Contas públicas

Haddad diz que proposta para substituir teto de gastos será entregue em março

Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, diz que proposta para substituir o teto de gastos será enviada em março ao Congresso

Rafaela Gonçalves
postado em 16/02/2023 03:55
 (crédito:  Marcelo Camargo/Agência Brasil)
(crédito: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, antecipou seus planos e afirmou que o novo arcabouço fiscal — regra que vai substituir o teto de gastos — será encaminhado ao Congresso em março. O cronograma inicial previa que a medida, que visa controlar as contas públicas, seria apresentado aos parlamentares em abril, mas segundo Haddad, a ministra do Planejamento, Simone Tebet, e o ministro da Indústria e Desenvolvimento, o vice-presidente Geraldo Alckmin, o convenceram a concluir a proposta antes, para que o Legislativo tenha mais tempo para analisá-la.

"A Simone e o Geraldo Alckmin ponderaram que, para mandar em abril, com a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias), era bom termos um período de discussão antes", afirmou o ministro da Fazenda, durante seminário promovido pelo BTG Pactual, em São Paulo. O anúncio pode ser visto também como um aceno ao mercado em meio ao embate entre o Planalto e o Banco Central (BC) por conta das taxas de juros elevadas. O novo arcabouço fiscal é visto pelos investidores como essencial para recuperar a credibilidade das contas públicas e, desse modo, permitir a queda dos juros.

Segundo Haddad, a proposta deve ter metas exigentes de equilíbrio fiscal, mas realistas. "Estamos estudando regras do mundo inteiro e documentos de todos os organismos internacionais. Nenhum país adota teto de gastos, porque você consegue atingir", pontuou. "Tem que ser rigoroso, mas um ser humano tem que conseguir fazer aquilo. Quando você projeta cenários irrealistas, você vai perdendo credibilidade", acrescentou.

O ministro disse entender a ansiedade do mercado com as primeiras medidas do novo governo e afirmou que é preciso ter "calma". "Eu entendo perfeitamente essa ansiedade do mercado, dessa meninada que fica na frente do computador dando ordem de compra e venda. Cada espirro em Brasília gera uma enorme turbulência, vejo o dólar e a Bolsa, mas isso tudo vai se dissipar", garantiu.

"Sem radicalismo"

Durante o mesmo evento, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), alertou que um texto "radical" sobre regras fiscais não teria sucesso no plenário do Congresso. Na visão do deputado, a âncora que substituirá o teto de gastos — a norma atual, que limita o crescimento das despesas públicas à inflação — deve ser "razoável", "equilibrada" e "moderada".

"O próprio ministro Fernando Haddad se sentou à mesa com todas as lideranças da Câmara na discussão da PEC da Transição, e fizemos um acordo para que seja um texto médio, que possa angariar apoio de base de mudança constitucional. Ou seja, um texto radical para um lado ou para outro não terá sucesso no plenário do Congresso", disse Lira.

E reforçou: "Esse compromisso foi feito na presença de todos os líderes, da oposição e do governo, para que os ministério da Fazenda e do Planejamento possam fornecer ao Congresso uma proposta que trate de responsabilidade fiscal sem esquecer a justiça social, que seja um texto moderado".

Ontem, em breve discurso durante sessão solene no Congresso para marcar os 130 anos do Tribunal de Contas da União (TCU), o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, defendeu a transparência das contas públicas. "Hoje, a gente precisa se concentrar em ter uma disciplina fiscal, entendendo que precisamos ter um olho mais especial no social. Quanto mais transparente e eficiente o setor público for, mais aptos seremos de captar recursos privados", ressaltou.

Campos Neto, que tem sido alvo de ataques do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), também defendeu os "ganhos institucionais dos últimos anos", numa referência à autonomia do BC.

Bolsa sobe

A definição de um novo prazo para a apresentação do arcabouço e o tom conciliador da Fazenda e do BC agradou os investidores. O Ibovespa, principal índice da Bolsa de Valores de São Paulo (B3), fechou em alta de 1,62%. "Esse alinhamento deu uma tranquilidade ao mercado, que vinha sendo pressionado por essas duas questões. As falas do governo deram uma acalmada e provocaram uma queda na curva de juros, que é um grande ponto de atenção. Com isso, as ações tiveram performance positiva", avaliou Rodrigo Moliterno, head de renda variável da Veedha Investimentos. (Colaborou Raphael Felice)

Apoio à revisão das metas

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ganhou um apoio inesperado de três dos maiores gestores de fundos de investimento do Brasil para a revisão das metas da inflação. Conhecidos como "tubarões" do mercado financeiro, Luis Stuhlberger, gestor do fundo Verde, Rogério Xavier, do SPX, e André Jakurski, do JGP, entoaram críticas às atuais metas estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), durante evento do BTG Pactual.

Hoje, ocorrerá a primeira reunião do CMN no governo Lula. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que a revisão da meta não entrará na pauta desse encontro, mas o tema ganhou relevância, e há uma união incomum entre economistas de perfis ortodoxo e heterodoxo que consideram muito baixas as metas de 3,25% para a inflação deste ano e de 3% para 2024 e 2025.

Xavier, da SPX, criticou a parcela do mercado que é contra a revisão por receio de desancoragem das expectativas para a inflação. "Se temos uma reunião anual para reavaliar metas de inflação, por que é um dogma tão grande corrigir? Quando o meu "trade" está errado, vou para outro. Por que estamos perseguindo um objetivo inalcançável?", questionou o gestor, afirmando que o problema é a incerteza fiscal e a falta de confiança nas medidas de aumento da arrecadação anunciadas pelo ministro da Fazenda, que estava na plateia e ouviu a crítica.

Pela atual regra do sistema de metas, elas são reavaliadas sempre em junho pelo CMN, mas Lula gostaria de uma mudança a curto prazo, com a fixação de objetivos mais elevados para que o Banco Central baixasse os juros mais rápido, favorecendo o crescimento econômico.

Jakurski e Stuhlberger engrossaram o coro ao pedir reavaliações da meta. "Acho que a discussão é cabível, não é o fim do mundo. Buscar uma meta irrealista não é uma coisa boa para o Brasil no atual momento", disse Stuhlberger, gestor do fundo Verde. Em seguida, ele afirmou que discutir mudanças na meta não deveria implicar perda de credibilidade da política monetária. "Buscar uma meta irrealista não é algo bom. Tem que ter um arcabouço fiscal crível, os dois juntos vão nos levar a um lugar melhor", acrescentou.

Em uma avaliação parecida, Jakurski, da JGP, disse que "a meta está errada". "Eu acho que não dá para perseguir essa meta", destacou. "Acho que esse juro real no Brasil é impressionantemente alto, que o Brasil não vai dar certo com esse juro, e ponto final", finalizou o gestor, que criticou o governo por priorizar a reforma tributária. Ele definiu como mais importante a aprovação de uma nova âncora fiscal para substituir o teto de gastos. 

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