O corte de 14,5% anunciado pelo governo no Orçamento do Ministério da Educação, correspondente a R$ 3,2 bilhões em investimentos discricionários nas universidades e institutos federais, surpreendeu a comunidade acadêmica de todo o país, uma vez que as instituições já estão com quase todo o orçamento comprometido neste ano. É o caso da Universidade de Brasília (UnB), que já empenhou 99,7% dos recursos que deveria receber do Tesouro e, agora, terá que lidar com um bloqueio de R$ 36,6 milhões.
Também são aguardadas reduções nos ministérios da Ciência e Tecnologia, de R$ 2,9 bilhões, e na Saúde, com R$ 2,5 bilhões. Os recursos, segundo o governo, serão remanejados para garantir o reajuste de 5% nos salários dos servidores federais e o pagamento de outras despesas imprevistas. A Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) reuniu o colegiado, ontem, para discutir formas de mobilização que possam reverter os cortes. Para a entidade, o bloqueio de verbas é um "severo golpe" na saúde financeira das universidades.
De acordo com a reitora da UnB, Márcia Abrahão,"a única solução" é a reversão do contingenciamento. "Estamos com uma inflação alta e com contratos sendo reajustados por força de convenções coletivas. Enfrentamos um grande risco de colapso das instituições", disse Abrahão. "Os reitores estão bastante indignados, diante de situações dramáticas, e unidos, com voz muito firme sobre o que fazer. Vamos tentar agendas com ministros, no parlamento, entrevistas coletivas com o máximo de reitores presentes, mobilizando a opinião pública", explicou.
A reitora descarta paralisações institucionais. "Nós não trabalhamos com a suspensão de aulas por questão de sobrevivência da instituição. Os cortes atingem investimento, custeio, assistência estudantil, portanto, não temos outra opção a não ser buscar os recursos", acrescentou Márcia Abrahão.
Em nota, a UnB explicou que os orçamento da instituição "é direcionado basicamente a investimentos em ciência, como compra de equipamentos de laboratório e livros, assim como para a manutenção das atividades, com o pagamento de serviços básicos, como água e luz, além de garantir a permanência de estudantes em situação de vulnerabilidade socioeconômica".
Aluno do sexto período de direito, Victor Carvalho, 25 anos, destacou a preocupação com a possível suspensão de serviços de assistência universitária, como alimentação e poio para a aquisição de equipamentos de inclusão digital. Victor recebeu por dois semestres o auxílio alimentação de R$ 400 que a UnB forneceu a estudantes, no primeiro ano da pandemia.
"Nos grupos de estudantes, há muitas dúvidas sobre o que vai acontecer e quais os riscos para os programas de assistência", explicou Carvalho, que também é diretor de Assistência Estudantil da União Nacional dos Estudantes (UNE).
A crítica aos cortes veio também de dirigentes de outras universidades. Os reitores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMT), destacaram que o contingenciamento compromete o funcionamento e a manutenção das instituições.
Ciência e Tecnologia
Dos R$ 3 bilhões do corte no Ministério de Ciência e Tecnologia (MCTI), ao menos R$ 2,5 bilhões devem ser retirados do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), voltado ao fomento à pesquisa. O corte de verbas reduz para menos da metade o valor aprovado pelo Congresso Nacional para o FNDCT em 2022, de R$ 4,5 bilhões — uma queda de 44,76% em comparação com o orçamento liberado em 2021.