A regulamentação do mercado de carbono poderá atrair cerca de US$120 bilhões para o país até 2030, de acordo com o ex-governador do Distrito Federal e atual secretário de Economia Verde, Descarbonização e Bioindústria do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic), Rodrigo Rollemberg.
Em entrevista ao CB.Poder — parceria entre Correio e TV Brasília — de ontem, Rollemberg detalhou a proposta do governo para o tema, que propõe a criação do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE). Existem ao menos sete projetos na Câmara dos Deputados sobre o assunto.
Para o ex-governador, o país tem uma grande vantagem competitiva para liderar a descarbonização, de forma mais rápida e barata, porque grande parte da matriz energética é limpa, em torno de 46%, bem acima da média global, de 14%. "Eu sempre tenho reiterado que o Brasil tem tudo para se transformar numa liderança mundial na economia verde", disse. A seguir, os principais trechos da entrevista:
Um grupo de técnicos do ministério entregou o projeto de lei que vai regulamentar o mercado de carbono no Brasil. Do que ele trata e o que prevê?
Isso é um trabalho feito em conjunto por 10 ministérios, e fizemos isso por uma orientação do vice-presidente e ministro Geraldo Alckmin (do Mdic), sempre ouvindo o setor produtivo, a iniciativa privada e a sociedade civil. É um projeto extremamente importante porque regulamenta o mercado de carbono no Brasil, que, segundo estudos da WayCarbon e da Câmara de Comércio Internacional, pode atrair para o Brasil cerca de US$ 120 bilhões até o ano de 2030. Esse projeto cria um Sistema Brasileiro do Comércio de Emissões, pelo modelo "cap and trade". Você define um limite de emissões para determinados setores, que serão regulados pelas empresas, e cria as cotas de emissão. Se elas emitirem menos, geram um crédito. Se emitirem mais, têm que compensar comprando de quem gerou menos ou parte do mercado voluntário. Isso é um instrumento importante para o Brasil atingir os compromissos assumidos no Acordo de Paris, de redução das emissões de gases de efeito estufa. O Brasil é um país que tem uma matriz energética mais limpa em relação ao resto do mundo. Temos um potencial de descarbonização de uma forma mais rápida e mais barata que o resto do mundo. Isso pode se transformar em uma grande oportunidade para o Brasil no comércio internacional dessas emissões, contribuindo para a redução das emissões e atraindo recursos para o país.
As empresas podem emitir esses créditos para negociar internacionalmente com empresas de outros países também, certo?
Sim. Aquelas empresas que ainda têm os créditos de carbono podem negociar, no mercado interno, para outras empresas que são obrigadas a reduzir as emissões. Você pode negociar no mercado internacional também. Toda essa agenda da transição energética que se abre, a partir da regulamentação do mercado de carbono, cria uma oportunidade fantástica para o Brasil. Eu sempre tenho reiterado que o Brasil tem tudo para se transformar numa liderança mundial na economia verde, primeiro porque a gente tem aqui a maior biodiversidade do planeta. Temos uma grande disponibilidade de biomassa. Temos uma matriz energética limpa, em comparação ao resto do mundo: 46% contra a média mundial, de 14%. Na nossa matriz elétrica, 90% dela é limpa e há uma possibilidade de expansão enorme. Isso dá ao Brasil condições muito especiais de liderar a transição para economia verde, trazendo imensas oportunidades para todo o país, para todas as regiões do país, trazendo qualidade de vida para nossa gente.
Sobre a produção de biomassa e de combustível para avião, todos os estados têm um potencial para esse processo?
Olha, estamos vivendo um momento muito bom para a transição energética, porque o presidente Luiz Inácio Lula da Silva trouxe esse tema para a centralidade do debate político. Existe uma convergência total dessa agenda no governo e no Conselhão. Nós temos todas as condições de ser o grande destino de investimentos internacionais, investimentos diretos, investimentos de fundos internacionais que querem e precisam investir na transição energética. Como disse, isso traz oportunidades para todas as regiões do país. O Nordeste brasileiro tem uma oportunidade única e histórica de se industrializar por meio da produção de hidrogênio verde, a partir das eólicas onshore e offshore, que são em alto mar, e a partir da energia fotovoltaica. Mas não apenas o hidrogênio para vender como commodity posterior, mas atraindo cadeias de suprimentos de aerogeradores, de eletrolisadores, de turbinas eólicas e atraindo as empresas intensivas em energia, que precisam produzir com uma baixa pegada de carbono, fazendo com que seus produtos sejam muito mais competitivos no exterior. Estou me referindo ao aço verde, ao cimento verde, ao fertilizante verde. E a produção do combustível sustentável de aviação, o SAF, que é um biocombustível que você pode fazer a partir do etanol de primeira geração, do etanol de segunda geração, de resíduos da agricultura de sebo de boi. O Brasil já tem uma experiência na produção de biocombustíveis e, hoje, tanto a aviação internacional quanto a navegação marítima vão precisar de biocombustível. Nenhum país tem mais condições competitivas para produzir combustíveis sustentáveis de aviação, esses biocombustíveis mais sofisticados, do que o Brasil.
Esse combustível é mais caro? Sai mais caro para as companhias aéreas?
Certamente, hoje, até pela escala, é um combustível mais caro. Mas só para você ter uma ideia da oportunidade, nesse ano, as empresas de aviação devem utilizar em torno de 400 milhões de litros de combustível sustentável de aviação. Usam muito pouco mas, em função dos mandatos já existentes na União Europeia, da necessidade da redução de emissões pelos compromissos assumidos pelas empresas, já em 2027, vão ter que usar algo em torno de 4,5 bilhões de litros desse combustível sustentável de aviação. Nenhum país tem essa oportunidade como o Brasil.
*Estagiário sob supervisão de Rosana Hessel