Um dos gigantes do agronegócio, o Brasil ainda é muito dependente da importação de insumos para a produção, em especial de fertilizantes e defensivos. No caso do primeiro, o país chega a trazer de fora mais de 90% do total necessário para tocar a agricultura local e, por isso, e em meio à guerra no leste europeu, trabalha no novo Plano Nacional de Fertilizantes, que será lançado no final deste mês. Com o conflito entre Rússia e Ucrânia se agravando a cada dia, fica a incerteza de uma interrupção no fornecimento de insumos para o Brasil, visto que as duas nações são grandes produtores de fertilizantes nitrogenados e potássicos, respectivamente.
“O grande trunfo desse lançamento é o modelo de governança, que é um conceito transgovernamental. Nós criamos o Conselho Nacional de Fertilizantes, que vai ser formado por diversos ministérios e terá a missão de monitorar o plano e, por meio de resoluções, indicar os melhores caminhos para o atingimento das metas”, disse o diretor de programas do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), Luiz Eduardo Rangel, entrevistado desta sexta-feira (4/3) no CB.Agro — parceria do Correio com a TV Brasília.
Segundo o especialista, a partir de 1997 houve um crescimento “muito vertiginoso da curva” em termos de agropecuária. O desempenho levou o país a ser um dos maiores no setor, mas com uma produção nacional de fertilizantes estagnada. Até então, havia “um certo equilíbrio entre o que nós produzíamos, importávamos e a produção nacional”.
Estratégia
Em 2008, o Brasil já havia passado por momentos de apreensão, quando os preços de fertilizantes atingiram um pico. Durante o período, foi constatado que a dependência brasileira desses insumos poderia ser um problema. “Nós fizemos um diagnóstico tentando fazer um plano de fertilizantes. Não tivemos sucesso”, contou Rangel.
Em 2019, porém, após uma decisão do governo de fortalecer a Secretaria de Assuntos Estratégicos, o Ministério da Agricultura sugeriu novamente que a questão fosse discutida. O diretor de programas afirmou que a entidade “rapidamente entendeu o risco que seria, eventualmente, uma ruptura dessa cadeia logística de produção de fertilizantes para o agronegócio brasileiro”.
Para o especialista, o Plano Nacional de Fertilizantes é um processo complexo, por isso não saiu de imediato. “A gente gostaria que fosse muito bom. Um plano de base, de infraestrutura, é um plano que visa muitos anos. Então, algumas questões precisam ser muito bem diagnosticadas para que a gente possa criar objetivos estratégicos, as grandes diretrizes do plano, propor metas e ciclos para o cumprimento dessas metas, ações para o governo durante esses ciclos, e criar os indicadores para perseguir”.
A priori, o plano vai focar em buscar e fortalecer parcerias, reapresentar modelos tecnológicos para que seja possível aproveitar o fertilizante que há disponível e fazer acompanhamento logístico.
Longo prazo
O projeto visa mudanças ao longo de vários ciclos de quatro anos cada, com o objetivo de se alinhar aos pormenores de cada governo. Portanto, os resultados só devem ser visíveis a longo prazo, conforme esclareceu Luiz Eduardo Rangel. “Propor um horizonte de 30 anos significa que nós vamos passar por vários governos, de diferentes ideologias. E a ideia do plano é que ele fosse de fato comum a todos os interesses, o interesse nacional”, ressaltou.
Atualmente, o Brasil tem três fábricas de fertilizantes — duas em pleno funcionamento (uma em Sergipe e uma na Bahia) e uma ainda parada por falta de investimento (no Mato Grosso do Sul). Com toda a capacidade produtiva das duas fábricas, o país consegue 10% a 15% do necessário para abastecer a agricultura nacional.
“Países que têm a sua agricultura forte dependem também da importação de insumos, mas numa porcentagem muito menor do que a do Brasil. O problema não é depender eventualmente de um mercado internacional se ele for fluido, competitivo. Mas é importante você ter seus instrumentos de soberania, suas chaves para poder acioná-las na medida da sua necessidade e com o tempo necessário para que você não tenha uma perda significativa de segmento econômico”, apontou o diretor do Mapa.
Confira a entrevista na íntegra:
*Estagiária sob a supervisão de Andreia Castro