Após uma manhã de instabilidade e trocas constantes de sinal, o dólar à vista ganhou fôlego ao longo da tarde e encerrou a sessão desta terça-feira (28/2) cotado a R$ 5,2250, em alta de 0,34%, na contramão da tendência de baixa da moeda americana frente a divisas emergentes pares do real. No mês, o dólar acumulou uma valorização de 2,92%, depois ter recuado 3,89% em janeiro. Com o mercado à vista fechado, o dólar futuro para abril acelerou bastante o ritmo de alta e fechou a R$ 5,272500, avanço de 0,72%, após ter registrado máxima a R$ 5,281500, em meio a declarações do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, cobrando que o Banco Central reduza os juros.
Apesar do aumento dos ruídos políticos domésticos, com a escalada de ataques do presidente Lula ao BC ao longo do mês, a depreciação do real em fevereiro é atribuída, sobretudo, à onda de valorização da moeda americana no exterior. Uma série de indicadores da economia dos EUA, em especial de emprego e inflação, esfriaram apostas em interrupção iminente do processo de aperto monetário pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano) e em eventual corte de juros no fim de 2023.
- Com Haddad, Ibovespa vai ao piso do dia, abaixo de 105 mil; no mês, cai 7,49%
- Gasolina terá alta de R$ 0,47 e etanol, R$ 0,02, com volta de impostos
Essa mudança de expectativas abalou moedas emergentes e de países exportadores de commodities. Entre pares do real, peso chileno caiu quase 4% e rand sul-africano amargou perdas superiores a 5%. Peso mexicano foi uma das raras exceções, com ganhos acima de 2% ante o dólar, em razão da alta acima do previsto da taxa de juros pelo Banco Central do México (Banxico) neste mês.
"Houve uma mudança da perspectiva para a alta de juros, com perspectiva de economia americana ainda aquecida e inflação em um nível desconfortável", afirma o analista de mercado Eduardo Moutinho, da consultoria Ebury, que trabalha com mais três altas de juros nos EUA (em março, maio e junho). "Fevereiro foi um mês muito forte para o dólar no exterior, com recuperação das perdas de janeiro".
Na sessão desta terça-feira, operadores ressaltam que a formação da taxa de câmbio esteve refém em parte da disputa pela formação da última taxa Ptax de fevereiro, com a tradicional disputa entre "comprados" e "vendidos", e da rolagem de posições no mercado futuro, embora tenha havido também cautela diante do imbróglio dos combustíveis. A máxima da sessão, a R$ 5,2425 (+0,68%), se deu por volta das 13h30, e coincidiu com perdas fortes do Ibovespa, abalado pelo tombo das ações da Petrobras.
Após receber bem ontem a notícia da reoneração dos combustíveis, o mercado se acautelou hoje diante da redução de preços de gasolina e diesel pela Petrobras e, sobretudo, da notícia de provável mudança na distribuição de dividendos da companhia. Pela política atual que leva em conta o preço de paridade de importação (PPI), havia espaço para redução anunciada pela Petrobras. Há temores, contudo, de que o PPI seja abandonado e a empresa passe a arcar com subsídios nos preços dos combustíveis, tendo em vista declarações recentes de Lula.
Segundo o gerente de câmbio da Treviso Corretora, Reginaldo Galhardo, com o ambiente político conturbado, a volatilidade dos ativos domésticos está elevada. "Os investidores estrangeiros ainda buscam um pouco de equilíbrio para proteção dos recursos alocados aqui", diz Galhardo, ressaltando que o 'fogo amigo' contra Haddad aumenta as incertezas. "A volta da tributação dos combustíveis veio colada com o anúncio de redução de preços e dúvidas sobre o papel da Petrobras, o que favoreceu os 'comprados' hoje".
O mercado também operou na expectativa pela entrevista coletiva do ministro da Fazenda sobre combustíveis, com início marcado a partir das 17h, após, portanto, o fechamento do mercado à vita. Embora a volta de PIS e Confins sobre gasolina e álcool, vista como uma vitória parcial de Haddad, possa ajudar a reduzir o déficit neste ano, havia muitas dúvidas sobre a modulagem da reoneração.
"Houve um componente técnico importante hoje para o dólar, por conta do fim do mês e da formação da Ptax. Mas a incerteza sobre como se dará a reoneração dos combustíveis e essa redução de preços pela Petrobras trouxe uma cautela para o câmbio", afirma a economista Cristiane Quartaroli, do Banco Ourinvest.
Declarações de Haddad em entrevista provocaram desconforto nas mesas de operação e levaram o dólar futuro para abril a acelerar o ritmo de alta e renovar máximas. O ministro disse que a reoneração de tributos federais da gasolina será de R$ 0,47 centavos e, do etanol, de R$ 0,02 centavos. Haverá também aplicação de imposto de importação sobre óleo cru por quatro meses, para assegurar arrecadação de R$ 28 bilhões previstos no pacote anunciado pela pasta.
As atenções se voltaram, contudo, à fala do ministro sobre a política monetária. Segundo Haddad, o BC teria afirmado que a reoneração era "condição para redução de taxa de juros". Mais: o ministro disse que esperar que o BC "reaja da maneira prevista nas atas do Copom" e que taxa Selic de 13,75% "é insustentável". Antes visto como anteparo às pressões do presidente Lula sobre o BC, Haddad parece fazer coro agora com a ala política do governo no ataque à gestão da política monetária.
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