O imbróglio em torno das mudanças na cobertura de tratamentos previstos pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para os planos de saúde, colocando fim ao chamado "rol taxativo", tornando-o exemplificativo (PL 2.033/2022), ganhou novo desdobramento ontem. O Senado Federal recebeu 22 representantes de entidades da sociedade civil, empresários e membros do setor de convênios para discutir o assunto, que é controverso. As questões de sustentabilidade das empresas, no caso da aprovação da medida, tomaram boa parte do debate.
O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, e representantes da ANS alertaram para o risco da nova lei gerar colapso nas operadoras de saúde. "Na hora de se optar por ter mais procedimentos, mais medicamentos no rol, seguramente vêm atrelados custos que serão repassados para os beneficiários, e parte deles não terá condições de arcar com essa alta", alertou Queiroga.
O presidente da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), Renato Freire Casarotti, relatou, ao Correio, a preocupação com a falta de referência para a precificação dos tratamentos. "Se eu não sei o que está coberto, quem vai definir é o juiz ou é o médico? A tendência é você ter um descontrole disso, um aumento de custos mais acentuado para aqueles que já tem plano, e uma disparada de preço para os novos planos. Todo mundo acaba pagando a conta", disse. É o que também alerta Vera Valente, diretora-executiva da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde). "O rol taxativo é uma garantia da correta utilização dos recursos", afirmou.
Segundo o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o projeto, que foi aprovado pela Câmara, deverá ser votado pelos senadores na próxima semana. Relator da matéria na Casa, o senador Romário (PL-RJ) disse que não pretende modificar o texto dos deputados.
Entidades da sociedade civil também defendem a aprovação do projeto da forma como está. Carla Bertin, advogada e diretora do instituto Autismo Legal, salientou que o projeto não cria nenhum direito novo. "Não estão sendo concedidos mais direitos a usuários de planos de saúde. A gente precisa eliminar os efeitos devastadores da decisão do STJ", afirmou — referindo-se à decisão na qual, em junho deste ano, o Superior Tribunal de Justiça reconheceu que os planos só são obrigados a cobrir procedimentos previstos pela ANS, o rol taxativo.
Para Vanessa Ziotti, diretora jurídica da ONG Lagarta Vira Pupa, coordenadora de Educação da Comissão das Pessoas com Deficiência e Direitos Humanos da OAB de São Paulo, o lucro das operadoras de saúde é um dos motivos que não justificam a resistência à aprovação do projeto. Ela lembrou que, também em junho, a ANS autorizou o aumento de 15% das mensalidades de planos familiares e individuais.
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SUS
Outro argumento utilizado por empresários do ramo é o de que, com o encarecimento dos planos, haverá debandada dos usuários destes sistemas — o que poderá ocasionar uma sobrecarga do Sistema Único de Saúde (SUS). Para a advogada e sócia do escritório Tozzini Freire Advogados, Isabela Pompilio, "tanto com a aprovação do projeto, quanto com sua derrubada, o SUS é passível de sofrer consequências".
"Quando o rol é taxativo, os consumidores podem ficar sem a cobertura de certos procedimentos e demandar o SUS para tanto. Por outro lado, sendo o rol exemplificativo, o provável aumento do custo das mensalidades pode provocar possível rescisão de contratos, fazendo com que os usuários de planos privados recorram à saúde pública", explicou.