Cidades

Saneamento: entidades criam lista de prioridades para presidenciáveis

Eleições presidenciais mobilizam sociedade em busca de compromissos de políticas públicas para diferentes setores, como saneamento básico, dois anos após marco regulatório

Michelle Portela
postado em 26/08/2022 14:47 / atualizado em 26/08/2022 19:05
 (crédito: Tomaz Silva/Agência Brasil)
(crédito: Tomaz Silva/Agência Brasil)

As eleições presidenciais mobilizam a sociedade em busca de compromissos de políticas públicas para diferentes setores. Na próxima semana, a Associação Brasileira das Empresas Estaduais de Saneamento (Aesbe) entregará aos presidenciáveis uma lista de ações prioritárias para destravar políticas públicas voltadas ao saneamento básico, durante encontro a ser realizado em Brasília. Movimento semelhante já foi feito pelo Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), que reúne 85 companhias que representam 50% do PIB nacional.

O evento da Aesbe reunirá empresários e presidenciáveis na capital federal entre os dias 1º e 2 de setembro de 2022. Uma das prioridades é analisar o cenário sobre saneamento básico dois anos após a atualização do marco legal do saneamento, em 2020.

Estará presente, para realizar palestra magna do evento, Thelma Krug, vice-presidente do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC) e presidente do Painel de Observações Terrestres para o Clima (Terrestrial Observation Panel on Climate) do Sistema Global de Observações para o Clima (GCOS) da Organização Meteorológica Mundial.

A lista de prioridades compreende priorizar o aperfeiçoamento do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), com a reformulação da escolha de dados visando dar celeridade aos processos baseados nele. Além disso, os administradores de empresas públicas de saneamento pedem que seja viabilizada a implantação da Associação Brasileira das Agências de Regulação (Abar).

A criação de uma política de universalização dos serviços de saneamento para as áreas rurais, que não está contemplado no marco legal debatido em 2020, será uma das propostas apresentadas aos candidatos. "Todos os itens da lista impactam os indicadores ou as políticas públicas, por isso, são todas importantes e para serem debatidas com os candidatos", diz Sérgio Gonçalves, secretário executivo da Aesbe.

Entre os destaques está o programa Acertar, um banco de dados que surgiu como uma alternativa para melhorar a qualidade da informação sobre o saneamento básico no Brasil, que deverá ser apresentado como uma proposta de política pública nacional. "Com isso vamos ter mais segurança nos dados e indicadores. É importante que eles sejam auditados e verificados", explica Gonçalves.  

Carta

No início deste mês, representantes de grandes empresas vinculadas ao Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) lançaram a Carta Aberta aos Presidenciáveis, um documento que reúne 12 propostas para os programas de governo de candidatas e candidatos à Presidência do Brasil.

O documento reúne propostas formuladas por representantes de 85 companhias que atuam no Brasil e cujos faturamentos somados representam cerca de 50% do PIB nacional. Nela estão listados temas e medidas que refletem expectativas da economia verde mundial. “A sustentabilidade não é uma questão de governo, mas sim de Estado”, afirma Marina Grossi, presidente do CEBDS.

Na carta aberta, o grupo pede o fim do desmatamento ilegal, a reversão da perda florestal e a redução de emissão de gases de efeito estufa. Outros pontos abordados são a universalização do saneamento básico, a transição energética e o incentivo a sistemas alimentares sustentáveis, além de um plano para a redução das desigualdades sociais, acentuadas pela pandemia da covid-19

“As empresas precisam de um ambiente em que os diferentes setores da sociedade estejam pactuados. Estamos em um momento de grande disrupção no modelo de desenvolvimento. Precisamos olhar para a frente e repensar o crescimento econômico para fazer valer a vantagem que o Brasil já tem: o grande potencial de uma economia limpa”, comenta Marina Grossi.

Além disso, o grupo defende a articulação entre os diferentes níveis governamentais e a relevância de tratar os temas de forma transversal, gerando novos negócios, empregos qualificados e renda. “É certo que já não existe qualquer outra possibilidade de desenvolvimento que não seja ambientalmente correto, socialmente justo e economicamente viável”, diz trecho da carta. 

Principais propostas do Aesbe:

  • Institucionalização e atualização periódica do Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab) e uso das metas como base para universalização: os empresários apontam que o instrumento oficial de acompanhamento das metas para a universalização da prestação de serviços de água e esgotos no Brasil não conta com atualização constante.
  • Aperfeiçoamento do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS): são reivindicadas melhorias no sistema, com a escolha de um conjunto de dados e índices que possam ser apurados e trabalhados de forma mais rápida. E a implementação do programa Acertar, viabilizado pela Associação Brasileira das Agências de Regulação (Abar).
  • Política de universalização dos serviços de saneamento para as áreas rurais: o saneamento rural não está contemplado no novo marco legal. E a universalização passa por um programa para esta área.
  • Normas de referência na Agência Nacional de Águas (ANA): a demanda é por regras transparentes e factíveis para os prestadores do serviço de saneamento. Fortalecimento da Secretaria Nacional de Saneamento, com objetivo de voltar a ter protagonismo no setor.
  • Centralização dos recursos para o setor de saneamento: a Aesbe propõe que o saneamento esteja vinculado a um único ministério, que seria o responsável pelo desenvolvimento do setor no país, responsável por gerir os recursos públicos para o saneamento. Atualmente, o principal gestor é o Ministério do Desenvolvimento Regional, mas há interseções com outras pastas.
  • Simplificação dos processos de financiamento: eliminação da duplicidade na fase de análise das propostas, com isso os prazos de contratação poderiam ser reduzidos para pouco mais de um ano sem nenhum comprometimento do processo.
  • Criação do Fundo Garantidor e Locação de Ativos: que possibilite que as operadoras com menor poder de negociação tenham, nos primeiros anos do contrato, acesso a recursos para suportar as contraprestações.
  • Linhas de crédito para desenvolvimento operacional: criação de programa específico de linhas de financiamento e do Orçamento Geral da União (OGU) destinados a programas de combate às perdas, com base em critérios objetivos atrelados a metas de desempenho e eficiência operacional das empresas de serviço.
  • Política energética para o setor.
  • Desoneração do Pis/Cofins.

 

"É viável economicamente?"

O pesquisador Mauro Zilbovicius, da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP) e Fundação Vanzolini, diz que as propostas são boas, mas deixam de abordar uma questão fundamental. "Quem financiará os investimentos durante os próximos 10 anos (logo ali, 2 mandatos presidenciais e meio)? É viável economicamente o investimento, e a operação e manutenção dos sistemas necessários? Este é o grande nó: hoje, e sem proposta para o futuro, quem vai financiar tudo, investimentos e operação e manutenção, é a tarifa paga pelo consumidor", explica.

Os esforços para a manutenção dos recursos hídricos não podem deixar de ser prioridade aos candidatos. "No país mais desigual do mundo, a maioria não pode sustentar a tarifa necessária para isso. Mas água corrente potável e abundante, sem interrupção, e coleta de tratamento de 100% do esgoto doméstico são um direito da sociedade: preservar a vida e a natureza é ganho (ou prejuízo) de todos, não apenas do consumidor de serviço", aponta.

Para Zilbovicius, uma das soluções é a criação de um fundo nacional para fazer o funding (com captação de investimentos) dos serviços. A coleta e o tratamento de esgoto devem ser compulsórios e gratuitos para o cidadão. Por último, facilitar a possibilidade de construção de consórcios de municípios para contratar unificadamente os serviços, porque os investimentos em saneamento apresentam economia grande de escala.

"A tarifa deve ser baixa e ser definida pela capacidade de pagar — o bairro de alta renda pode e deve pagar mais tarifa da água do que o bairro de renda baixa. O mesmo nas cidades. As empresas que consomem água e a vendem (como cerveja, por exemplo) devem pagar pelo uso do bem público. Com esse fundo será possível contratar as obras necessárias — financiando empresas estaduais ou privadas —e custear operação e manutenção do sistema", afirma.

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