A partir de 9 de outubro, os produtos alimentícios passam a seguir novas regras de rotulagem no Brasil. Aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) há cerca de dois anos, a medida passa a valer agora, com uma série de mudanças nas embalagens. Entres elas, a indicação de altos teores de açúcares, sódio e gordura saturada. Novos produtos lançados a partir da data já devem estar com os rótulos adequados às novas regras. E, para os que já se encontram no mercado, os prazos vão até 2025, a depender do segmento.
A Associação Brasileira de Indústrias de Refrigerantes e de Bebidas não Alcoólicas (Abir) está preparada para atender às normas e até antecipou medidas. A entidade afirma que apoiou e colaborou no processo da construção das novas regras.
"As empresas têm, sim, que ter essa responsabilidade. Colocar à disposição do consumidor todas as informações necessárias para que possa escolher os produtos que sejam mais adequados ao seu estilo de vida", afirma o presidente da Abir, Victor Bicca. Ele refuta a tese da relação da obesidade infantil com os refrigerantes. "Não são as bebidas que engordam a população", frisa.
De acordo com Bicca, o setor — que reúne 71 empresas, recolhe R$ 16 bilhões em tributos anualmente e emprega 2 milhões de pessoas direta e indiretamente — vem convergindo para uma série de inovações com foco em saúde pública e sustentabilidade. E que, para isso, parcerias estão sendo realizadas com o Ministério da Saúde e o Ministério do Meio Ambiente.
A entidade, junto com outras associações da indústria e varejo de alimentos, criou o site Olho na Lupa, que explica detalhadamente como obter as informações nutricionais a partir da aplicação da lei.
O segmento específico de bebidas açucaradas é alvo de debate no Congresso. Há um projeto no Senado que prevê o aumento de impostos sobre esses produtos. O presidente Jair Bolsonaro (PL) descartou a taxação, e especialistas da área econômica apontam que a medida pressionaria a inflação e não teria tanto impacto no combate à obesidade infantil.
Confira a íntegra da entrevista de Bicca concedida ao Correio.
Como será o novo modelo de informação nutricional?
A nossa rotulagem tem duas características interessantes: primeira, é no painel frontal que vai ter uma lupa em que vai dizer se o produto é alto em açúcar, sódio ou gordura, ou é alto nos três. E atrás da embalagem vai ter uma tabela nutricional bem mais detalhada. Estamos investindo muito no tripé informação, inovação (com novas categorias e formulações) e portfólio. Já tínhamos o compromisso de não fazer propaganda para crianças com menos de 12 anos.
Há aquela associação entre refrigerantes e obesidade infantil....
O Brasil, hoje, nessa discussão de saúde é o que tem as melhores orientações do mundo. No entanto, temos pesquisas que mostram que enquanto a obesidade cresce assim, exponencialmente, o consumo de bebidas açucaradas e refrigerantes cai no país. Ou seja, não são as bebidas que estão engordando a população. Mas o estilo de vida é muito mais sedentário. E, para contribuir na reversão desse quadro, temos marcas que investem e apoiam fortemente as práticas esportivas. A gente quer fazer parte da solução com ações medidas concretas.
Como avaliam a proposta de aumento de imposto para as bebidas açucaradas?
Importante destacar que o setor de bebidas não alcoólicas no Brasil já possui a maior carga tributária da América Latina — 36,9% do preço de comercialização são impostos. Carga alta, cujo aumento não é bem-visto pela população. Há pesquisa do próprio Senado apontando que a maioria das pessoas é contra. Estudo mundial do Instituto McKinsey demonstra, ainda, que os impostos são ineficientes, porque não reduzem o consumo, além de discriminatórios.
E que ações na área de sustentabilidade o setor está promovendo?
Nossas frotas estão cada vez mais usando energia verde com veículos elétricos. As fábricas também aderindo à energia eólica. E lançamos a campanha "Crie esse hábito", em parceria com o Ministério do Meio Ambiente. Uma iniciativa que estimula a reciclagem. Pedimos para as pessoas separarem em casa as embalagens e também que dêem preferência para as retornáveis.
Qual foi o maior desafio do setor na pandemia?
Durante a pandemia, o mercado de alimentação fora de casa fechou. E só ficamos com os de supermercados. Tivemos que nos adaptar muito para continuar mantendo receitas e empregos. Então, apostamos em flexibilidade e inovação. Tivemos de investir no comércio on-line. As empresas criaram suas próprias formas de fazer delivery.
A indústria deu suporte ao pequeno varejo com a crise econômica na pandemia?
As oito maiores empresas de bens e consumo se juntaram para ajudar o pequeno varejo. Coca-Cola, AmBev, PepsiCo, Heineken, Mondelez, Nestlé, BRF e Aurora. Grandes concorrentes que se juntaram para ajudar 300 mil varejos e 3 milhões de pessoas no país. O pequeno varejo sofreu muito com a pandemia, e fizemos um esforço para dar fôlego a eles até a retomada. As palavras-chave nesse período foram colaboração e parceria.
Houve uma ação do Procon em Brasília que retirou temporariamente a venda do Del Valle Fresh por baixo teor de suco. Como se resolveu a questão?
Não tinha nada de errado com o produto, nada de ilegal. Houve uma confusão de interpretação, porque temos categorias diferentes: bebidas que são apenas refrescos com baixo teor de suco, e tem o suco 100%. Mas ficou evidente para nós que havia ali uma oportunidade de melhorar a comunicação e deixar mais claras para o consumidor essas variações. O sistema de defesa do consumidor é bom, mas a nossa legislação é bem complexa. De vez em quando, vai dando uns ruídos. E a gente vai e corrige. A coisa mais preciosa para o setor é informar o consumidor corretamente.