A desaceleração da inflação oficial de maio divulgada, ontem, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) é uma boa notícia, mas quando se olham a fundo os dados do órgão ligado ao Ministério da Economia, o quadro não é tão animador.
A alta de 0,47% no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficou abaixo da taxa de 1,06%, de abril, e dos 0,83% de maio de 2021. Além disso, foi menor do que a mediana das previsões do mercado, de 0,60%, devido à desaceleração dos preços de alimentos, energia elétrica e gasolina.
Contudo, o dado ainda reflete uma carestia bastante espalhada na economia, porque 72% dos itens pesquisados pelo IBGE registraram aumento de preço no mês passado — percentual bastante elevado, apesar de menor do que os 78% de abril. Isso significa que não são apenas os preços dos alimentos e dos combustíveis que continuam subindo, mas a grande maioria de produtos e serviços consumidos pelos brasileiros. Logo, ainda vai demorar para o dragão da inflação ser domado.
"A disseminação da inflação ainda é muito elevada e, tirando o grupo alimentação, ela continua ainda alta. As pressões inflacionárias estão bem espalhadas na economia", alertou o economista Andre Braz, coordenador do Índice de Preços ao Consumidor do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre).
Segundo ele, se não fosse a desaceleração dos preços da gasolina e a queda de quase 8% na energia elétrica, o IPCA de maio teria fechado o mês passado acima de 0,80%. "Essa contribuição para a desaceleração do IPCA de maio foi pontual, e isso não quer dizer que a inflação mudou e a política monetária já esteja fazendo efeito", disse Braz.
De acordo com especialistas, em junho, a inflação deverá acelerar novamente. Pelas estimativas do Banco Original e da LCA Consultores, o IPCA vai avançar 0,63% neste mês, refletindo o fim dos impactos baixista da conta de luz e o reajuste nos planos de saúde em mais de 15% autorizado pelo governo. Analistas ainda lembram que alta da taxa básica de juros, promovida pelo Banco Central desde março de 2021, só deverá impactar a inflação na segunda metade deste ano.
Até lá, o IPCA continuará em dois dígitos. Eduardo Vilarim, economista do Banco Original, que manteve a previsão de 9,2% para o índice de 2022 após os dados de maio, disse que a instituição prevê inflação acima de 10% até setembro.
Reajustes por todo lado
Dos nove grupos pesquisados pelo IBGE, oito tiveram aumento de preços, com exceção de habitação, que registrou deflação de 1,70% por conta da volta da bandeira verde na conta de luz. O resultado de maio foi impulsionado pelo grupo de transportes, que avançou 1,34% e respondeu por 0,30 ponto percentual (63%) da variação do IPCA, puxado, principalmente, pelas passagens aéreas, que subiram 18,33% no mês e acumulam alta de 88,65% em 12 meses. Já o grupo alimentação apresentou inflação de 0,48%, abaixo dos 2,06% registrados em abril.
"Apesar da surpresa por conta da desaceleração mais acentuada nos preços dos alimentos, a inflação ainda está bastante disseminada", reforçou Vilarim. Ele lembrou que, em serviços, a categoria que mais demora para cair, os preços continuam subindo e não devem parar tão cedo.
A equipe do Original prevê mais duas altas na taxa básica de juros, sendo 0,50 ponto percentual na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) da próxima semana, para 13,25% ao ano, e, mais 0,50 ponto percentual em agosto, para 13,75%, patamar em que deverá encerrar o ano, caindo até 10% no fim de 2023.
Planos de saúde
Eduardo Velho, economista-chefe da JF Trust Gestora de Recursos, lembrou que, apesar da desaceleração em maio, a inflação ainda está alta. A partir de junho, não haverá mais a contribuição baixista da energia e, para piorar, virá o impacto do reajuste nos planos de saúde.
"Passamos pelo pico de abril. Agora, o Banco Central tem argumento para desacelerar a alta dos juros, mas não será suficiente para tirar a inflação desses patamares elevados", alertou. Velho estima o IPCA em 9,45% e afirma que, mesmo se o governo conseguir zerar todos os tributos sobre os combustíveis, a inflação chegaria a 8,64% no fim do ano, ainda bem acima do teto da meta, de 5%.