A queda da inflação, com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) devendo registrar deflação em junho, começa a ser percebida pelos consumidores, que voltam a adquirir itens que foram abandonados no passado recente, assim como elevar as compras de produtos cuja demanda foi reduzida pela alta dos preços.
Mas, com quase 80% das famílias brasileiras convivendo com dívidas e com o orçamento apertado, o alívio no valor de alguns produtos não chega a ser suficiente para mudar hábitos.
“Passei a comprar frango e porco. Agora, uma vez por semana, compro um quilo de acém, músculo ou chã de dentro”, diz a auxiliar administrativa Claudia Reis, de 36 anos, ao comparar o consumo antes e agora com queda nos preços. Ela ressalta que, mesmo quando os produtos estavam mais caros, não deixou de consumir. “Não deixo de comprar, mas não compro uma quantidade que daria para uma semana, por exemplo”, conta ela.
A aposentada Elisabeth Vieira, de 66 anos, também afirma ter percebido redução dos preços de todos os tipos de carne no açougue Ela conta que voltou a consumir contrafilé, que “está com o preço em conta”, “Chã de dentro e patinho também caíram de preços”. Ela lembra que, apesar de não consumir diariamente, já consegue comprar picanha para um churrasco.“Baixou, mas não tanto.”
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Elisabeth e Claudia, no entanto, ressaltam que a redução não é generalizada e há aumentos de outros produtos. “Não vejo muita mudança de preços”, afirma a aposentada referindo-se ao valor das carnes em supermercados e sacolões. “O tomate e a cenoura estão um absurdo”, reclama a auxiliar administrativa.
Em alguns casos, o orçamento familiar apertado ainda não permite que as pessoas voltem a consumir alimentos que registraram queda de preço. É o caso do motoboy de aplicativos Nilton Batista, de 36 anos, pai de dois filhos pequenos. Ele diz que continua comprando apenas o essencial. Batista destaca a queda no preço da gasolina como a mais perceptível, desde dezembro do ano passado. Apesar disso, ainda não conseguiu voltar a comprar produtos que consumia.
“Diminui uma coisa, mas acaba que outras aumentam. Por exemplo, a dúzia de ovos custava R$ 10, em 2020, e agora já dobrou de preço. Custa entre R$ 20 e R$ 23. Eu deixo de pagar um pouco a mais na gasolina, mas gasto em outras coisas. Acaba que fica empatado.” “Compro só o básico. Carne a gente precisa escolher os dias. Se for comer todos os dias fica muito caro.”, acrescenta o motoboy.
Batista revela que a família completa as refeições com ovos, salsicha e cortes mais baratos. “Picanha para fazer um churrasco está complicado. Faz mais de um ano e meio que não faço um churrasco.”
Com um salário de R$ 3 mil mensais, ele diz que sempre tem algum custo extra. “Um pneu que precisa ser trocado. Então acabo usando esse dinheiro, vira o mês e começa tudo de novo”, conta ele ao relatar seu consumo. “A gente vai no supermercado com R$ 150 e compra muito pouca coisa, sai com duas ou três sacolas.”
Mudança de hábito
Donos de estabelecimentos comercias percebem mudança no comportamento dos consumidores com a queda dos preços. O gerente de um sacolão na Rua Niquelina, Bairro Santa Efigênia, Região Leste de BH, Sérgio Araújo, diz que quase todos os alimentos tiveram redução de preço desde o ano passado. Entre as maiores quedas, ele cita abóbora moranga, chuchu, coco e melão. “Hoje temos vários produtos sendo vendidos por R$ 1,98 e R$ 2,98. Antigamente, os mais baratos eram vendidos a R$ 3,98”, lembra.
Com a queda nos preços, o gerente diz que as pessoas têm comprado maior quantidade de produtos. Além disso, alimentos que estavam mais caros votaram a ser consumidos. “O mamão (formosa) mesmo estava R$ 14,90 e ninguém estava comprando. Agora está R$ 3,98 e as pessoas levam mais.” Ele cita mexerica e cebola com quedas significativas de preço. “A cebola estava R$ 4 e agora custa R$ 1,98.”
No açougue na Avenida dos Andradas, Bairro Santa Efigênia, Região Leste de BH, o gerente Wanderson Edson comemora o aumento nas vendas. Segundo ele, as pessoas estão consumindo mais carnes nos últimos seis meses.
“A carne bovina não tinha muita saída. Hoje em dia, com a queda de preço, os clientes estão consumindo mais.” Contrafilé, picanha e miolo de alcatra estão entre os cortes mais vendidos e tiveram um aumento de vendas de 70%, segundo o gerente. “Ano passado, a gente vendia mais frango e carne suína. Agora estamos vendendo mais carne bovina.” A quantidade de produtos também aumentou. “Antes, as pessoas compravam, em média, 600g e agora levam, em média, 1Kg.”
Percepção
O economista Nikola Tingas, consultor econômico da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi), lembra que muitas vezes o consumidor vê o índice e preços registrando queda e no entanto isso não se reflete no supermecado. “Quando um preço subiu muito, ele não necessariamente vai reduzir. Ele parou de subir e aí a inflação é zero. A taxa de inflação agregada cai, mas não o preço daquele produto. Quer dizer, para você melhorar preços no orçamento familiar você precisaria ter uma deflação”, afirma.
Para ver a queda ser perceptível é preciso que os valores tenham deflação forte. Foi isso que ocorreu na Grande Belo Horizonte, com os preços de produtos como o óleo de soja, cuja embalagem de 900 ml era vendida ao preço médio de R$ 9,05 em junho do ano passado e agora é encontrada a R$ 4,94, conforme pesquisa do Mercado Mineiro (www.mercadomineiro.com.br) feita para o Estado de Minas. A deflação chega a 45,4% no período. Outro item com forte redução de preço é leite. O litro do produto era vendido a R$ 6,90, em média, em junho de 2022 e agora é encontrado a R$ 4,65, com deflação de 32,6%.
Desaceleração deve continuar
Queda nos preços das commodities, redução no valor dos combustíveis e baixa na cotação do dólar são alguns dos motivos que explicam a desaceleração dos preços, ajudada também pela política de juros altos, segundo avaliam economistas. Ao lembrar que em 2022, com a guerra Rússia-Ucrânia, houve uma instantânea contração da oferta global, o que levou os preços para a estratosfera, o economista Nikola Tingas, consultor econômico da Acrefi, diz que este ano a normalização da oferta global e a desaceleração das economias com os juros altos permitem a redução dos preços do petróleo e das commodities, com queda nos preços no Brasil.
“A gente tem visto uma desaceleração da inflação nesse primeiro semestre, inclusive a expectativa, o dado oficial de junho ainda não saiu, é de que a gente tenha uma inflação negativa do IPCA pro fechamento de junho”, afirma o economista Paulo Herique Duarte, da Valor Investimentos. “O que mais tem contribuído com isso são alimentos e combustíveis e como os combustíveis têm um impacto em toda a cadeia de transportes”, acrescenta.
Para o economista Diogo Santos, do Instituto de Pesquisas Econômicas, Administrativas e Contáveis (Ipead), os principais fatores para a queda dos preços estão a tendência de baixa no valor das commodities agrícolas e energéticas, como petróleo e gás natural, “que acabam gerando uma redução dos custos de produçao em diversos setores econômicos com a produção de alimentos”.
Ele observa que a queda do dólar derruba o preços dos importados e o custo de matérias-primas e insumos, o que significa custo menor de produção de mercadorias. Com vários fatores reduzindo o custo, as empresas diminuem o aumento dos preços para os consumidores finais, gerando assim uma desaceleração da inflação”, diz Diogo.
Tendência
Os economistas avaliam que a tendência de inflação em queda deve persistir até o fim deste ano. “Os preços já subiram muito e agora eles estão mais ou menos parados, com oscilações menores, portanto, isso vai ajudando o índice de inflação a ir caindo”, afirma Nikola Tingas. “O país realizou uma safra recorde de soja e outros grãos que também está contribuindo para a queda de preços, como no caso do óleo de soja. Para o próximo mês, há perspectiva de continuidade do processo de controle da inflação na capital, em especial devido ao retorno para R$ 4,50 da tarifa principal do transporte público por ônibus em Belo Horizonte”, acredita Diogo Santos. Em junho, na Grande BH a taxa de inflação ficou em 0,35%, contra 0,44% em maio.
“A expectativa é a gente continuar a ver um IPCA mais comportado no segundo semestre. A própria economia brasileira deve desacelerar um pouquinho”, diz Paulo Henrique. Já Tingas vê na nova política de preços da Petrobras uma perspectiva de internalização da queda do valor do petróleo no mercado internacional. “Isso está inclusive ajudando a atenuar a volta daqueles impostos que foram suspensos lá atrás, no período pré-eleitoral, e estavam voltando agora. Essa última queda da gasolina nas refinarias ajuda a compensar a volta de alguma pressão na inflação dos impostos, avalia o consultor econômico da Acrefi. (MM)
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