A China é o maior parceiro comercial do Brasil e compra quase um terço de tudo o que o país exporta. Mas a pauta é pouco diversificada e centralizada em commodities. Neste ano, em meio à desaceleração do gigante asiático, as exportações nacionais para o país encolheram. De janeiro a setembro de 2022, a participação da China nos embarques brasileiros passou de 31,3% para 27,5% na comparação com o mesmo período de 2021, conforme dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), do Ministério da Economia.
Apesar de as projeções de crescimento econômico dos dois países para este ano estarem parecidas, há diferenças gritantes nos indicadores macroeconômicos. A taxa de investimento e a de poupança, em torno de 40% do Produto Interno Bruto (PIB) na China, por exemplo, são maiores do que as do Brasil. Além disso, para o Brasil, se o PIB chinês crescer pouco, as exportações brasileiras perdem mercado no país mais populoso do mundo. Vale lembrar que o agronegócio e a indústria extrativa nacional não teriam a pujança atual se não fossem as importações chinesas.
Não à toa, José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), é taxativo ao falar sobre a desaceleração da economia chinesa. "O mundo vai ter que se adequar a essa nova realidade, com a China crescendo 3% ao ano", destaca. Para ele, o impacto no Brasil poderá ser pequeno, porque o peso do comércio exterior no PIB brasileiro é baixo. Contudo, ele reconhece que as indústrias de commodities agrícolas e minerais poderão sentir a redução da demanda em um momento em que o mundo também está desacelerando. "Ainda não sabemos o verdadeiro impacto desse menor crescimento da China no país, mas será uma mudança de paradigma.
Com a guerra da Ucrânia, o Brasil acabou sendo beneficiado pela alta dos preços das commodities, que ajudaram a aumentar o saldo comercial. Mas a melhora da balança foi apenas em preço, não houve aumento de quantidade, portanto, o superavit poderá encolher", alerta Castro.
Em um cenário em que a China muda o modelo econômico, baseado no consumo de produtos de maior valor agregado, será difícil para o Brasil ganhar competitividade como origem, pois, nas últimas décadas, a capacidade da indústria nacional foi destruída devido à falta de reformas estruturais. Os últimos governo não se empenharam em fazer uma reforma tributária ampla, que ajudaria o país nesse sentido.
"A China passa por uma transformação para uma economia de consumo, onde há espaço maior para manufaturados. Logo, se o Brasil pretende continuar exportando para lá, vai precisar de uma indústria competitiva", destaca o economista Simão Davi Silber, professor da Universidade de São Paulo (USP). "O Brasil só consegue exportar manufaturados por causa do Mercosul e da Aladi, porque não é competitivo", frisa. Silber lembra ainda que o Brasil é refém das exportações de commodities, que representam apenas 8% do comércio mundial, enquanto o grosso das exportações globais são serviços e produtos industrializados. "O mercado é muito limitado e o país, para crescer, vai precisar exportar e, para isso, precisa de uma indústria forte. A indústria nacional desapareceu."
Impacto
Luis Otavio de Sousa Leal, economista-chefe do Banco Alfa, salienta que, com a China crescendo menos, "o setor que mais deverá sentir será a indústria de extração mineral". E, apesar de, atualmente, as exportações brasileiras para a Europa, Estados Unidos e Argentina estarem aumentando, enquanto os embarques para a China diminuem, "é preciso ficar atento à desaceleração que está em curso também nesses países e regiões".
Li Qui, ministro conselheiro da Embaixada da China no Brasil, reconhece que existe uma interdependência entre os dois países e, portanto, a expectativa dele, independentemente dos governos, é de que a parceria comercial continue progredindo. "Temos laços comerciais antigos e que estão acima de qualquer política de curto prazo", frisa.
Simão Silber, da USP, lembra, no entanto, que a China vem investindo muito na África, que tem recursos naturais, solo e clima muito parecidos com os do Brasil e pode ampliar o fornecimento tanto de minérios quando de grãos para a China, com a vantagem de estar mais próxima geograficamente. "O grande perigo é a África, porque o continente pode substituir o Brasil em uma parte importante no fornecimento de minerais, petróleo e de grãos, que dominam a pauta de exportação nacional para a China", alerta. "Não podemos nos esquecer de que, antes de os continentes da África e da América do Sul serem separados pelo Oceano Atlântico, eles estavam juntos na Pangeia. Basta explorarem o pré-sal lá que vão achar. O chinês vem investindo na África porque lá é mais fácil comprar as terras, e já estão produzindo grãos", alerta.