Petrobras

Mercado reage mal a ação do governo de trocar comando da Petrobras

Para analistas, troca de comando na estatal reflete objetivos políticos do presidente Jair Bolsonaro. Papéis têm queda na bolsa

O mercado reagiu mal ao anúncio de mais uma troca de comando na Petrobras. As ações da estatal operaram em queda nas bolsas de valores do Brasil e dos Estados Unidos, ontem, um dia após o governo informar que José Mauro Ferreira Coelho, que assumiu o cargo há apenas 40 dias, será substituído por Caio Paes de Andrade, atual secretário de Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia.

A troca, que deverá ser acompanhada de outras mudanças na diretoria e no conselho de administração da empresa, é vista como uma interferência direta do governo na gestão da petroleira e um passo decisivo para que seja alterada a política que atrela o preço dos combustíveis ao mercado internacional. Consequência dessa política, os sucessivos aumentos da gasolina e do diesel são o maior fator de desgaste político para o presidente Jair Bolsonaro (PL), que vai tentar a reeleição em outubro.

Em nota divulgada na noite de segunda-feira, a Petrobras esclareceu que a mudança na presidência implicará na destituição dos integrantes do Conselho de Administração que, assim como Coelho, foram eleitos pelo mesmo processo de voto múltiplo na Assembleia Geral Ordinária realizada em 13 de abril passado. A estatal informou ainda que deverá realizar nova eleição para os cargos vagos, em data a ser definida. Normalmente, o processo todo pode levar de 30 a 60 dias.

Uma das idéias em consideração na Esplanada dos Ministérios é que, após as mudanças, a companhia passe a trabalhar com períodos mais longos entre os reajustes de combustíveis, de modo a minimizar o impacto dos aumentos na estratégia eleitoral do presidente. Ontem, em Davos, na Suíça, onde participa do Fórum Econômico Mundial, o ministro da Economia, Paulo Guedes, classificou de equivocada a reação do mercado e foi lacônico ao comentar a mudança na estatal. "O presidente Jair Bolsonaro escolhe o ministro Adolfo Sachsida, o ministro escolhe o presidente da Petrobras", disse em conversa com jornalistas. "O Conselho da petroleira ratifica o nome do ministro escolhido e a diretora da estatal", completou Guedes. "E eles definem a política de preço dos combustíveis."

Para analistas, o sinal está dado. A Petrobras tem um sistema de governança "muito bom e muito forte, e os recentes episódios envolvendo a companhia mostram que o chefe do Executivo está preocupado somente com sua reeleição", comentou o advogado e ex-presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) Ary Oswaldo Mattos Filho.

Ele destacou que uma ingerência de fato sobre a companhia leva algum tempo para ser implementada, até que todas as regras sejam alteradas. Na prática, se aproximaria do momento das eleições presidenciais. "É uma tentativa de manipulação da empresa para atender a um objetivo meramente eleitoreiro", acrescentou Mattos Filho.

A indicação de Caio Paes de Andrade causou incerteza no mercado também por causa da falta de experiência dele com o setor de petróleo e gás, como o estatuto da Petrobras exige de seus dirigentes. Esse fato, porém, não seria um impedimento à nomeação, segundo alguns especialistas. "A Lei das Estatais tem que ser interpretada de forma razoável, na perspectiva da liberdade de exercício da atividade profissional. Caio Andrade tem uma sólida formação em gestão e administração de empresas. Integrou o Ministério da Economia. Tem robusta formação acadêmica que lhe permite administrar uma estatal do porte da Petrobras. A lei não exige especialização direta no segmento da empresa", disse Fábio Medina Osório, ex-ministro da Advocacia-Geral da União (AGU).

Caio Paes de Andrade é formado em comunicação social pela Universidade Paulista (Unip) e fez pós-graduação em administração e gestão pela Universidade Harvard (1992-1993), nos Estados Unidos. Ele também é mestre em administração de empresas pela Universidade Duke (1997-1998), também nos EUA. Foi presidente do Serpro até agosto do ano passado.

O advogado Marçal Justen Filho, do escritório de Advocacia Justen, Pereira, Oliveira & Talamini, avalia que a indicação não terá impedimentos para ser consolidada. "Não existe impedimento jurídico a que a União, como acionista controladora da Petrobras, delibere substituir um administrador (ou todos eles). A medida, se injustificada, até poderia ser enquadrada como exercício abusivo do poder de controle, acarretando a responsabilização civil do acionista controlador pelos prejuízos sofridos por acionistas e investidores. De resto, é necessário que o novo administrador preencha os requisitos exigidos na lei e no estatuto", disse.

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