conjuntura

BCE eleva taxa de juros da zona do euro em 0,75 pela primeira vez desde 1999

Analistas avaliam que a subida dos juros nos países desenvolvidos deve também pressionar a taxa de câmbio

O Banco Central Europeu (BCE) anunciou alta de 0,75 ponto porcentual na taxa referencial de juros da Zona do Euro, a segunda elevação do ano. A instituição reconheceu que a inflação não é temporária e, assim como o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos), passou a adotar um discurso mais duro no combate à carestia e avisou que novas altas estão a caminho. O aperto nos juros virá para combater uma inflação que está em 9,1%, e, como efeito colateral, ajudará a frear a economia europeia, com reflexos negativos em todo o mundo, em particular nos países emergentes. O Brasil, por exemplo, é um grande exportador de commodities agrícolas e minerais para a União Europeia, o segundo maior parceiro comercial do país.

A decisão do BCE segue o que vem sendo feito nos Unidos pelo Federal Reserve (Fed, o banco central do país). Analistas avaliam que a subida dos juros nos países desenvolvidos deve também pressionar a taxa de câmbio. Julio Hegedus, economista-chefe da Mirae Asset, disse que, “por enquanto”, prevê a divisa norte-americana encerrando o ano em R$ 5,10, mas admitiu que a tendência é que ela pode “tranquilamente” subir ainda mais. Na Garde Asset Management, a projeção para o câmbio no fim de dezembro está em R$ 5,30. E a Capital Economics, que fez um alerta, ontem, sobre o aumento da demanda por prêmios de risco no Brasil, projeta o dólar cotado em R$ 5,50 no fim deste ano.

Com a decisão do BCE, a taxa refencial dos 19 países que compartilham o euro passou de zero para 0,75% ao ano, maior patamar desde 1999. “Esse é um passo importante para garantir que a inflação retorne à nossa meta de 2%. Mais etapas (de alta nos juros) seguirão e elas dependerão de como as perspectivas de inflação se desenvolverem”, destacou o comunicado do BCE. O texto reconheceu que os custos de energia estão “extremamente elevados”, especialmente o gás, e admitiu problemas de abastecimento nas empresas e com a desvalorização do euro.

Após o anúncio da decisão do BCE, a presidente da instituição europeia, Christine Lagarde, fez um pronunciamento reforçando que “a inflação da Zona do Euro está alta demais”, muito acima da meta, de 2%. Ela admitiu que haverá novas elevações de juros nas próximas reuniões, mas não garantiu que serão feitas no mesmo ritmo. “Vamos determinar, reunião por reunião, o nível das próximas altas, dependendo dos dados econômicos”, disse Lagarde, reconhecendo que, apesar de a decisão ter sido unânime, houve divergências sobre a condução da política monetária.

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Firmeza

Ainda ontem, o presidente do Fed, Jerome Powell, fez um discurso bastante duro contra a inflação. “Nós precisamos agir agora com firmeza, como temos feito, e manter esse trabalho de controle da inflação até a sua conclusão”, afirmou. Em 27 de agosto, o Fed elevou a taxa básica de juros em 0,75 ponto percentual, aumentando o intervalo para 2,25% a 2,5% ao ano. “A história adverte fortemente contra o afrouxamento prematuro da política monetária”, acrescentou. Powell destacou ainda que o mercado de trabalho dos EUA continua “muito forte” e espera que, por meio da alta dos juros, a economia recupere níveis salariais compatíveis com uma inflação de 2% ao ano.

Analistas chamaram a atenção para o discurso mais duro do BCE. “Era preciso uma conduta mais dura do BCE diante das perspectivas não muito animadoras que se avizinham na Europa”, destacou Julio Hegedus, em referência à crise de abastecimento de gás gerada pela guerra criada pela Rússia na Ucrânia. Apesar da inflação elevada, ele fez um alerta sobre os riscos de o BCE conduzir uma alta muito forte dos juros e jogar o Velho Continente em uma recessão. “O índice de preços foi a 9,1%, com o núcleo em torno de 5%, decorrente do maior custo de energia. Algumas medidas, como os tetos para os preços de energia e gás natural, podem ajudar os bancos centrais no combate à inflação na Europa. A dúvida será saber se os russos vão aceitar isso”, acrescentou.

“Há duas semanas, os banqueiros centrais passaram a demonstrar maior preocupação com a inflação e a adotar discursos mais ‘hawkish’, e, por isso, a decisão do BCE era esperada”, disse Lucas Zaniboni, analista sênior da Garde, em referência ao termo usado no mercado quando os bancos centrais são mais duros no combate às altas de preços. Para ele, o comunicado do BCE foi mais duro do que o discurso de Lagarde.

De acordo com Zaniboni, o choque de juros na Europa ainda não é suficiente para valorizar o euro, que ainda não recuperou a paridade com o dólar. Contudo, ele lembrou que, nos EUA, qualquer novo aumento do Fed deverá “jogar contra a moeda brasileira”. (Com informações da AFP e da Agência Estado)