Pelo segundo dia consecutivo, a União fez reuniões para articular uma compensação aos governos estaduais pelas perdas com a desoneração do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre combustíveis, energia elétrica, gás natural, telecomunicações e transporte público no ano passado. O valor da compensação aos entes deve ser intermediário ao volume das perdas, cujos cálculos variam entre R$ 13 bilhões até R$ 45 bilhões, e o pagamento deve ser feito de forma escalonada, durante os próximos quatro anos.
Em um debate realizado durante todo o dia de ontem, o Comitê Nacional dos Secretários da Fazenda dos Estados e do DF (Comsefaz) buscou avançar nos pontos discutidos entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e os governadores em um encontro na véspera. Segundo o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, a reunião com os secretários foi importante para a reconstrução das relações federativas.
"Há anos os estados não tinham uma agenda deste tipo no Ministério da Fazenda, com o Tesouro Nacional, com representantes da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e a Advocacia Geral da União (AGU), o que demonstra a relevância que o governo federal está dando às relações federativas", afirmou Ceron.
As negociações desta quarta-feira, realizadas na Secretaria do Tesouro, foram técnicas. Apenas os governadores, em nova conversa com o ministro, é que poderão definir os valores da compensação. Os estados também devem apresentar uma proposta para alongamento do prazo de pagamento de dívidas com a União. O governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB), disse, após a reunião com Haddad, que o encontro foi bastante positivo e que o acordo está "bem encaminhado", mas ainda não estão definidos os valores das compensações e o prazo de pagamento aos estados, que devem ser parcelados.
"O governo federal quer fazer a recomposição e pediu que ela possa ser feita dentro deste período de mandato, nos próximos quatro anos, e vai discutir uma média entre aquilo que nós achamos que é a perda, até R$ 45 bilhões, e a portaria feita no governo Jair Bolsonaro (PL), que apontava para R$ 13 bilhões de recuperação", afirmou o governador.
Segundo ele, o valor da compensação será uma média definida individualmente e, em alguns casos, os estados poderão abater o valor na dívida com a União. "Cada caso, cada estado é uma realidade. Saiu a decisão de fazer a compensação, mas os detalhes ainda serão discutidos", disse Casagrande, que afirmou que a fonte do recurso não foi apresentada pela Fazenda, mas que o ministro solicitou um parcelamento da compensação aos estados. "O que ele pediu foi que o acerto pudesse ser feito durante esses próximos anos, dentro dos nossos mandatos", acrescentou.
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Abatimento de dívidas
O governo ainda precisa buscar um consenso com os estados em alguns pontos que impactam diretamente no cálculo do valor a ser compensado, como: se o período de compensação irá considerar o exercício completo ou apenas seis meses; a amplitude das perdas, se foram sobre toda a arrecadação ou apenas dos segmentos afetados; além da atualização dos valores pela inflação. Outras situações específicas também podem dificultar um acordo, como em casos de estados com dívidas e os que aderiram ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF).
O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), já sinalizou que pode aceitar abatimento da dívida como compensação pelas perdas de ICMS, mas em alguns casos isso pode não ser possível. O estado de São Paulo, por exemplo, que é a unidade da Federação com maior saldo devedor garantido pela União, quer compensar toda a dívida ainda no primeiro semestre deste ano, o que inviabiliza um acordo.
Os representantes dos estados receberam com boa vontade os esforços da União em buscar soluções para a perda de arrecadação, mas ainda querem ver como isso será efetivado. Ainda há muitas pontas soltas e as tratativas devem ser individuais. A expectativa é de que um novo encontro entre Haddad e os governadores ocorra após o carnaval.
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STF permite revisão de decisões
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu ontem que a quebra de decisões definitivas é automática quando a Corte mudar seu entendimento sobre temas tributários. Isso significa que contribuintes que conseguiram decisões favoráveis na Justiça para deixar de recolher determinados impostos devem voltar imediatamente a pagar se o STF mudar o entendimento.
Embora a quebra da coisa julgada tenha sido unanimidade na Corte, a questão da abrangência dos efeitos da decisão dividiu os ministros. O placar ficou em 6 votos a 5 contra a chamada modulação. Sem a modulação, a Receita Federal poderá cobrar impostos que não foram recolhidos no passado — inclusive com juros e multa. Como a quebra da coisa julgada já era esperada, a falta de modulação se tornou a principal preocupação dos contribuintes devido ao potencial impacto para a segurança jurídica e o caixa das empresas.
Estava em discussão a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Na década de 1990, empresas obtiveram na Justiça autorização para deixar de recolher o tributo. Em 2007, o Supremo decidiu que a cobrança da CSLL é constitucional. Portanto, há espaço para que o Fisco cobre as contribuições que não foram feitas desde então.
Tributaristas veem a decisão com preocupação. "Uma decisão do STF não poderia retroagir para atingir períodos passados, no caso, desde 2007", avalia Maria Carolina Sampaio, sócia do GVM Advogados. Ela sustenta que a conta, especialmente para médias e pequenas empresas, "pode ser impagável". A tributarista Liz Marília Vecci, sócia do Terra e Vecci Advogados, diz que a decisão resulta na "relativização da coisa julgada" e que o direito precisa ser "compreensível, confiável e previsível".
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