O mercado financeiro voltou a indicar que não quer o ex-ministro da Educação Fernando Haddad na chefia do Ministério da Fazenda no terceiro mandato do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Em reação a discurso pronunciado por Haddad em evento promovido, ontem, pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban), o Índice Bovespa (Ibovespa), principal indicador da Bolsa de Valores de São Paulo (B3), encerrou o pregão com queda de 2,55%, para 108.976 pontos, num movimento de recuo que se acentuou após a fala do ex-ministro. Já o dólar subiu 1,89% e fechou o dia cotado a R$ 5,410, refletindo o aumento da desconfiança dos investidores.
Lula vem testando as reações ao nome de Haddad para comandar a economia — e o almoço com os banqueiros foi uma oportunidade para avaliar como essa opção seria recebida pelo poderoso setor financeiro. Na avaliação de alguns integrantes do atual governo, Haddad teria ficado mais forte, sobretudo depois de, na quinta-feira, a bolsa ter fechado em alta de 2,75%, quando ele foi mencionado ao lado do economista Pérsio Arida, cotado para assumir o Planejamento. A queda de ontem, porém inverteu essa percepção, na visão de fontes do mercado.
Uma das falas do ex-ministro que menos agradou a plateia foi aquela em que ele defendeu maior taxação sobre o patrimônio. Investidores estão muito preocupados também com a questão fiscal, porque sabem que haverá um enorme rombo em 2023, dependendo do tamanho dos gastos extrateto que serão aprovados na PEC da Transição. Fontes do mercado financeiro disseram que o fato de Haddad não demonstrar preocupação com a questão fiscal, durante seu pronunciamento, azedou o clima e fez a Bolsa cair. "Ele não disse nada demais, nem podia, porque ainda não é ministro", rebateu uma fonte do novo governo. "Lula quer Haddad, mas o mercado não quer e o Lula vai ficando emparedado", retrucou outro integrante do mercado financeiro.
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Dúvidas
Segundo um economista, diante do texto preliminar da PEC da Transição, que prevê a colocação de R$ 198 bilhões, fora do limite da regra do teto de gastos, no Orçamento de 2023, há dúvidas se mesmo o ex-ministro Henrique Meirelles, preferido pelo mercado para comandar a economia, aceitaria ser ministro da Fazenda. Ontem, outro nome foi ventilado para o cargo, o do presidente da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), Josué Gomes, filho do empresário José Alencfar, vice presidente dos dois primeiros mandatos de Lula.
O ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, aproveitou a confusão para detonar o nome de Haddad. "A Bolsa cai e o dólar sobe depois da fala de Haddad. Querem nomear o incêndio para comandar o corpo de bombeiros e esperam o quê?", escreveu nas redes sociais.
As informações, agora, são de que Lula só escolherá o nome do futuro ministro depois que conseguir aprovar a PEC da Transição.
BC reafirma foco no controle da inflação
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, reafirmou, ontem, que o país precisa focar em controlar a inflação para voltar a ter credibilidade no mercado financeiro, interno e externo. Em discurso durante almoço promovido pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban), o presidente da autoridade monetária voltou a destacar o problema fiscal do país, afirmando que colocar mais dinheiro na economia poderá gerar maior volatilidade da inflação. "Não vencemos a batalha da inflação ainda. Não podemos ter política monetária de um lado e política fiscal do outro", ressaltou.
Para Campos Neto, colocar a inflação de volta na meta é o "melhor instrumento de previsibilidade de crescimento e controle de desemprego". Ele acrescentou que, no Brasil, "grande parte do trabalho de política monetária já foi feito" e que, por isso, "estamos acompanhando algumas melhoras na inflação". Entretanto, salientou que parte da queda do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), nos últimos meses, veio das desonerações tributárias adotadas pelo governo, cujos efeitos, para muitos economistas, já se esgotaram.
Além disso, a incerteza sobre o arcabouço fiscal tem provocado aumento das taxas de juros no mercado. "A gente não pode ter política monetária de um lado e política fiscal do outro", comentou.
Ao falar sobre riscos fiscais em escala global e seus efeitos sobre os mercados, Campos Neto citou o caso do Reino Unido, em que um plano da ex-premiê Liz Truss para cortar impostos gerou forte volatilidade nos mercados e acabou sendo determinante para sua renúncia, pouco mais de um mês após assumir o cargo. "Foi a primeira vez na vida que eu lembro de ver o mercado reagindo ao fiscal de um país desenvolvido como se fosse emergente", disse ele.
De acordo com o presidente do BC, os agentes econômicos estão ansiosos, atualmente, para entender como os governos pretendem reduzir as dívidas públicas em seus países. (MP, com Agência Estado).