A disputa no segundo turno das eleições presidenciais entre o presidente Jair Bolsonaro (PL) e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) promete ser bastante acirrada. E, nesse embate, a economia estará no centro dos debates, apesar de as propostas dos dois candidatos ainda serem muito superficiais, de acordo com analistas. Eles lembram que, assim como o resto do mundo, o Brasil caminha para um processo de desaceleração e, portanto, quem vencer em 30 de outubro precisará ter bom plano econômico para tirar o país da rota de uma nova recessão, sem esquecer o combate aos flagelos tradicionais do país, como fome, desigualdade e destruição do meio ambiente — que pode prejudicar as exportações do agronegócio.
Apesar das recentes revisões para cima nas taxas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), a maioria dos parâmetros econômicos, como inflação, juros, renda do trabalhador e dívida pública bruta, está pior do que os herdados pelo atual governo. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), por exemplo, está em patamares mais elevados do que em 2018 e em 2019 e deverá encerrar este ano e o próximo acima dos tetos das metas, de 5% e de 4,75%, respectivamente. A renda média do trabalhador, que deu um salto em 2020 por conta do auxílio emergencial, foi de R$ 2.713 no trimestre encerrado em agosto, nível menor do que o de 2018.
Até mesmo a dívida pública bruta, que vem registrando queda neste ano e chegou a 77,5% do PIB em agosto, segundo o Banco Central, ainda é maior do que em de 2018 (75,3%) e 2019 (74,4%). E a tendência é de aumento no ano que vem, devido aos juros elevados e à ampliação dos gastos do governo, que precisam ser cobertos com emissão de títulos públicos. Pelas estimativas de Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, a dívida pública bruta poderá chegar perto de 85% do PIB em dezembro de 2023.
Ele prevê ainda que a taxa de desemprego, apesar de ter caído para 8,9% no trimestre encerrado em agosto, conforme dados do IBGE, deve ficar em torno de 10% neste ano e no próximo. "O índice pode ser menor, mas o risco do ano que vem é do cenário de desaceleração", afirma.
De acordo com analistas, a pandemia e a guerra na Ucrânia contribuíram bastante para a piora dos indicadores. E a surpresa do PIB do primeiro semestre está bastante relacionada às medidas de estímulo adotadas pelo governo. A retomada do setor de serviços — o mais afetado pela pandemia e que mais pesa na economia — também ajudou. Mas o freio de mão da política monetária está puxado e os impactos defasados do ciclo de alta da taxa básica da economia (Selic), atualmente em 13,75% ao ano, terão reflexos na atividade neste segundo semestre.
Especialistas põem em dúvida as previsões do ministro da Economia, Paulo Guedes, que aposta em crescimento de 3% no ano que vem. Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre) não descarta queda de 0,4% no PIB em 2023. "O maior desafio do próximo governo será manter o ritmo de crescimento elevado e sustentável, sem desequilíbrio fiscal e com inclusão social. E sem aumentar a carga tributária, que já é muito elevada", diz.
Sergio Vale, da MB, recomenda cautela em relação aos números positivos recentes, que não considera sustentáveis. "Os resultados da economia neste ano são de curto prazo. Quando pegamos os quatro anos de governo, os indicadores ainda são muito ruins e estão piores do que no governo Michel Temer", ressalta Vale, que prevê alta de 0,5% no PIB em 2023. Ele alerta para o fato de que o cenário tende a piorar diante da desaceleração global e das dificuldades de governabilidade que serão enfrentadas por qualquer um que sair vencedor nas urnas no segundo turno. "Estamos falando de um Congresso de centro-direita, no qual será difícil aprovar algumas reformas necessárias a partir do ano que vem", avalia. Para ele, um Senado com mais integrantes bolsonaristas será ainda mais complicado para Lula.
Na avaliação da economista Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria, os estímulos fiscais do governo devem amenizar a desaceleração da economia neste semestre, mas ela será inevitável. "Levando em conta o montante de recursos que o governo vem gastando para reforçar a reeleição, que é maior do que os de eleições anteriores, as projeções para o crescimento do PIB deste ano estão mais otimistas. Mas não podemos nos esquecer de que, em 2023, a economia vai desacelerar", destaca a analista, que prevê altas de 2,5%, no PIB deste ano, e de 0,4% no do ano que vem. "Em 2023, vamos ter ainda o aumento dos riscos fiscais devido ao enorme pacote de estímulos que estão deixando uma fatura muito alta, em torno de R$ 275 bilhões", observa.
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Desmatamento
O cientista político e especialista em relações exteriores Wagner Parente, CEO da BMJ Consultores Associados, ressalta que as promessas de Lula e de Bolsonaro não são compatíveis com o quadro de uma economia em desaceleração. "Eles falam de aumentos de gastos, mas vão enfrentar um cenário em que a economia não deverá crescer e, portanto, sem aumento de arrecadação como neste ano", destaca.
Além disso, o próximo governo precisará se preocupar com a questão ambiental, que estará diretamente relacionada com a economia. "Os agricultores podem enfrentar sanções dos países europeus se não houver redução no desmatamento", alerta Parente, em referência à proposta do Parlamento Europeu de proibir a comercialização, nos países do bloco, de produtos oriundos de áreas desmatadas em qualquer parte do mundo.
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