Em Bonito de Minas, de 11,5 mil habitantes, município do norte-mineiro que tem o terceiro pior IDH (0,537) do estado, depois do último reajuste a gasolina está sendo vendida a R$ 7,85. O valor impôs sacrifícios à população da cidade, onde a renda média dos trabalhadores é de 1,6 salário mínimo e a renda per capita anual chega a R$ 7.204,87, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE).
Com o aumento da gasolina, moradores da cidade estão deixando de andar de veículos motorizados. “O movimento de veículos na cidade diminuiu bastante. O pessoal passou a andar mais de bicicleta. A gente também percebe que muitas pessoas voltaram a andar a cavalo”, descreve Milqueias Mota Figueiredo, assistente social, servidor público e vereador em Bonito de Minas.
Segundo Milqueias, o reajuste dos combustíveis, por impactar vários setores da economia, provocou “mudanças drásticas” na vida da população da cidade. “O impacto do aumento da gasolina em um município carente como o nosso é muito grande. Por causa do aumento do custo de vida, as famílias acabam deixando de fazer coisas que faziam antes, como frequentar os bares. O lazer diminuiu bastante. O consumo de carne também caiu”, constata.
Morador de Bonito de Minas, Valdivino Carneiro Araújo sente na pele os efeitos da alta dos combustíveis, ao mesmo tempo que acompanha o impacto do reajuste na vida de seus conterrâneos. Ele trabalha com transporte na cidade e leva passageiros até Januária (a 51 quilômetros de Bonito de Minas), para compras, tratamento de saúde, atendimento bancário ou outras atividades no município mais desenvolvido.
O motorista disse que, com o último reajuste dos combustíveis, aumentou de R$ 20 para R$ 25 o valor cobrado por passageiro no trecho Bonito de Minas/Januária. “Do jeito que a gasolina está cara, estou pagando para trabalhar. Mas, se aumentar o preço da viagem para R$ 30, as pessoas não conseguem pagar, pois o povo daqui ganha, em média, um salário mínimo por mês”, afirma Valdivino, cuja grande maioria da clientela é formada por aposentados da zona rural e beneficiários de programas de distribuição de renda do governo, as principais fontes que movimentam a renda dos pequenos municípios do Norte de Minas e do Vale do Jequitinhonha.
No Norte do estado, o quadro se repete em Santa Cruz de Salinas, de 4,074 mil habitantes e IDH de 0,577, que está entre os 32 mais baixos de Minas Gerais. O litro da gasolina na cidade chegou a R$ 7,99. A alta no preço atinge pessoas como o motorista Ronei Neres Alves. Ele transporta os moradores que vão até Salinas (100 quilômetros de Santa Cruz) à procura de consultas e exames médicos, saques bancários e outros serviços não existentes no pequeno município onde residem.
Ronei revela que, com as mudanças de preço na bomba do posto, suas despesas com combustíveis dobraram em um semestre. “Há seis meses, eu abastecia o carro com R$ 60 de gasolina e dava para fazer a viagem de ida e volta de Santa Cruz a Salinas. Agora, gasto R$ 120 pra ir e voltar. Estamos pagando para trabalhar”, reclama o motorista, que cobra R$ 50 do passageiro pelo deslocamento.
Na mesma região, em Cristália (5,9 mil habitantes e com IDH de 0,583), a gasolina está mais em conta do que em Santa Cruz de Salinas, sendo vendida a R$ 7,80. Mas o preço pesa muito no bolso dos moradores, como constata o assistente social Mailson Pereira Chaves, da prefeitura da cidade.
“O problema é que o aumento dos combustíveis eleva o custo de vida. O impacto é maior ainda em um lugar como Cristália, de baixo IDH e pouca renda. As pessoas estão deixando de comer carne para consumir alimentos mais baratos como frango e macarrão”, relata Mailson.
Ainda no Norte de Minas, na pequena Ibiracatu (5,4 mil habitantes), o litro da gasolina também chegou na casa dos R$ 8 (R$ 7,98). O aumento no preço complicou a vida de moradores como Hiane Rodrigues Magalhães. Ele mora a oito quilômetros da sede urbana, para onde se desloca diariamente de carro para trabalhar como servidor público.
De uma hora outra, Hiane viu sua despesa com o próprio transporte quase dobrar. “Antes, eu gastava R$ 10 por dia de gasolina para ir e voltar do trabalho. Agosta, o custo passou para R$ 18”, relata, lembrando que o aumento dos combustíveis impactou a vida de todo os produtores rurais do município, historicamente castigado pela seca.
A disparada no preço dos derivados de petróleo também traz dificuldades para os donos de postos de combustíveis nos municípios de baixa renda. A reclamação é de Gilvan Domingos Almeida, que administra um posto em Botumirim (foto), cidade do Norte de Minas que tem 6,25 mil habitantes e IDH de 0,602.
Depois do último reajuste da Petrobras, o litro de gasolina está sendo vendido a R$ 7,79 na localidade. “Estamos trabalhando no limite. Na verdade, a gente teria de colocar um preço maior para cobrir os custos de frete e ter algum lucro. Mas, se fixar um valor maior, a população da cidade deixa de abastecer pela falta de condição a financeira”, argumenta Gilvan.
Ele reclama que os donos de postos de lugares como Botumirim – distante 590 quilômetros de Betim, onde fica a Refinaria Gabriel Passos – pagam muito mais pelo frete, que também ficou mais alto devido ao próprio reajuste dos combustíveis: “Para o transporte de Betim até Botumirim, a gente paga R$ 0,40 pelo litro de gasolina. O custo do transporte de Betim até Montes Claros (cidade polo da região, distante 432 quilômetros) é de R$ 0,22 por litro de combustível”.
A gasolina mais cara de Minas
Coronel Murta (9,2 mil habitantes), cujo IDH é de 0,627, foi o município de baixa renda do Vale do Jequitinhonha onde a reportagem do EM encontrou o preço da gasolina mais alto: em um posto a R$ 8,49, R$ 1 a mais do que valor encontrado em Belo Horizonte; e, em outro, a R$ 8,59.
Como ocorre em outros municípios desprovidos de infraestrutura, os moradores de Coronel Murta sofrem mais ainda as consequências da carestia da gasolina pela maior necessidade de recorrer ao transporte, tendo que se deslocar à cidade mais próxima que tenha atendimento de saúde, bancos e outros serviços – no caso Araçuaí (45 quilômetros de distância). Como no pequeno município não tem banco, os moradores precisam ir até Araçuaí para fazer saques, pagamentos e outras operações.
Moradora de Coronel Murta, a professora Maria Pereira precisa sempre ir a Araçuaí para levar o filho para tratamento médico. Ela paga o serviço a um motorista de táxi. “Depois do aumento da gasolina, o preço cobrado passou para R$ 20 por passageiro. Como são duas pessoas, estou pagando R$ 80 em cada viagem (ida e volta). Ficou muito pesado”, lamenta a professora.
Ela reclama que o reajuste do preço da gasolina levou ao aumento do custo de vida dos moradores da cidade. “O município não produz quase nada. Agora, vai subir o preço do arroz, do feijão... De todos os produtos industrializados que vêm de fora”, considera Maria Pereira.
Também morador de Coronel Murta, o produtor rural Vanderlei Neres dos Santos, de 52 anos, conta que, para completar a renda, faz fretes para a zona rural do município em uma caminhonete, “Com a alta dos combustíveis, nem sei se vai dar para ganhar mais alguma coisa”, lamenta.
Vanderlei conta que sempre plantou uma rocinha de milho e feijão no seu quinhão de terra na zona rural do município. Durante anos seguidos, sofreu com a seca. “Era só chegar a época do milho “embonecar” (vingar) e o feijão florescer que vinha o sol e destruía tudo”, comenta. Com as chuvas de dezembro e janeiro, ele ficou satisfeito com a colheita nas lavouras, alegria que foi interrompida com os efeitos da “carestia” dos combustíveis. “Esse aumento veio na hora errada”, reclama o produtor rural.
Outro morador de Coronel Murta que protesta contra a disparada no preço da gasolina é Sílvio Pereira Neres Vieira, que ganha a vida com a renda do serviço de transporte da cidade até Araçuaí, cobrando, atualmente, R$ 20 por passageiro – antes era R$ 15.
Ele afirma que, com a gasolina na cidade vendida a R$ 8,49 e a R$ 8,59 o litro, não está recompensando rodar. “O que gente recebe não paga os custos do combustível”, diz Sílvio, alegando não ter como aumentar mais o valor do fretamento porque sua clientela é formada, em sua maioria, por aposentados que recebem um salário mínino por mês.
Em Araçuaí (de 37,7 mil habitantes e IDH de 0,663), o preço do litro da gasolina na bomba está R$ 8,059.
Ainda no Vale do Jequitinhonha, no distrito de Lelivéldia, no município de Berilo (11,8 mil habitantes, IDH de 0,628), a gasolina está sendo vendida a R$ 8,299. Mas já esteve mais cara, no dia posterior ao último reajuste da Petrobras, a R$ 8,50 o litro – e “baixou” em uma “promoção” do posto.
Moradora de Lelivéldia, a comerciante Rosemare Dias de Barros disse estar preocupada com o reajuste, pois, duas vezes por semana, precisa ir até Araçuaí (a 50 quilômetros da localidade) para frequentar aulas em uma faculdade particular. “Ainda não fiz os cálculos, mas depois deste aumento da gasolina a viagem vai ficar muito cara”, afirma Rosemare.
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