O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, destacou nesta quinta-feira, 3, o resultado apertado das eleições presidenciais no Brasil em evento do Santander, mas frisou que o trabalho do BC é ter certeza que o órgão é independente e vai trabalhar com o novo governo nos temas importantes para o País.
"No Brasil, foi mais 50 a 50 o resultado das eleições, então claro que temos pessoas infelizes, mas essa é a beleza da democracia. Temos que trabalhar agora juntos para garantir que vamos crescer, gerar empregos e lutar contra inflação. Nosso trabalho é ter certeza que temos BC independente que vai trabalhar com novo governo para isso", disse, no evento que ocorre em Madri, na Espanha.
O presidente do BC completou que a polarização leva a políticas que não são as melhores, não só no Brasil, mas no mundo, e que reduzem a produtividade. Ele citou, sem dar muitos detalhes, o debate no Brasil sobre os preços nos combustíveis no Brasil e a questão da Petrobras.
Em sua avaliação, a crise alimentar e energética está levando muitos governos a adotar práticas alheias ao mercado, como limitar a exportação de alimentos, taxar lucros de empresas e congelar preços, medidas que levam à redução de investimento.
"Quando os preços de alimentos e de petróleo foram para cima, o investimento estava indo para baixo. As pessoas não vão investir se acharem que o governo vai taxar lucros ou se afastar de práticas de mercado."
Inflação de alimentos
Campos Neto também disse que a leitura da autoridade monetária sobre a inflação global era diferente das de outros BCs. Este é um dos fatores que explica por que o BC brasileiro começou antes a subir os juros, além de pontos como a alta dos preços de alimentos, que também aconteceu antes no País.
"A inflação de alimentos no Brasil veio antes, e tivemos um problema climático ao mesmo tempo", disse. Campos Neto destacou que o Brasil viveu meses de seca no ano passado, o que afetou uma série de preços, de alimentos a energia, dada a matriz dependente de hidrelétricas.
Segundo ele, o Brasil tem uma memória forte de indexação de preços e de inflação. O presidente do BC destacou que a leitura que a autoridade fez sobre o processo global de inflação decorrente da pandemia era diferente da adotada por outros BCs.
"O mundo argumentava que sem a mobilidade e com o deslocamento da demanda de serviços para produtos, haveria um novo equilíbrio", disse ele. "O deslocamento da demanda foi muito mais forte do que o efeito do menor consumo de serviços."
De acordo com ele, Bancos Centrais podem cometer dois erros opostos ao combater a inflação: ir muito além do necessário, ou fazer muito pouco.
Campos Neto também destacou que, em todo o mundo, os preços de energia têm subido diante de um descasamento entre a demanda vista agora e a capacidade adicionada de produção de energia. "Ao mesmo tempo em que há demanda por energia, houve o menor investimento da história, por questões como a transição energética."
Luta contra inflação
O presidente do Banco Central considerou, no evento do Santander, que a luta contra inflação que tem acontecido nos países desenvolvidos neste momento irá ajudar a desinflação no Brasil.
O presidente do BC também comentou que um dos problemas atuais é como pagar pelos gastos feitos na crise vivida pelo mundo atualmente. "A questão é como pagar a conta da crise. Se só aumentar impostos reduz produtividade", disse Campos Neto.
O presidente do BC avaliou que houve um conforto grande demais em alguns países desenvolvidos no passado recente de que a inflação continuaria baixa, mesmo com a impressão de dinheiro, o que afastou esses países de reformas importantes por um longo período.
"Estamos pagando um preço por isso. O fato de as pessoas estarem perguntando o que está causando o problema agora vai nos colocar na frente e talvez poderemos resolver."
*O repórter viajou a convite do Santander Brasil.
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