O próximo governo, seja ele qual for, terá um grande desafio de conciliar a demanda social e equilibrar as contas públicas, evitando uma explosão da dívida pública, de acordo com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Ele reconheceu que o fato de que muitas medidas fiscais adotadas pelo atual governo podem ser estendidas no ano que vem, como o novo Auxílio Brasil de R$ 600, e ainda não está claro como elas serão financiadas.
“O que a gente pode dizer também que existe uma preocupação com a prorrogação das medidas e na forma e a forma como vai ser prorrogado. Eu acho muito cedo pra falar disso, eu acho que tem um debate ainda em curso sobre como isso vai ser financiado”, alertou Campos Neto, em evento Macro Day, do BTG Pactual, ao ser questionado se o atual governo está comprometido com a responsabilidade fiscal.
“Acho que o ministro (da Economia) Paulo Guedes é muito mais rápido do que eu explicar e dizer como isso vai ser financiado. Existe, hoje, uma incerteza em relação a isso e é curioso porque o fiscal é sempre crucial naquele momento, se a gente pegar atas do Copom (Comitê de Política Monetária) de quatro anos pra trás, o Brasil sempre fala sobre o fiscal, o fiscal sempre tá sempre tem alguma coisa fiscal. É super interessante quando eu resgato o material do passado. Me parece que é um flashback sempre, porque sempre tem algum problema de fiscal sempre alguém tem dizendo fiscal essa medida do governo foi populista”, afirmou.
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Campos Neto evitou ser muito enfático sobre a piora do quadro fiscal devido ao enorme pacote de medidas eleitoreiras criado pelo governo, mas reforçou que o BC tem que continuar colocando essa preocupação com o fiscal nas perspectivas. “A gente trabalha sempre com a sustentabilidade da dívida e eu acho que vai ser muito desafiador, independente de quem é tenha que fazer, esse plano será fazer essa gestão de olhar para o social e olhar para o equilíbrio da dívida ao mesmo tempo”, reforçou.
Melhora nas previsões
Durante a sua apresentação, Campos Neto, admitiu que, diante da onda de revisões para cima das previsões para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), no próximo Relatório Trimestral de Inflação (RTI), de setembro, a autoridade monetária deverá apresentar nova estimativa – atual é de 1,7% – que até pode ficar acima de 2%, apesar de o ambiente de inflação global ainda estar bastante “desafiador”.
O chefe da autoridade monetária, inclusive, reconheceu que os estímulos fiscais – vistos como excessivos por especialistas em contas públicas – têm ajudado nessa melhora das previsões do mercado, mas têm “efeitos temporários”. Ele ainda acrescentou que existe também a ajuda de “muita surpresa” na retomada das atividades no setor de serviços que também estão contribuindo para essa nova onda de revisões.
“Em termos de PIB, a nossa projeção atual deve sair em breve, acima de 2%, e os indicadores estão saindo para cima”, afirmou Campos Neto, que admitiu que o cenário é de desaceleração da economia global. Ele reforçou ainda que, diante da reorganização das cadeias produtivas mundiais, há uma grande oportunidade para o Brasil se inserir nesse novo cenário geopolítico.
Apesar de reconhecer os riscos das pressões inflacionárias globais, o presidente do BC admitiu que ainda existe muita incerteza sobre a inércia da inflação para 2023 e, por conta disso, o Banco Central mudou o horizonte relevante da política monetária para o início de 2024, após elevar a taxa básica da economia (Selic) de 13,25% para 13,75%, em agosto, e deixar a porta aberta para uma nova alta nos juros básicos. “Tivemos nossos próprios desafios, mas estamos com a inflação abaixo da média global”, frisou.
Uma das principais surpresas na economia brasileira neste ano, segundo Campos Neto, vem ocorrendo no mercado de trabalho, que está aumentando o número de contratações, apesar da redução na renda. Assim como o ministro Paulo Guedes, o chefe do BC prevê queda na taxa de desemprego em torno de 8% no fim do ano.
“A gente vê a indústria um pouco parada, abaixo do nível pré-pandemia, mas serviços se recuperando forte. O mercado de trabalho é uma grande surpresa e a criação de vagas também foi uma surpresa positiva. Nós devemos ter um número (de desemprego) abaixo de 9% nas nossas projeções. Teve troca de renda mais alta por renda mais baixa, mas uma coisa saudável é o aumento da contratação”, disse.
Autonomia do BC
Apesar de ter mandato fixo e poder ser reconduzido no próximo governo devido à aprovação da autonomia do BC, Campos Neto disse que não pretende continuar à frente da autoridade monetária. O mandato termina em 2024.
“Quem me conhece sabe que fui a favor de retirar a recondução. Não é saudável, porque cria uma fragilidade no meio do mandato e o presidente do BC fica exposto à vontade do Executivo. Se dependesse de mim, não tinha recondução na lei de autonomia do BC”, afirmou.
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