Lisboa — Apesar da ligeira melhora observada nos indicadores, a disparidade de gêneros continua assustadora em todo o mundo. Dados divulgados ontem pelo Fórum Econômico Mundial apontam que serão necessários 132 anos para que homens e mulheres tenham as mesmas condições de vida, seja em termos de renda, seja de acesso à educação e à saúde e em participação política. Em relação a 2021, esse fosso diminuiu em quatro anos. No Brasil, o quadro ficou estagnado, e o país aparece na 94ª posição entre 146 nações pesquisadas. Quando o recorte é a América Latina e o Caribe, o Brasil está à frente somente de Belize e Guatemala, em 20º lugar.
Segundo Saadia Hahidi, diretora Administrativa do Fórum, não bastasse a redução mínima na disparidade de gêneros, as mulheres passaram a enfrentar mais um desafio: a disparada da inflação. Como, em geral, já ganham menos que os homens, elas veem o poder de compra diminuir mais rapidamente. "A crise do custo de vida está impactando desproporcionalmente as mulheres após o choque das perdas do mercado de trabalho durante a pandemia e a contínua inadequação da infraestrutura de atendimento", disse ela, que vê as mulheres também como maiores vítimas de conflitos armados, como o na Ucrânia, e de mudanças climáticas.
Para a executiva, diante da fraca recuperação da economia — o risco de recessão global é cada vez maior —, governos e empresas devem priorizar dois conjuntos de esforços: políticas direcionadas para apoiar o retorno das mulheres ao mercado de trabalho e desenvolvimento de talentos femininos nas indústrias do futuro. "Caso contrário, corremos o risco de erodir permanentemente os ganhos das últimas décadas e perder os futuros retornos econômicos da diversidade", afirmou Saadia Zahidi. Ela destacou ainda que o rendimento médio das mulheres encolheu 1% no ano passado e o dos homens, 7%. Por isso, a ligeira melhora nos indicadores. O ideal seria que a renda das trabalhadoras subisse mais do que a do público masculino de forma contínua.
O relatório do Fórum aponta que das 146 economias pesquisadas, somente uma em cada cinco conseguiu diminuir a desigualdade de gênero em pelo menos 1% no ano passado. Assim, embora ganhos tenham sido obtidos, a redução de apenas quatro anos pouco compensa o revés de toda uma geração registrado em 2020-2021, no auge da pandemia. Agora, pelos dados atuais, em vez de a paridade de gênero ser atingida em 2158, será alcançada em 2154, caso o mundo continue trabalhando lentamente nesse sentido. Os cinco países com menor desigualdade de gênero são, pela ordem, Islândia, Finlândia, Noruega, Nova Zelândia e Suécia. Já os com maior disparidade são Afeganistão, Paquistão, República Democrática do Congo e Chade.
Revés na política
Ainda que tenha ficado estagnado no Relatório Global de Desigualdade de Gênero, que está na sua 16ª edição, o Brasil aparece em ótimas condições quando os indicadores são abertos. No item que trata de educação, o país aparece no topo do ranking, empatado com 20 nações. O mesmo ocorre em relação ao acesso à saúde e à sobrevivência — empate com 28 países. O que faz o Brasil despencar no cálculo final do levantamento são a participação e as oportunidades para mulheres no mercado de trabalho (85º lugar) e a presença delas na política. Nesse quesito, o país aparece na 104ª posição. O documento cita que, no Senado brasileiro, dos 81 eleitos, somente 12 (14,8%) são mulheres.
O Brasil, ressaltou o Fórum, é lar de mais de 108 milhões de mulheres. Portanto, é preciso que a participação política delas seja maior. Na atual disputa pela Presidência da República, apenas três mulheres aparecem no páreo, até agora, sem qualquer condição de vitória: Simone Tebet (MDB), Vera Lúcia (PSTU) e Sofia Manzano (PCB). O relatório destacou também que essa minguada participação das mulheres em cargos eletivos acontece a despeito de o país ter um sistema de cotas obrigando que, no mínimo, 30% das candidatas ao Congresso sejam do sexo feminino.
No entender da diretora do Fórum Econômico Mundial, há muito a ser feito por todos os países no sentido de tornar as economias e as sociedades mais diversas. Mas é preciso vontade política. "Entre 2021 e 2022, o subíndice de participação econômica e oportunidade aumentou 1,6%, baseado principalmente em ganhos para mulheres em cargos profissionais e técnicos e na diminuição da diferença salarial, mesmo que a desigualdade de gênero na força de trabalho tenha aumentado", frisou. Para o subíndice de saúde e sobrevivência, houve uma pequena melhora, enquanto o subíndice de escolaridade caiu e o empoderamento político estagnou", acrescentou.