O Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central, decidiu, nesta quarta-feira (21/6), por unanimidade, manter a taxa básica da economia (Selic) em 13,75% ao ano por mais 45 dias. Foi a 7ª reunião consecutiva do colegiado sem alteração dos juros básicos e, no comunicado, o BC foi mais duro do que o esperado (hawkish, no jargão dos economistas) em relação à inflação, e não deu sinais de quando pretende iniciar o ciclo de queda da taxa básica. A indefinição frustrou o governo, surpreendeu os mais otimistas e dividiu opiniões no mercado para redução da Selic entre agosto e setembro.
Como esperado pelo mercado, foi retirado o trecho da nota do Copom que afirmava que o Banco Central não hesitaria em elevar os juros, caso o processo de desinflação não transcorresse como o esperado — um primeiro passo para uma sinalização de algum corte adiante. No entanto, o Comitê reforçou a preocupação com a persistência inflacionária e voltou a recomendar paciência e cautela para o início do ciclo de queda dos juros".
"A conjuntura atual, caracterizada por um estágio do processo desinflacionário que tende a ser mais lento e por expectativas de inflação desancoradas, segue demandando cautela e parcimônia", destacou o colegiado, reforçando a diretriz de "perseverar até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas". "O Comitê avalia que a conjuntura demanda paciência e serenidade na condução da política monetária e relembra que os passos futuros dependerão da evolução da dinâmica inflacionária, em especial dos componentes mais sensíveis à política monetária e à atividade econômica", frisou.
No comunicado, o Copom ressaltou, ainda, que, em seus cenários para a inflação, permanecem fatores de risco "em ambas as direções". Entre os riscos de alta, citou, por exemplo, a maior persistência das pressões inflacionárias globais e alguma incerteza residual sobre o desenho final do arcabouço fiscal a ser aprovado pelo Congresso — menção que incomodou técnicos do Executivo envolvidos com a proposta.
Banho de água fria
"A nota é um banho de água fria para quem esperava queda de juros em agosto. Continuo achando que é setembro, mas o BC vai precisar mostrar mais flexibilidade para isso acontecer. Até lá, há chance de quedas adicionais da inflação e de uma boa discussão sobre as metas de abrir espaço para queda em setembro, se isso ocorrer", destacou Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados.
Gabriel Leal de Barros, economista-chefe e sócio da Ryo Asset, classificou o comunicado como hawkish, por ainda sinalizar a existência de incerteza residual no arcabouço fiscal e mencionar que a manutenção do juro por período prolongado tem se mostrado adequada. Para ele, o início da queda dos juros está condicionado à decisão do Conselho Monetário Nacional (CMN), no fim deste mês, quando haverá definição sobre a meta de inflação, atualmente de 3,2%, neste ano, e de 3% em 2024 e 2025, com tetos de 4,75% e 4,5%, respectivamente.
"O início é condicional à decisão do CMN, mas dado o comunicado do Copom, o corte em agosto, como vinha sendo precificado pelo mercado, ficou menos provável", afirmou Barros. Ele aposta em corte de 0,25 ponto percentual em setembro, "se a economia desacelerar conforme o esperado, assim como o processo de reancoragem das expectativas de inflação continuar evoluindo na direção correta".
Espaço para corte
Roberto Padovani, economista-chefe do Banco BV, manteve a aposta do início da queda dos juros em agosto, apesar do tom mais duro do comunicado. "Todo mundo esperava que o Banco Central reconhecesse a redução do risco inflacionário gerado pela queda de preços de matérias-primas, em particular dos alimentos, além da apreciação cambial e a melhoria marginal das expectativas para a inflação para 2024. Ele não reconheceu nenhum avanço e ainda sinalizou que a inflação em 2024 estará acima da meta e, portanto, manteve os juros parados, e, ao não sinalizar espaço para corte, acabou sendo bastante duro", explicou. Segundo ele, há chances de o BC mudar essa perspectiva, porque existe espaço "para uma eventual sinalização de estratégia importante".
Especialistas reconhecem que a demora para o BC reduzir os juros está relacionada com a busca da ancoragem das expectativas de inflação, mas, em grande parte, com a ameaça de mexer na meta de inflação, afirmada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). "Se o Lula não tivesse ameaçado mexer no BC e na meta de inflação no início do governo, a Selic teria começado a cair em maio ou em março", destacou Marco Caruso, economista-chefe do Banco Original.
Segundo ele, a melhora dos resultados da atividade econômica e da inflação recentes fez muitos analistas, inclusive ele, anteciparem a previsão de corte da Selic para agosto. Depois de o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, negar a mudança na meta e sinalizar para uma alteração nos prazos, houve uma acomodação nas projeções mais pessimistas.
Ambiente desafiador
Na avaliação de Caio Megale, economista-chefe da XP Investimentos, o BC deixou espaço para um "possível corte e cauteloso" em agosto. "O comitê mencionou alguma melhora nas perspectivas de inflação, o que, a nosso ver, abre as portas para um possível corte na próxima reunião. Ao mesmo tempo, apontou que o cenário continua exigindo cautela e parcimônia, o que significa que o primeiro corte de juros não será agressivo", disse. Ele lembrou que o Copom ainda descreveu o ambiente global como "desafiador", com os bancos centrais enfrentando uma inflação resiliente.
No comunicado, a projeção do Copom para a inflação de 2023 caiu de 5,8% para 5%, enquanto a projeção para a inflação de 2024 recuou de 3,6% para 3,4%, ambas ainda acima do centro das metas atuais. Para Luis Otávio de Souza Leal, economista-chefe da gestora G5 Partners, a manutenção da Selic não foi surpresa, "mas ainda não é possível descartar um início de queda dos juros em agosto". Para ele, a redução da inflação de 2024, para 3,4%, apesar de longe da meta, de 3%, é uma "boa notícia", porque o BC tirou do cenário alternativo manter a Selic em 13,75% ao até o fim de 2024.
Ranking global
A manutenção da taxa básica faz o Brasil continuar no topo do ranking de países com os maiores juros reais (descontada a inflação). Em uma listagem de 40 países elencados pela MoneYou, a taxa de juro real do Brasil ficou em 7,54% ao ano, considerando a inflação projetada para os próximos 12 meses. A média global ficou em -0,73% (ver quadro).
Essa liderança não é motivo de honra para o país, porque prejudica o setor produtivo, que não consegue investir por conta dos elevados custos dos empréstimos. Não à toa, logo após a decisão do Copom, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) lamentaram a decisão.
A CNI considerou a medida equivocada, porque a taxa básica está acima do necessário para o combate à inflação, impondo riscos para a atividade econômica. A Abrainc, por sua vez, destacou que os impactos negativos da Selic elevada "são particularmente severos para os financiamentos imobiliários do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE)", inviabilizando a aquisição de imóveis "para milhares de famílias, uma vez que os altos juros resultam em um aumento exorbitante de 23% nas parcelas do financiamento".
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