CB.AGro

Revolução na cultura do café

Sequenciamento genético feito pela Embrapa abre caminho para controle biotecnológico da principal praga da lavoura

O bicho mineiro é pequeno, mas capaz de causar grandes estragos no agronegócio brasileiro. Conhecido pelo nome científico leucoptera coffeella, é o principal inimigo da cultura do café no Brasil, maior produtor mundial da commodity. Trata-se de uma mariposa de menos de 1 milímetro de comprimento — atualmente combatida à base de produtos químicos, que provocam efeitos nocivos ao meio ambiente. Agora, porém, uma nova perspectiva se abre para o controle mais eficiente e sustentável da sanidade dos cafezais, a partir do sequenciamento genético do inseto por um grupo de pesquisadores da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia.

O trabalho vai permitir o desenvolvimento de produtos biotecnológicos para combater a praga, segundo explicou Erika Albuquerque, integrante do grupo de pesquisadores que decifrou o genoma do bicho mineiro, em entrevista, ontem, ao programa CB.Agro, parceria entre o Correio Braziliense a TV Brasília. "Nós estamos reunindo informações do DNA do bicho mineiro. Ou seja, fizemos o genoma dessa praga do café que causa muitos prejuízos à cafeicultura brasileira. Nós temos o projeto em andamento, com várias possibilidades da geração de produtos biotecnológicos. Para isso, precisamos de informações a nível molecular. Fizemos esse estudo em parceria com vários colaboradores e montamos um banco de dados que estamos explorando para gerar soluções e inovação para a cadeia cafeeira", detalhou Erika Albuquerque.

O café é um dos principais produtos do agronegócio brasileiro. O país exportou 39,6 milhões de sacas de 60kg e obteve uma receita cambial recorde de US$ 8,12 bilhões, com embarques para 121 destinos, na safra 2021/22, encerrada em junho passado. Em relação à temporada anterior, o desempenho representou queda de 13,3% em volume, mas crescimento de 38,7% em valor. Os dados fazem parte do relatório estatístico mensal do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé).

Prejuízos

Erika Albuquerque explicou que o ataque do bicho mineiro, na fase de lagarta, provoca desfolhamento drástico (até 100%) nas plantas, resultando em prejuízos de até 72% na produção de café. Desse modo, o primeiro ciclo do inseto tem que ser controlado com eficiência para evitar que outros ciclos ocorram ao longo do ano. "O bicho mineiro é uma praga que veio da África com o café. Ele come, especificamente, a folha do cafeeiro e interfere na capacidade da planta de se manter, podendo provocar até a morte dela, caso não seja controlado", esclareceu.

"O controle da praga, em geral, é químico, feito com produtos convencionais que prejudicam o meio ambiente e a vida humana", acrescentou a pesquisadora. Além disso, "o problema pode ser agravado pela capacidade do inseto de desenvolver resistência, levando os inseticidas a perderem efetividade".

De acordo com Erika Albuquerque, o grupo de pesquisadores pretende apresentar o trabalho em congressos nacionais e internacionais. "Eu imagino que outras pessoas e instituições também venham nos procurar para dar novas ideias sobre como usar essas informações. Além do sequenciamento do DNA, fizemos sequenciamentos complementares do bicho mineiro. Nossa pesquisa pode ajudar, porque podemos contribuir para a sustentabilidade do negócio e para a competitividade no mercado internacional. Quanto mais conhecimento nós temos, maior a chance de desenvolver produtos específicos para esse inseto, sem interferir em outros que não queremos atingir, como as abelhas", destacou.

A pesquisa

A falta de informações mais detalhadas sobre a sequência genômica do bicho-mineiro era um dos maiores obstáculos para o controle da praga. Para conhecer melhor não só o comportamento da mariposinha, que, na fase de lagarta, devora uma planta inteira sem dificuldade, os pesquisadores passaram a trabalhar com os dados do genoma (conjunto completo dos genes) e transcriptoma do inseto (genes em uso), analisando órgãos, tecido ou linhagem celular. Essas informações permitirão, a partir de agora, estudos moleculares de genes alvo para o combate eficiente à infestação dos cafeeiros.

A pesquisadora espera que parcerias com outras instituições ou empresas, públicas ou privadas, possam acelerar as pesquisas. "Com esse apoio, a gente pode ter ações de desenvolvimento mais rápidas. Fizemos colaborações com outras unidades da Embrapa, com universidades, e nós tivemos esse resultado que continua abrindo novas possibilidades de pesquisa com esses parceiros", disse. As demais etapas do projeto, segundo a pesquisadora da Embrapa, apontarão não só os biocidas contra a praga, mas também um conjunto de soluções tecnológicas que poderão ser usadas, com outros defensivos, como parte de sistemas de manejo integrado de pragas do cafeeiro.