A economia inconsistente e com consequências do pós-pandemia vem achatando o poder de compra dos brasileiros. Nos últimos três anos, o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) mostrou piora nas negociações salariais. Em 2018, cerca de 9% das categorias negociaram salários abaixo da inflação, com um salto em 2021, quando esse índice chegou a 47%. Em 2022, até fevereiro, apenas 24% das categorias conseguiram ganhos reais, ou seja, acima da inflação.
Na data-base de fevereiro, 60,5% dos 119 reajustes analisados pelo Dieese até 9 de março ficaram abaixo da variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (INPC-IBGE), que serve de referência para reajustes salariais. São dados preliminares, mas, em termos percentuais, se aproximam do observado em janeiro de 2021, quando foram analisados 2.315 reajustes.
Outros 15,1% dos reajustes de fevereiro tiveram valor equivalente ao da inflação acumulada nos 12 meses anteriores. Os demais 24,4% ficaram acima do índice inflacionário medido pelo IBGE.
"A gente vê os indicadores da economia, que ainda estão patinando. Esse é um contexto que joga contra as negociações coletivas. O que a gente tem observado é que as categorias mais sindicalizadas estão conseguindo repor pelo menos o INPC. É um cenário de muita instabilidade e vai requerer muita atenção dos trabalhadores, que têm de focar no poder de compra", explica o sociólogo Luís Ribeiro, técnico responsável do Dieese.
Histórico
Em 2021, apenas 15% dos reajustes negociados resultaram em ganhos reais (acima da inflação). Outros 47% dos acordos ficaram abaixo do INPC, enquanto 38% tiveram correções exatamente conforme a inflação, ou seja, nem ganharam nem perderam.
A situação piora quando os dados atuais são comparados ao cenário de antes da covid-19. Em 2018, 75% dos reajustes ficaram acima da inflação, enquanto 9% não repuseram as perdas. Outros 16% tiveram reajustes iguais aos do INPC.
Os números do Dieese são atualizados mensalmente, conforme a data-base de negociação de cada categoria. Isso significa que, se uma categoria possui a data-base em fevereiro e fechar acordo apenas nos meses seguintes, o resultado é computado posteriormente, o que pode alterar o porcentual atual.
Pandemia
O período da pandemia não é utilizado pelo Dieese como referência para negociações salariais, uma vez que a prioridade nas negociações coletivas deixou de ser o reajuste salarial e passou a ser a proteção do emprego e da saúde dos trabalhadores.
Com o avanço da vacinação e a retomada das atividades econômicas em todos os estados, a demanda prioritária voltou a ser a questão salarial. Os índices do INPC servem de base para as negociações, ou seja, representam a perda do poder de compra de um ano para outro, que orientam os representantes sindicais quanto a um mínimo a ser pedido ao empregador nas rodadas de negociação.
Ato unificado
A celebração do 1º de Maio de sete centrais sindicais — entre elas Central Única dos Trabalhadores (CUT), Força Sindical, Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) e União Geral dos Trabalhadores (UGT) — vai ocorrer na praça Charles Miller, no Pacaembu, em São Paulo, das 10h às 19h, com shows de Daniela Mercury, Leci Brandão, Dexter, DJ KL Jay e Francisco El Hombre. O principal convidado é o ex-presidente Lula (PT), que deve discursar no evento.
De acordo com Miguel Torres, presidente da CTB, a reposição da inflação aos salários é uma das bandeiras dos trabalhadores, que atualmente debatem com os presidenciáveis a revisão da reforma trabalhista de 2017. "A reforma foi nefasta. Tudo o que prometia trazer desenvolvimento e emprego, trouxe precarização. Com isso, as condições de trabalho ficaram piores."
Atualmente, a negociação da reposição salarial enfrenta um dos principais problemas apontados pelos representantes sindicais, com a possibilidade de negociação entre patrão e empregado, sem a presença de um representante sindical. "Construir uma mesa de negociação com trabalhadores, empresários e governos, que resolva essa situação, é o caminho", disse o presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah.
Patah explica que o atual debate entre as centrais sindicais e os presidenciáveis, dos quais Lula é favorito, envolve também pensar o parlamento, conforme debatido na Conferência da Classe Trabalhadora (Conclat 2022). "Estamos trabalhando para eleger deputados. Queremos voltar a ter pelo menos 80 parlamentares", explica.
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