Por ampla maioria, o Parlamento Europeu aprovou, ontem, uma nova legislação sobre mercados e serviços digitais. O pacote é composto pela Lei de Mercados Digitais (DMA) e a Lei de Serviços Digitais (DSA), que impõe obrigações, direitos e proibições para conter o poder de mercado dos gigantes da tecnologia. O projeto deve impactar diretamente Google, Apple, Meta (ex-Facebook), Amazon e Microsoft, além de empresas como Booking, de reservas on-line, e até mesmo a rede social TikTok. A legislação também exige que as plataformas aumentem a fiscalização sobre conteúdo ilegal na internet.
O projeto havia sido apresentado em dezembro de 2020. Segundo os legisladores europeus, a ideia é pôr fim aos abusos de poder dos gigantes digitais. "Essas big techs estão adquirindo mais poder, muitas vezes, do que a maioria dos estados nacionais, inclusive da União Europeia (UE). Então, sentiu-se necessidade de regulá-las especificamente, devido à sua influência na democracia e na forma como o mercado se comporta, tanto na manipulação do gosto dos consumidores, quanto na influência política e eleitoral", explicou Tainá Aguiar Junquilho, doutora em direito digital e professora do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP).
A DMA deve exigir que as empresas tornem os serviços de mensagens interoperáveis e forneçam aos usuários corporativos acesso a seus dados. Esses usuários seriam capazes, assim, de promover produtos e serviços concorrentes e chegar a acordos com clientes fora das plataformas. As empresas também não poderão favorecer os próprios serviços em detrimento dos rivais ou impedir que os usuários removam softwares ou aplicativos pré-instalados, duas regras que devem afetar duramente o Google e a Apple. A norma vai instaurar a possibilidade de escolher entre várias lojas de aplicativos, o que permitirá evitar a App Store, da Apple.
Já a DSA proíbe a publicidade direcionada a crianças ou baseada em dados confidenciais, como religião, gênero, raça e opiniões políticas. Os chamados "dark patterns" (padrões obscuros), táticas que induzem as pessoas a fornecerem dados pessoais para empresas on-line, também serão proibidos.
Dúvidas
A regulação europeia só deve entrar em vigor no próximo ano, e a capacidade de execução é a maior dúvida acerca do pacote legislativo. A UE criou uma força tarefa de cerca de 80 pessoas para a aplicação e fiscalização das duas leis. "Muitos perguntam se o pacote legislativo vai ser, de fato, eficiente. Isso vai depender da UE ter braço para fiscalizar esse conjunto de leis", disse a advogada Tainá Junquilho.
Um ponto crítico para a aplicação da legislação é a definição dos critérios para classificar uma plataforma como "sistêmica", ou "guardiã", empresas de tal porte que eliminam a concorrência e atuam basicamente à margem das regulamentações vigentes. O parâmetro para classificar uma empresa como sistêmica é a existência de "mais de 45 milhões de usuários ativos" na União Europeia. As empresas que se enquadrarem nesta definição serão auditadas anualmente por órgãos independentes e permanecerão sob a supervisão da Comissão Europeia.