O presidente do Conselho Nacional do Serviço Social da Indústria (Sesi), Vagner Freitas, demonstra otimismo com o avanço da reforma tributária no terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Para ele, a reforma precisa acontecer e logo no início do mandato.
O sindicalista e ex-presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT) destaca que o principal interesse do governo é redistribuir melhor a carga de impostos e fazer quem paga pouco ou não paga, pagar mais imposto. E não poupa elogios ao amigo e ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
"O setor está otimista com o trabalho do ministro Haddad. Ele tem discutido diretamente com a indústria pontos da reforma que interessam. A ideia não é penalizar aqueles que pagam impostos em dia, geram emprego de qualidade no Brasil, como a indústria, e, sim, ter um processo de cobrar de quem efetivamente não paga", afirmou.
Vagner Freitas defendeu debates como o que será realizado pelo Correio, no próximo dia 20, em Brasilia, com transmissão pelas redes sociais do jornal, sobre a reforma tributária, para que a proposta tenha mais contribuições de todos os integrantes da sociedade. "Queremos debater a reforma com os outros atores da sociedade. Vamos ter trabalhadores, acadêmicos, inclusive, especialistas do setor financeiro", destacou. Veja os principais trechos da entrevista concedida ao Correio:
A reforma tributária voltou a tramitar no Congresso e é uma das prioridades do governo. O setor está otimista?
O setor está otimista com o trabalho do ministro Haddad. Ele tem discutido diretamente com a indústria pontos da reforma que interessam. Pelo que entendi, a ideia não é penalizar aqueles que pagam impostos em dia, geram emprego de qualidade no Brasil, como a indústria, e, sim, ter um processo de cobrar de quem efetivamente não paga. O Brasil tem no sistema tributário um dos grandes entraves, porque temos que arrecadar mais para aplicar em programas públicos que venham a desenvolver o Brasil. Tem que fazer essa reforma no início de governo. Se tentar fazer pelo fim de governo, não faz.
A indústria encolheu 0,1% no PIB do primeiro trimestre — e 0,6% só em abril. Com isso, ainda não conseguiu se recuperar do patamar pré-pandemia…
Não consigo ver desenvolvimento sem indústria. Foi extremamente importante o crescimento do PIB, agora, o crescimento do PIB, obrigatoriamente, não significa desenvolvimento do país para todas as pessoas. O que traz desenvolvimento para todas as pessoas é o crescimento da indústria, da produção. Quando a produção cresce, há geração maior de empregos.Falta um plano de desenvolvimento e retomada da indústria. O vice-presidente e ministro Geraldo Alckmin tem falado diretamente com o setor e também temos discutido o que ele e o presidente Lula chamam de neo industrialização.
O que seria isso?
É preciso ver qual é a indústria que o Brasil precisa. O país não quer ser exportador de produto primário para voltar com produtos manufaturados. Temos que agregar à nossa indústria tecnologia, eficácia e eficiência. Nós queremos ter uma indústria competitiva, moderna, acima de tudo, agregando tecnologia e conhecimento. O Brasil tem que ser um pólo de tecnologia e estamos preparados para isso se tivermos condições para que isso aconteça.
E qual a sua expectativa em relação ao debate que será realizado pelo Sesi, em parceria com o Correio, no próximo dia 20?
Fiz questão de procurar uma parceria para ouvir e debater várias opiniões. Nós queremos debater a reforma tributária com os outros atores da sociedade. Vamos ter trabalhadores, acadêmicos, inclusive, especialistas do setor financeiro. É importante ouvi-los nesse processo, nessa construção (do debate da reforma). O governo que vai estar presente por meio dos ministérios da Fazenda e do Mdic. O Brasil precisa de um debate sério, com informações, com números, com aprofundamento. A questão tributária é importantíssima para a economia brasileira, para a tomada de decisão de que rumo o Brasil vai tomar sobre a reforma. Estou com expectativa muito favorável.
No debate anterior sobre reforma tributária, realizado pelo Correio, o secretário extraordinário da reforma tributária no Ministério da Fazenda, Bernard Appy, falou que a reforma pode alavancar de 12% a 20% o PIB potencial...
É uma mudança significativa para o desenvolvimento do país. Nós temos a expectativa de que isso seja um mantra, e com uma indústria desenvolvida e, na minha opinião, empregos de qualidade gerados no Brasil.
Mas o Brasil tem uma produtividade baixa e mão de obra pouco qualificada. Como resolver esse problema?
O Brasil tem de investir mais na qualidade de mão de obra. Investir na qualidade de mão de obra é investir na educação. Primeiro, você tem que gerar cidadãos para depois ter profissionais. É o que o Sesi procura fazer em parceria com o Senai. Ter uma educação de qualidade universal, e o Senai, que é um irmão nosso, fazer capacitação profissional. A desqualificação da mão de obra veio muito da desregulamentação do mercado de trabalho. Ela produziu um entrave ao bom desenvolvimento industrial e um bom desenvolvimento econômico.
O governo anunciou recentemente um programa do carro popular de até R$ 120 mil. Será esse o caminho para desenvolver a indústria? Como dar novos subsídios antes de se fazer uma reforma tributária?
O projeto do carro popular não é obrigatoriamente todo subsidiado. Mas eu não tenho nada contra o subsídio, desde que tenha contrapartidas e um processo de início, meio e fim. Tem que ser uma política econômica, não pode ser emergencial o tempo inteiro. Você poderia ter alternativas que não fossem o carro popular, mas o governo está preocupado em reaquecer a indústria de alguma forma. Isso é positivo. É uma tentativa de aquecer o mercado e retomar a produção industrial. Pode não ser a melhor, mas é melhor que não ter nada, e não ter um governo preocupado com isso. Eu prefiro isso ao imobilismo e a falta de compromisso do governo passado.
A indústria brasileira que já teve um peso de 40% na economia e que está caindo. Como recuperar esse protagonismo?
As economias que, hoje, mais dão certo no mundo são resultados de um processo de reindustrialização. O Brasil e a América Latina precisam fazer a mesma coisa. Não queremos ficar para trás nesse processo da indústria 5.0.
Agora tem um segmento que pesa mais no PIB e paga menos tributo do que a indústria, que é o setor de serviços…
O setor de serviço depende de uma indústria forte, porque, senão, a roda não gira. Eu acho que um não deve ser competidor do outro. Se não houver entendimento entre todos, isso não vai andar. Não pode ter lobby no Congresso Nacional do setor A, B, C ou D para pagar menos ou não pagar. Todo mundo tem que contribuir. E os setores que contribuem menos ou não contribuem precisam entender o processo como um todo e buscar parcerias. É preciso buscar mais onde nós temos consensos e tentar esquecer os dissensos.
O senhor considera positivo essa volta para as PECs 45 e 110? É esse o caminho?
A reforma tributária é extremamente essencial para a proposta do governo de ter recursos para investimento no Brasil. O país tem as melhores condições de fazer isto, porque todos já entenderam que tem que ter uma redistribuição da carga tributária. É preciso ter escalas maiores e mais gente contribuindo para o produto do Brasil crescer. Agora, não é mais uma opinião isolada de um outro grupo da sociedade. Mais pessoas e mais setores da sociedade percebem que não é apenas uma política para punir determinado setor. É uma política de Estado que precisa ser construída. É uma política econômica. Não tem que se ideologizar essa questão. O governo não faz serviço público sem arrecadação e não pode tirar mais de quem já contribui. Tem que tirar e buscar onde não tem contribuição.
Será que agora essa reforma vai avançar mesmo?
Ela precisa ir.
Mas a economia está estagnada, apesar desse PIB forte do início do ano, de 1,9%...
Acho que o PIB de 1,9% quando a expectativa do mercado era de 1,2%, mas de não ter crescimento algum, no início. Eu não estou entre aqueles que ficam fazendo uma relação direta do crescimento do PIB com o bem estar das pessoas. Isso não está no crescimento nominal e monetário do PIB. Já tivemos momentos no Brasil que teve um crescimento espantoso e houve um processo de crise social. Mas é importante para o ânimo geral de um governo que está iniciando. Este governo tem muita coisa para fazer. Acerta, erra, mas é importante esse tipo de crescimento. Para, quem sabe, com este tipo de proposta, por exemplo, a gente não venha a encantar o Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central) no sentido de a gente ter uma política de taxa básica de juros (Selic). Isso poderia ser um motivo para um grande crescimento do PIB. Ele não vai crescer com uma taxa de 13,75% ao ano, é uma coisa completamente absurda num Brasil que está em decréscimo da inflação e você aumenta a taxa de juro básica. Isso não é praticado em nenhum lugar nenhum do mundo.
O Copom olha também as expectativas de inflação, que subiram depois que o presidente Lula falou em mexer na meta de inflação…
Não acredito que o governo Lula vai mexer na meta da inflação. E não acho que o ministro Haddad vai fazer isso. Não tenho ouvido ele dizer isso e nem os que trabalham com ele também. Não vai acontecer. Isso é um argumento daqueles que não querem que a queda da taxa de juros caia.
Mas todo mundo quer que os juros caiam, mas é preciso uma conjuntura favorável para isso…
Nós já temos uma conjuntura favorável para isso. E não é uma opinião só minha. É a opinião de vários economistas de vários matizes que já apontam para isso. Os diretores do Banco Central precisam entender que agora é o momento para começarem o processo de baixa da taxa de juros. As empresas que estão quebrando e os trabalhadores que estão perdendo o emprego não têm esse mesmo tempo para esperar a conjuntura para o início do ciclo (de queda da Selic). Espero que esse tempo do Copom, que é diferente do tempo da vida das pessoas, fique mais próximo. Não dá para a próxima reunião do Copom (dias 20 e 21 deste mês) não ter uma efetiva demonstração para o povo brasileiro que vai ter o início de uma baixa da taxa de juros. Eu sei, todos sabem, que essa queda não pode ser abrupta. Vai ser um processo gradual. Mas eu estou mais preocupado com a ata do que estiver escrito do que o valor dessa redução. O país precisa crescer para gerar receita para o governo conseguir cumprir as novas metas fiscais do arcabouço fiscal. E com juros de 13,75% (ao ano), não vai haver crescimento.