Após a recente quebra do Silicon Valley Bank (SVB) e do Signature Bank, nos Estados Unidos, o mercado financeiro teve ontem mais um dia de tensão diante da possibilidade de o tradicional banco europeu Credit Suisse, um gigante com presença em todo o mundo, enfrentar uma crise de liquidez e contaminar o sistema financeiro internacional. As ações do banco sofreram baixa de 13,9%, mas chegaram a cair mais de 26% durante o dia.
As bolsas recuaram em todo o mundo, mas as perdas foram amenizadas depois que o Banco Nacional da Suíça (SNB) prometeu fornecer liquidez ao Credit, em caso de necessidade.
No Brasil, o nervosismo levou o dólar a fechar em alta de 0,70%, cotado a R$ 5,294 para venda — o maior valor desde 5 de janeiro. Nos momentos de maior estresse, no início dos negócios, a divisa bateu na máxima de R$ 5,33 ( 1,36%), com investidores fugindo de aplicações de risco e buscando refúgio na moeda norte-americana. No começo do pregão, a Bolsa de Valores de São Paulo (B3) mostrou queda de 2,18%, mas acabou fechando com recuo de 0,25%, aos 102.675 pontos, o menor patamar desde 1º de agosto do ano passado.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que está acompanhando com sua equipe a crise do Credit Suisse e informou ter entrado em contato com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto para tratar de eventuais efeitos na economia brasileira.
Para o economista-chefe do Itaú Unibanco, Mário Mesquita, "o Brasil não está imune, apesar de o impacto da crise ser maior na Europa. Esse é um risco a ser monitorado", afirmou. Segundo Mesquita, a crise está claramente afetando o mercado de capitais, mas a preocupação maior é com a possibilidade de uma desaceleração brusca do crédito. Segundo Mesquita, haverá muita volatilidade nos próximos dias, mas ainda é cedo para saber o tamanho dos efeitos no mercado global.
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Casos pontuais
De acordo com Silvio Campos Neto, da Tendências Consultoria, o impacto no Brasil ainda vai depender dos desdobramentos nas próximas semanas. Ele lembrou que o mercado de crédito local já estava retraído por causa da crise na Americanas e pelo aperto monetário. "Já tínhamos problemas conhecidos e que apontavam para um crédito mais caro. Agora, temos esse fato novo, mas é difícil mensurá-lo."
O economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, não vê perigo de uma crise global. "Não estamos em uma situação como a de 2008, que teve um problema sistêmico e muito mais grave. Agora, são crises em bancos que foram mal conduzidos e que estão pagando o preço por isso", disse.
Vale observou que, no caso do SVB — o "banco das startups" —, o problema foi o maciço investimento feito pela instituição em títulos de longo prazo do Tesouro americano que, na época, pagavam juros baixos. Com a alta dos juros promovida pelo Fed, o banco central dos Estados Unidos, os ativos perderam valor. Ao mesmo tempo, muitos clientes passaram a sacar seus recursos, porque o financiamento para empresas de tecnologia secou.
Felipe Salles, economista do banco C6, observou que a regulação do sistema bancário americano hoje é muito mais robusta do que a de 2008 e as instituições estão mais capitalizadas, o que dificulta um colapso como o ocorrido 15 anos atrás.
De acordo com analistas, o Credit Suisse foi colocado no centro da turbulência porque enfrenta problemas de confiança desde novembro do ano passado, depois de passar por acusações de acobertar lavagem de dinheiro e apresentar maus resultados. Na última terça-feira, a instituição surpreendeu o mercado ao informar ter identificado "debilidades significativas" em seus sistemas de controle nos últimos dois anos. Ontem, a queda do valor das ações se intensificou após o principal acionista do Credit, o Saudi National Bank (SNB), descartar mais assistência financeira à instituição.
Além do banco suíço, a turbulência afetou também as ações de outros grandes bancos europeus. Na França, os papéis do Société Générale e do BNP Paribas, os dois maiores do país, sofreram quedas de mais de 10%. As ações do alemão Deutsche Bank caíram 8%.
Com a derrocada dos bancos, as bolsas europeias registraram baixas significativas: 3,83% em Londres, 3,27% em Frankfurt 3,58% em Paris.
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Juros
Diante da deterioração do ambiente financeiro, analistas passaram a considerara a hipótese de que o Banco Central Europeu (BCE) não cumpra, hoje, a decisão de elevar os juros básicos juros em 50 pontos-base, como vinha sinalizando. A medida seria uma forma de aliviar o aperto monetário, que vem sendo conduzido para segurar a inflação, e evitar o surgimento de novos focos de problemas no sistema bancário.
Nos Estados Unidos, voltaram a ser majoritária as apostas de que o Federal Reserve, o banco central do país, opte por manter a taxa básica inalterada neste mês, em vez de promover nova elevação de 25 pontos-base.
"O momento é de muita incerteza. Podem ser casos específicos, mas existe o risco de efeito em cadeia e sistêmico no setor financeiro que gere problemas maiores para a economia global. Os mercados começam a precificar um cenário recessivo, com commodities e juros para baixo", afirmou o sócio e economista-chefe do Banco Modal, Felipe Sichel. (Com Agência Estado)
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