Vila Nova de Gaia, Portugal — Aqueles que pregam, no Brasil, um Estado cada vez menor, não inferior a 20% do Produto Interno Bruto (PIB), devem olhar para o que acontece na África Subsaariana, em que os países estão mergulhados em guerra civil. Lá cobra-se o mínimo de impostos para sustentar o Estado, em compensação, não há o menor retorno em benefícios à sociedade. O alerta foi dado pelo professor e pesquisador Francisco Tavares, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), no 7º Congresso Luso-Brasileiro — Impostos 2030.
Ele ressaltou que, quanto mais sólida for a democracia de um país, maior será a carga tributária, pois há uma compreensão da sociedade sobre a necessidade de se recolher impostos para bancar serviços públicos de qualidade. “Outra característica dessas democracias é o sistema progressivo de impostos, ou seja, a carga incide, principalmente, sobre a renda e o patrimônio, e menos sobre o consumo”, detalhou. Esse modelo mais justo, no entanto, passou por um processo de desmonte a partir de 1979, quando os Estados Unidos, então presidido por Ronald Reagan, decidiu dar alívio de impostos aos mais ricos.
Felizmente, assinalou Tavares, esse conceito começa a ser revisto, e os países se voltam, novamente, para tributar mais pesadamente a renda e o patrimônio. Chama a atenção, segundo ele, o fato de esse movimento ter amplo apoio da população, como mostram pesquisas recentes. No Brasil, onde o Congresso está discutindo a reforma tributária, um levantamento recente apontou que 41% dos entrevistados são a favor de impostos mais altos sobre renda e herança e 56% acreditam que o governo deve se preocupar em reduzir as diferenças de renda entre ricos e pobres.
Na avaliação do jurista João Taborda da Gama, ex-secretário de Assuntos Fiscais de Portugal, a questão tributária se tornou um risco à democracia. “Cada vez mais a população exige que a política fiscal seja acompanhada de uma política de prestação de serviços públicos. Essa é a maior preocupação dos contribuintes”, assinalou. Como muitos governos não conseguem dar as respostas adequadas, populistas estimulam o conflito, pregam uma revolta fiscal junto a uma classe média que se sente esmagada e a uma classe média baixa pouco politizada. Tudo isso é amplificado pelos algoritmos das redes sociais.
Taborda alertou para o conflito maior que está por vir: o financiamento dos regimes de previdência social. Para ele, a tributação sobre o trabalho já está no limite, mas haverá enorme necessidade de recursos para o pagamento de aposentadorias e pensões devido ao envelhecimento da população. “Manter o financiamento desses sistemas de segurança social implicará em escolhas difíceis. Creio que essa pode ser a grande revolta fiscal que está por vir”, assinalou.