Montar o pacote de concursos para o primeiro ano de governo está sendo mais complicado do que a ministra da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI), Esther Dweck, esperava. Ela admite que o prazo de 30 de abril não foi suficiente para fechar os números e, agora, a equipe está concluindo as análises para montar a lista dos órgãos contemplados para ser divulgada em maio.
O anúncio do pacote de certames autorizados para este ano será feito em blocos, e a tendência será privilegiar as vagas com nível superior. O primeiro, que sairá nesta semana, será de 1,5 mil a 2 mil vagas, incluindo a abertura de 502 cargos para a Fundação dos Povos Indígenas (Funai) confirmadas na sexta-feira, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou o projeto de lei que concede o reajuste de 9% aos servidores do Executivo federal a partir de maio. Na ocasião, defendeu a valorização dos servidores e melhores salários.
Além da Funai, serão contemplados nesse primeiro bloco de certames o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e o Ministério do Meio Ambiente (MMA). Estão incluídas, também, mais de 500 vagas de carreiras transversais de analistas que atenderão vários ministérios, inclusive, o MGI. Em uma segunda rodada, estarão contemplados os ministérios da Educação, do Planejamento, e do Trabalho. A expectativa da ministra é abrir mais 2 mil vagas até o fim do mês, totalizando 4 mil novos cargos no Executivo federal.
A economista e professora licenciada reconhece que existe uma demanda maior de vários órgãos, em torno de 8 mil feitas desde o ano passado, soma recentemente calculada pelo Correio. Mas, por enquanto, os que não forem autorizados neste ano devem entrar na fila para o Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa) de 2024, que deverá ser enviado ao Congresso no fim de agosto.
Na avaliação da ministra, é possível fazer uma reforma administrativa, reestruturar carreiras, sem mexer na Constituição. "Não precisa de PEC. As carreiras são todas projeto de lei", frisa. "O então ministro da Economia Paulo Guedes se vangloriava de estar diminuindo a folha de ativos, dizendo que isso era fruto da digitalização. Discordo radicalmente disso. A queda que aconteceu foi de precarização, realmente", afirma.
Além da gestão de pessoal, está sob a responsabilidade da pasta as secretarias de Gestão e Inovação, de Governo Digital, de Coordenação e de Governança das Empresas Estatais, do Patrimônio da União, de Gestão Corporativa, o Arquivo Nacional e a secretaria Extraordinária para a Transformação do Estado.
Dweck é categórica ao afirmar que não haverá venda indiscriminada do patrimônio público e nem privatização. "Em princípio, parou o processo", afirma. Segundo ela, a venda do patrimônio da União não será feita de forma desordenada, mas "usando o ativo da União para fortalecer políticas públicas".
De acordo com a ministra, uma das metas da pasta é qualificar as políticas públicas. "Concurso é apenas uma diretoria dentro de uma secretaria, que é a de gestão de pessoas. Mas temos uma preocupação em melhorar os instrumentos para fazer uma boa política pública", afirma.
A seguir, os principais trechos da entrevista de Esther Dweck ao Correio, na última sexta-feira (28).
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Como será estruturado esse pacote de concursos para este ano?
Existem vários critérios para a autorização, basicamente, mais objetivos, como quanto tempo não tem concurso, quantas pessoas se aposentaram ou saíram nos últimos tempos, quantos estão para se aposentar nos próximos cinco anos, se a área já era prioritária para o governo, se teve alguma mudança de estrutura relevante que demanda mais gente. O ministério faz uma ponderação e aí sai uma lista com desenho bem detalhado. Mas, fora isso, tem carreiras transversais. Estamos muito focados nas três primeiras: analista de infraestrutura, analista de tecnologia da informação (ATI) e analista técnico de Políticas Sociais (ATPS). O governo perdeu muita gente dessas carreiras, em todas as áreas, e queremos dar um peso maior nelas para preencher cargos nos ministérios recém-criados. Depois vem o critério de priorização do governo. A Funai, como confirmei as 502 vagas (na sexta-feira), é uma instituição que estamos priorizando, porque está muito sucateada. No governo passado, houve um lapso enorme e muita gente se aposentou por conta da reforma da Previdência, em 2019, para garantir os direitos. E têm carreiras, como ATI, em que as pessoas saem porque é muito valorizada no mercado privado e com salário relativamente baixo no Executivo. É preciso repor em várias pastas, mas ainda estamos dimensionando isso.
O ministro do Trabalho, Luiz Marinho, cobrou algumas vagas…
Estamos em processo de fechar isso. O caso que o Marinho falou também está na lista de prioridades. Ainda não batemos o martelo sobre as vagas.
A demanda de 8 mil cargos de vários órgãos estimados pelo Correio seria desde o ano passado?
Sim, é o que provavelmente balizou o volume que está no Orçamento deste ano, de R$ 2 bilhões. Só que ali tinham coisas que não são tão prioritárias. Tinha concurso para oito vagas, por exemplo. Uma coisa é o Itamaraty que faz todo ano, outra coisa é fazer um concurso para oito vagas. Não deu. Por mais que seja importante, um órgão em que faltam oito pessoas não está sofrendo. Então, começamos a priorizar aqueles órgãos que realmente estavam sem condições. No caso do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), os concursos estão em aberto e não podemos abrir outro, apesar de precisarem.
Quais serão os níveis de escolaridade?
Uma coisa que aconteceu no governo Jair Bolsonaro foi que, para reduzir custos, eles fizeram muitos concursos para nível médio. No Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), foram 1.000 vagas para nível médio. No Ibama e no ICMBio, eram poucos cargos de nível superior. Achamos que algumas carreiras precisam ser de nível médio, como é o caso da Funai, mas temos uma tendência a priorizar mais as demandas por nível superior. Conversei com a ministra Marina Silva (do Meio Ambiente), porque ela quer que tenhamos um concurso grande de nível superior. Só não podemos abrir um concurso grande de nível superior enquanto esses concursos estiverem vigentes. A nossa lógica é que precisamos ter gente mais perene, que vai ficar, exceto em casos onde tem especificidades que demandem mais o nível médio.
Como está o processo de olhar o tamanho da máquina? É possível fazer uma reestruturação do quadro mesmo aproveitando o que já existe?
Em alguns casos, queremos fazer uma transformação de cargos, e isso exige um projeto de lei. Assim você não aumenta o quantitativo. Um critério que não tinha antes e a gente incorporou é a capacidade de digitalização, que é uma coisa que o presidente Lula mencionou, inclusive. O então ministro da Economia Paulo Guedes se vangloriava de estar diminuindo a folha de ativos, dizendo que isso era fruto da digitalização. Discordo radicalmente disso. A queda que aconteceu foi de precarização, realmente. Agora, isso não significa que a digitalização não reduza a necessidade quantitativa de algumas carreiras. Podemos fazer a transformação ou eventualmente aquele cargo deixar de existir de acordo com o critério de potencial de digitalização. A digitalização é relevante e pode fazer com que você precise de menos gente, mas isso não pode ser feito simplesmente enxugando os órgãos a ponto de ficarem sem condições de trabalho.
A senhora disse que ainda não está fechado, mas dá para ter um número aproximado desse pacote de concursos?
O primeiro bloco, que será divulgado na semana que vem, é de 1.500 a 2.000 vagas. E isso já incluindo os 502 novos cargos da Funai, mais Meio Ambiente, Incra, e os cargos transversais de analistas de Políticas Sociais, de Infraestrutura e de Tecnologia da Informação. Neste pacote, não estão incluídas as universidades. Tem um concurso grande do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística que ainda estamos fechando e estou tentando fazer um pacote de ministérios. No caso do MMA, vai sair sozinho porque Ibama e ICMBio estão com concursos abertos agora. Assim, a gente deve priorizar o provimento. Os ministérios de Educação, do Planejamento e do Trabalho estarão na segunda leva, inclusive o do IBGE.
O MGI também vai ter concurso?
Na verdade, o ministério tem demanda por analistas de infraestrutura e de TI, que são as carreiras transversais para atender vários ministérios.
E quantas vagas devem ser abertas para as carreiras transversais?
Mais de 500, somadas em bloco, para vários ministérios. No MGI, a demanda é mais por analistas de TI e, os analistas de Políticas Sociais, para as novas pastas da área social.
Podemos dizer que, nesta semana, serão autorizados concursos para até 2 mil vagas. E até o fim do mês?
Deve ser algo em torno do mesmo valor talvez.
Quais são suas metas dentro do ministério? A pasta foi desmembrada do Planejamento e houve críticas de que seria desnecessário…
Do ponto de vista muito geral, nossa meta é qualificar as políticas públicas. Concurso é apenas uma diretoria dentro de uma secretaria, que é a de gestão de pessoas. Mas temos uma preocupação em melhorar os instrumentos para fazer uma boa política pública. Quantitativo de pessoal e dimensionamento da folha são relevantes para as políticas públicas. Mas temos toda a Secretaria de Governo Digital que está nesse processo ampliando os serviços digitais do governo e, ao mesmo tempo, se preocupando com a inclusão digital da população, em parceria com Ministério das Comunicações. Temos muito essa preocupação de facilitar a vida dos cidadãos e das empresas por meio de serviços digitais. Temos também na área de patrimônio da União, a pedido do presidente, estamos preocupados com a destinação de interesse social. O presidente Lula vai lançar isso, no dia 11 de maio, e estaremos presentes. A ocasião será o lançamento de um hospital na Bahia, que era um prédio da União, em que o governo da Bahia pediu e está sendo feito o hospital. Isso faz parte das destinações de patrimônio para interesse social. Outra área muito importante no ministério é a Secretaria de Gestão Corporativa, que é quem está pensando no modelo de serviços compartilhados. Essa secretaria hoje tem cinco ministérios, os quatro da Economia e o de Povos Indígenas.
Como ficará essa questão das estatais? Os Correios estão fora do programa de privatização?
Em princípio, parou o processo. Não tenho como garantir 100% se não vai ter alguma análise de alguma empresa que precisaria ser privatizada. Mas esse processo indiscriminado de venda de patrimônio em geral, seja patrimônio imobiliário, seja de participação da União, seja de estatais inteiras, parou. O que estamos fazendo é, respeitada a gestão corporativa de cada empresa, claro, mas pensar nela como um apoio a políticas públicas. Talvez o maior exemplo que eu possa dar é aquele que está sob a minha gestão, de fato, a Dataprev. Estamos em contato com o Serpro, que está ligado ao Ministério da Fazenda, a partir da Secretaria de Governo Digital, para que essas duas empresas de TI tenham um papel relevante nessa infraestrutura de dados públicos. Elas têm grande datacenter, super seguros. O da Dataprev é o segundo maior e o mais seguro do Brasil, só perde para o do Itaú em termos de tamanho. E tem espaço para crescer, para ampliar a prestação de serviço. Estamos fortalecendo, nesse sentido, as empresas. Tinha uma lógica também de que as empresas, basicamente, não podiam investir. Tinham que distribuir lucro e não podiam contratar ninguém. Então, estamos fortalecendo um pouco essas empresas e priorizando que elas façam investimentos relevantes.
Está dando trabalho definir essas autorizações dos concursos?
As avaliações estão sendo feitas por meio desses sete critérios, incluindo a digitalização, que servem para um balizamento. E, depois, fazemos um recorte de priorização. Tínhamos uma data, 30 de abril, para dar uma resposta aos órgãos para eles fazerem os pedidos para o próximo ano. Mas não deu para fecharmos. Por isso que maio será um mês relevante para nós, porque será a resposta final dos órgãos sobre os pedidos para o próximo ano. Temos esse prazo, de 31 de maio, para darmos uma resposta aos órgãos a respeito do que vai ser autorizado neste ano, e o que está na fila vai ficar para o Orçamento do ano que vem.
É possível ter aproximadamente o mesmo volume de recursos para concursos no próximo ano?
Neste momento, eu não tenho a menor ideia, porque depende do que vai ser aprovado no Congresso, no projeto de lei do novo arcabouço fiscal.
Agora, dentro da estratégia de reestruturação de carreiras, este governo vai propor uma PEC própria de reforma administrativa?
Estamos com foco em, digamos assim, racionalizar as carreiras. É uma das coisas que estamos pensando. Ainda não tem um plano definido. Mas estamos estudando.
É possível ainda neste ano ou para os próximos?
Queremos ter um diagnóstico neste ano, mas eu não tenho certeza. Agora, estamos fazendo, em paralelo, a discussão de supersalários, a discussão da própria regra de concursos, a discussão de algumas coisas que estão associadas a uma reforma administrativa, mas que não precisa de uma PEC, gera só um projeto de lei. A lógica da PEC do Teto de Gastos era para cortar os mínimos constitucionais de saúde e de educação, porque a regra fiscal não precisa de PEC. Estamos fazendo uma regra fiscal que não precisa de PEC. E, no caso do governo Bolsonaro, a PEC 32 da reforma administrativa era para poder colocar o fim da estabilidade, possibilidade de demissão e de redução de jornada e de salário. Eram coisas que a Constituição não permitia que precisaria de uma PEC para fazer.
Quer dizer que não precisa de PEC para fazer reforma administrativa?
Não precisa de PEC. As carreiras são todas projeto de lei.
Mas é preciso regulamentar a questão da estabilidade dos servidores…
Em tese, demite-se muito servidor público todo ano, por Processo Administrativo (PAD). Não é uma coisa incomum, mas tem que ser motivada (a demissão). E existem os critérios e muitos desses processos estão associados a algum tipo de corrupção ou algum problema administrativo que pode levar à demissão. Mas o que o governo anterior queria fazer era uma espécie de demissão motivada por questões fiscais, algo que sou contra, porque eu acho que a estabilidade é uma proteção do Estado. Eu me lembro, na CPI da Covid, a ministra Simone Tebet (Planejamento) falando que era um servidor público que só denunciou porque ele tinha estabilidade, senão, corria o risco de demissão. No governo Bolsonaro, se não houvesse estabilidade, ele teria demitido todo mundo que eles achavam que era de esquerda. E, para demitir gente, eles começaram a abrir processo administrativo por perseguição política também. Outro dia, encontrei um servidor do Meio Ambiente que era o líder sindical e ele alegou que foi demitido por uma perseguição política. E tenta ser reintegrado.
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