CONGRESSO

Inflação baixa é o melhor programa social, diz Campos Neto

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, esteve no Senado, com a estratégia de evitar ruído com o governo, adotando discurso técnico

Henrique Lessa
postado em 25/04/2023 18:28 / atualizado em 25/04/2023 18:34
A CAE realizou audiência pública para ouvir o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto -  (crédito: Marcos Oliveira/Agência Senado)
A CAE realizou audiência pública para ouvir o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto - (crédito: Marcos Oliveira/Agência Senado)

Durante audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, afirmou nesta terça-feira (25/04), que a inflação baixa é o melhor programa social que existe.

Aos parlamentares da comissão, o chefe do BC buscou apresentar um discurso técnico em que justificava a atual taxa de juros como uma medida para conter o processo inflacionário, que afirmou ser a maior injustiça para a população pobre. "A inflação é um elemento muito corrosivo para os rendimentos dos mais carentes, e a gente precisa fazer isso da forma mais suave possível", disse.

Voltou a reiterar a posição de que, para trazer a inflação para o centro da meta ainda em 2023, a taxa de juros deveria subir quase 13 pontos percentuais, de 13,75% para 26,5%, mas ponderou que a autarquia suaviza e alonga o tempo de atingir a meta para que a alta na taxa de juros seja a menor e, assim, tenha o menor impacto social possível. "Se o Banco Central quisesse convergir à meta em 2023, para 3,25%, teria subido o juro no começo do ano para 26,5%. É óbvio que a gente não fez isso e não vai fazer isso”, disse Campos Neto.

"Nosso trabalho é fazer a inflação convergir para a meta com o mínimo de custo social", disse”, disse o presidente do BC que refutou a afirmação que o Brasil caminha para uma recessão.

Campos Neto foi convidado pela Comissão para dar explicações sobre a taxa básica de juros (Selic) — fixada em 13,75% ao ano desde agosto de 2022 — depois das insistentes críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e do governo sobre a definição do índice o que tem levado o presidente a questionar a autonomia do BC prevista em lei desde 2021. Para Lula, o nível atual dos juros não se justifica com uma inflação puxada mais por fatores externos, que internos e quando o país precisa retomar o crescimento econômico.

Seguindo a linha de manter um discurso técnico, Campos Neto evitou críticas diretas ao governo, e tentou se esquivar de falar sobre a questão fiscal, além de negar que o culpado pelo baixo crescimento econômico brasileiro seja do BC.

Sem prazo para queda

Aos parlamentares, Campos Neto disse que não pode estimar quando os juros começam a cair no país. Reforçou que, dentro do Conselho de Política Monetária do Banco Central, o Copom, tem apenas um voto e disse que no último processo decisório, que manteve a taxa Selic em 13.75%, o Colegiado teve 1 voto pela elevação da taxa, que não foi o dele, que seguiu a posição majoritária pela manutenção do índice.

Segundo Campos Neto, a redução dos juros depende muito do nível de confiança do mercado na solidez da economia nacional e apontou que isso se reflete na taxa de juros futura estimada pelo mercado, que é a referência para as taxas aplicadas em operações de crédito ao empresário e ao consumidor final.

Arcabouço

Apesar de cauteloso ao falar de assuntos relacionados ao campo fiscal, como a tributação e a arrecadação do governo, em resposta a um senador sugeriu que o novo arcabouço fiscal apresentado pelo governo deve ter um efeito pequeno sobre as expectativas de redução dos juros.

“Não é tarefa do Banco Central falar sobre o fiscal, mas quando o plano fiscal é mais de corte de despesas ele tem mais efeito sobre a inflação, quando é mais sobre receitas ele tem menos efeito”, disse o presidente do Banco Central (BC).

Mas considerou em seguida que o projeto do arcabouço apresentado na semana passada pelo governo é “o caminho a ser seguido”.

“Foi um movimento na direção certa. Gostaria de dizer de novo, voltando ao evento da Inglaterra, que não tem bala de prata. É muito difícil um país seguir o regime de metas que a gente segue sem ter um regime de disciplina fiscal. Entendemos que esse é o caminho a ser seguido”, disse o presidente da autarquia.


Maior taxa real do mundo

Muito cobrado pelos senadores governistas quanto a uma explicação para o motivo da taxa de juros real do Brasil ser a maior do mundo, o presidente do BC saiu com uma justificativa que não parece ter convencido os parlamentares.

"Quando a gente olha o núcleo - porque lembra que a nossa taxa de inflação foi contaminada por ter tirado imposto de várias coisas e agora o imposto está retornando - é mais comparável entre os outros países. Tirando o preço de alimentação e comida, a gente vê que a taxa de juro real do Brasil está parecida com a do México, está próxima à de alguns países, e quando a gente olha a taxa de juros ex-ante, que é taxa de inflação esperada frente aos juros esperados, que é como o mundo faz essa comparação, a gente vê que o Brasil está próximo de alguns outros países também", disse o presidente do Banco Central.

O que Campos Neto chamou de núcleo da inflação é o valor calculado pelo BC que aponta uma medida da tendência para os preços sem a influência de políticas públicas ou choques temporários. A inflação de 2022 que fechou em 5,8% no cálculo do BC do núcleo, sem as desonerações de combustíveis e telecomunicações realizadas pelo governo anterior, sobe para 8,7%. O problema apontado na comparação de Campos Neto é que ela ignora que a maior parte dos países também adotaram medidas anti-inflacionárias que também incluíram desonerações.

Argentina

Campo Neto buscou apontar a independência técnica do Banco Central e afirmou que em 2022, mesmo em um ano eleitoral, o BC realizou a maior subida de juros em um ano eleitoral em função das previsões da inflação futura.

Para ele, a inflação de 2022 seria de mais de 10%, em vez dos 5,8%, sem a política de forte subida de juros da autoridade monetária, no ano eleitoral.

Segundo o presidente do BC, uma queda por “canetada” nos juros poderia levar o Brasil a uma situação similar a Argentina, que sofre com uma inflação descontrolada e a ampliação da pobreza.

Crédito

Entre as razões para a atual taxa, Campos Neto apontou que cerca de 40% do crédito negociado no país têm algum tipo de subsídio.

"O Brasil tem um volume de créditos direcionados de 40,3%. Não tem país no mundo que tenha um volume de crédito direcionado tão grande. É como se tivesse a meia entrada. Se eu vejo muita meia entrada, a entrada inteira tem que ser mais cara, para eu poder controlar o dinheiro que entra no cinema” apontou o dirigente do BC apontando outra razão das taxas de juros elevadas.

Outro fator contribuinte para a taxa, segundo Campos Neto, é a dívida pública brasileira — que chegou a 73% do PIB (R$ 7,4 trilhões) em fevereiro —. O dirigente do BC apontou que ela "não é explosiva, mas é maior que a média."

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