Jornal Correio Braziliense

Âncora fiscal

Governo estuda uma espécie de 'Plano Safra' para a indústria

Após uma rodada de reuniões com empresários e agentes financeiros sobre o novo arcabouço fiscal, em São Paulo, ministro da Fazenda, Fernando Haddad, diz que governo está estudando um programa para reindustrializar o setor produtivo nos moldes do Plano Safra

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, adiantou que, entre os planos do governo para a reindustrialização da indústria, está sendo considerada uma demanda dos empresários para estimular o setor, como ocorre com o agronegócio, a criação de uma espécie de Plano Safra. O programa, segundo ele, está “começando a ser discutido” pelo governo.

“Nós recebemos vários setores da indústria aqui e é importante que aí a indústria se enxergue na nova regra fiscal, porque há demandas da indústria de reindustrializar o país e para isso, há várias demandas que cabem dentro dessa nova regra, como, por exemplo, uma espécie de Plano Safra para a indústria”, afirmou Haddad, nesta sexta-feira (31/3), a jornalista, em São Paulo, onde realiza uma série de reuniões com empresários, banqueiros e agentes financeiros.

“O Plano Safra é muito conhecido porque é uma coisa muito transparente, com a qual os economistas em geral concordam que é de fomento ao incremento da produção agrícola no país, que durante mais de duas décadas trouxe ganhos de produtividade muito expressivos para o Brasil. O Brasil é uma potência agrícola", lembrou Haddad. 

Ele então revelou a proposta de se fazer algo semelhante em relação à indústria. "Estão começando a se desenhar alguns programas voltados para isso, com a transparência que tem o Plano Safra, que é rubrica orçamentária, tudo transparente, com atendimento universal, tanto para o pequeno produtor quanto para o grande produtor”, explicou. "Isso está começando a ser discutido, obviamente, a partir da provocação de um grupo de empresários que nós recebemos”, acrescentou.

"Recebemos também a Fiesp, recebemos uma associação das instituições ligadas ao mercado de capitais que está muito interessada em fomentar essa reindustrialização por meio do mercado de capitais. Qual a vantagem dele? O juro acessível, um juro mais baixo para que quem queira produzir e gerar empregos possa fazê-lo sem pagar as taxas exorbitantes que nós vemos no mercado em função do juro fixado pelo Banco Central", explicou o ministro.

Arcabouço fiscal

Em conversa com jornalistas, Haddad comentou que empresários e agentes financeiros receberam bem o novo marco fiscal, em série de reuniões ocorridas em São Paulo. Segundo ele, a proposta é um ponto de partida. "Há alguns detalhes que vão ter que ser equacionados no tempo e que vão ser apresentados, porque é o chamado arcabouço, a regra fiscal, é só o começo de um trabalho de recuperação das contas públicas para ampliar o nosso horizonte de planejamento e investimento”, afirmou o ministro aos jornalistas.

O chefe da equipe econômica ressaltou que o modelo da nova regra fiscal terá "uma distância razoável" entre incremento de receita e incremento de despesa para sinalizar que o governo busca ser responsável fiscalmente. "Essa distância vai ser de 30% ou 50%, então, não é pouca distância. Então, sim, se a receita crescer, a despesa pode crescer, mas ou 70% ou 50% se as metas de superávit não estiverem sendo cumpridas. Então, é uma margem de segurança bastante razoável", avaliou Haddad.

Em relação ao cumprimento das metas fiscais, o governo precisará ter aumento de receita. O ministro reiterou que não pretende criar novos tributos, mas rever desonerações e distribuir a carga tributária com quem sonega ou está fora do sistema tributário, a fim de ampliar a base tributária.

"Eu reitero: nós não estamos falando de novos impostos, não estamos falando de aumento de alíquotas dos atuais impostos. Nós estamos falando daquilo que em Brasília se chama de jabuti. Aquelas leis que foram aprovadas muitas vezes na calada da noite, que abriram espaço para abusos, que muitas vezes foram ampliados por decisões administrativas ou judiciais e que distorcem a competitividade da economia brasileira", afirmou. "Isso não tem nada a ver com carga tributária. Isso tem a ver com reparação e recomposição da base fiscal", explicou.

O ministro defendeu esse tipo de medida complementar para colocar em pé o novo arcabouço fiscal para que o governo possa fazer frente às despesas relativas ao financiamento de programas sociais, da saúde e da educação, "sem o abuso dos juros que se praticam hoje no Brasil". "Quando você descasa a receita da despesa, o que acontece? Se abre um buraco nas contas, sugere mais inflação, e, muitas vezes, a autoridade monetária, que é o Banco Central, acaba abusando das taxas de juro para conter a subida de preços. E o consumidor, o trabalhador, o cidadão acaba sendo penalizado duas vezes pela inflação num primeiro momento e depois pelos juros altos num segundo momento. É dessa armadilha que nós temos que escapar”, explicou Haddad, ao defender o equilíbrio das contas públicas e o ataque ao patrimonialismo.

“Por isso o equilíbrio é tão importante. E o equilíbrio das contas só vai se dar de forma justa se você afastar o que a gente chama de patrimonialismo da economia brasileira, que é aquela economia do favor, do jeitinho. Sempre tem alguém lá dando um jeitinho para o seu próprio negócio e a economia brasileira de jeitinho vai se deteriorando, como aconteceu nos últimos anos”, acrescentou.

Reforma tributária

O ministro contou que também conversou sobre reforma tributária nos encontros com empresários. “Esse é um outro tema que interessa muito à indústria. A indústria tem praticamente uma obsessão com o tema da reforma tributária, porque ela, apesar de responder por 11% a 12% do Produto Interno Bruto (PIB), paga quase 30% dos impostos.

Então, o imposto sobre consumo no Brasil é muito alto em se tratando de bens manufaturados. E a reforma tributária vai ao encontro do desejo dos industriais de ampliar a competitividade dos produtos brasileiros”, explicou.

De acordo com Haddad, o setor produtivo também demandou medidas fortes para combater o contrabando e a sonegação, mais transparência e alíquotas adequadas para que a indústria seja mais competitiva. “Portanto, há uma demanda para que o imposto sobre o consumo, ao longo do tempo, diminua no Brasil. Ele é muito alto em relação aos países da OCDE e do G-20. Isso tudo está na agenda do governo”, afirmou ele citando o clube dos ricos, a Organização para Cooperação do Desenvolvimento Econômico e o grupo das 19 maiores economias desenvolvidas e em desenvolvimento do planeta mais a União Europeia.