O clima no Palácio do Planalto, depois da troca de comando no Ministério de Minas e Energia, foi de comemoração, inclusive da ala política ligada ao Centrão. O anúncio feito ontem pelo novo ministro, Afonso Sachsida, de que o governo vai iniciar os estudos para a privatização da Petrobras — a mais valiosa joia da coroa estatal — e da Pré-Sal Petróleo S.A. (PPSA), foi vista como uma jogada estratégica do presidente Jair Bolsonaro não só para demarcar uma linha divisória clara em relação ao seu principal oponente na corrida eleitoral, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A mudança também atendeu ao ministro da Economia, Paulo Guedes, ferrenho defensor das privatizações e da redução da presença do Estado nas relações econômicas do país. E, como bônus, o governo espera conter o avanço do projeto que viabiliza a construção de uma bilionária rede de gasodutos — chamada pela oposição de "Centrãoduto" — com recursos públicos advindos do pré-sal.
Na avaliação do entorno do presidente, a inclusão das duas estatais no Programa Nacional de Desestatização (PND) travará qualquer intenção mais imediata de transferir recursos do pré-sal para a construção dos gasodutos, que beneficiaria principalmente o empresário Carlos Suarez, controlador de quase todas as concessionárias de distribuição e transporte de gás natural no Norte, Nordeste e Centro-Oeste.
"Levar o debate para o campo ideológico foi uma carta bem jogada do baralho político", comentou um interlocutor do Palácio ouvido pelo Correio. "E ainda matou o 'Centrãoduto'; o pré-sal não vai subsidiar nada disso", complementou. A principal intenção do governo foi sair na frente no debate sobre a privatização da Petrobras, cuja atual política de preços é alvo de críticas não só da oposição quanto de setores ligados ao bolsonarismo, como o dos caminhoneiros.
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Guerra na Ucrânia
Um dos principais argumentos usados pela equipe econômica para convencer o presidente a iniciar formalmente o processo de privatização, com a inclusão das duas estatais no PND, está ligado às mudanças de curso da geopolítica decorrentes da invasão da Ucrânia pela Rússia. A busca por novos fornecedores de óleo e gás abre, na visão da equipe econômica, uma janela de oportunidade que o país não pode perder.
A crise deflagrada pela guerra ainda contribui para acelerar a transição energética nos países mais desenvolvidos — dos combustíveis fósseis para fontes renováveis. Um processo considerado irreversível, que vai reduzir gradativamente o valor do petróleo.
Na seara política, a privatização abre uma nova frente de embate com o PT. Bolsonaro "trouxe o futuro do país para o presente, enquanto Lula quer levar esse futuro para o passado", resumiu o assessor. O Palácio acredita que o tema será um dos mais importantes para o próximo Congresso, a ser eleito em outubro. E a aposta é de que esse novo Legislativo que vai emergir das urnas permanecerá com maioria de centro-direita, ligada ao liberalismo econômico.
O maior problema para Bolsonaro e a equipe econômica de Paulo Guedes será vencer a desconfiança política e do mercado sobre a capacidade de entrega do governo. Nos últimos três anos, houve avanço em algumas concessões, como rodovias e aeroportos, mas, ao contrário das promessas de campanha, nenhuma grande gema da coroa estatal foi vendida. Ao contrário, a privatização dos Correios e da Eletrobras pouco evoluiu.
Há um contexto político, de sinalizar uma agenda para o segundo mandato, mas Bolsonaro não é mais um candidato novo, o eleitor vê que não houve avanço nas privatizações. Foi um anúncio pouco crível", disse ao Correio a economista e secretária de Desenvolvimento Econômico de São Paulo, Zeina Latif. Mas ela vê mérito na volta do debate sobre privatizações neste momento, apesar de defender prioridade para questões que já estão mais adiantadas na agenda política, como as reformas tributária e administrativa.
"Não é só jogar palavras ao vento, tem que qualificar o debate, que é importante e precisa amadurecer. Eleição é para isso, também. Que estatais devemos vender? Mas essa não é a prioridade para o primeiro ano de governo. Prioridade deve ser a reforma tributária, a reforma administrativa, esse emaranhado de regras que atrapalham o desenvolvimento. Elas estão muito mais maduras para que se tomem decisões", avaliou Latif.
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