Só vai precisar voar 10 ou 15 minutos porque vai voar dentro das cidades. É para sair do centro e chegar ao aeroporto, por exemplo, voando por cima do trânsito. Então, mesmo a bateria sendo pouca, ele vai aguentar 60km ou 80km. Pelas nossas contas, até 60km é possível atender a 90% do que os passageiros vão precisar. Então, já vai economizar muito tempo para muita gente no mundo inteiro. Todo mundo que mora numa cidade do tamanho de São Paulo, muito congestionada, vai poder se beneficiar disso.

A Embraer assinou um memorando, recentemente, com a American Airlines. Já está em estudo um avião maior, movido a bateria?

Aí seria um outro tipo de aeronave. A gente lançou no mercado uma ideia de uma família de aviões. São quatro aviões que estamos estudando. Tem um avião menor, a bateria; tem outro, um pouco maior, que já é híbrido — com bateria, mas também algum combustível sustentável. Depois tem os que são a hidrogênio verde. Então, você pode ter um avião movido a célula combustível de hidrogênio. Ou até um avião em que a gente vai queimar o hidrogênio na turbina como combustível direto. O avião começa a ficar muito diferente, dependendo de qual dessas tecnologias vai ser usada.

Quanto vocês estão investindo nessa pesquisa?

A Embraer, historicamente, investe de 6% a 8 % da receita anual em desenvolvimento de novos produtos.

O presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, anunciou que o banco aprovou R$ 2,4 bilhões para financiar exportações de aviões da Embraer. Quais são os planos?

O sucesso da Embraer simplesmente não seria possível sem o apoio do BNDES a nossas exportações. Isso é fundamental, porque nossos concorrentes todos têm apoio dos seus bancos locais. O BNDES lançou novas linhas, em parceria com a Finep, para baixar o risco do investimento em inovação. Trata-se de um programa que baixou muito a taxa. Será a TR mais dois ou quatro por cento ao ano. Eles têm um programa nacional de R$ 20 bilhões para o Brasil todo, para todos os setores.

O ministro da Defesa, José Múcio, disse que vai este mês à Europa, como garoto propaganda da Embraer, para vender os aviões de Defesa. O que a Embraer espera dessa viagem?

No mercado de defesa, essa parceria com o governo é a mais importante, porque tem um fator geopolítico e diplomático importantíssimo. Nenhum país compra equipamento de defesa sem uma boa relação diplomática com o fornecedor.

Múcio vai a Estocolmo negociar novos caças Gripen. Como a Embraer participa dessa negociação?

A gente tem um contrato com a Suécia. A Embraer é a parceira local desse programa e a gente tem muita expectativa de ter a capacidade de produzir esse avião no Brasil, exportar para outros países. Em todos os grandes contratos de defesa, sempre existe esse compartilhamento de tecnologia. Então, a Embraer, a Atec, que é uma empresa do grupo da Embraer, e várias outras empresas brasileiras participaram ativamente desse programa. Chegamos a ter mais de uma centena de engenheiros brasileiros morando na Suécia. E é um trabalho que vai ainda durar muitos anos.

Na negociação, o Brasil pretende também vender o avião de transporte multimissão KC 390?

Tem muitos países interessados no KC390 Millenium. É o cargueiro mais avançado do mundo em tecnologia. Se a competição fosse puramente tecnológica, não perderíamos nenhuma venda, porque esse avião está décadas à frente do concorrente mais próximo. O contrato que a gente conseguiu assinar com a Força Aérea de Portugal foi fundamental, por causa do excelente relacionamento histórico bilateral. Na sequência, tivemos a Hungria, a Holanda. O contrato mais recente foi com a Áustria. Estamos conseguindo montar uma posição nos países da Otan, que, talvez, estejam entre os compradores mais exigentes do mundo.

 

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