conjuntura

Aumento no preço dos combustíveis deve fazer IPCA disparar em março

No acumulado em 12 meses, o índice registrou alta de 10,54%. Especialistas estimam que o indicador continuará acima de 10%, pelo menos, até abril

Rosana Hessel
postado em 12/03/2022 06:00
 (crédito: ED ALVES/CB/D.A.Press)
(crédito: ED ALVES/CB/D.A.Press)

O dragão da inflação está faminto e deve abocanhar o poder de compra dos brasileiros por um período maior do que os analistas do mercado previam para este ano. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou uma acelerada do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que praticamente dobrou entre janeiro e fevereiro. Passou de 0,54% para 1,01%. Foi a variação mais elevada para o mês desde 2015.

No acumulado em 12 meses, o IPCA registrou alta de 10,54%. Especialistas estimam que esse indicador continuará acima de 10%, pelo menos, até abril ou maio. Já o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (INPC), usado para a correção do salário mínimo, subiu 1% no mês passado, acumulando alta de 10,80% em 12 meses.

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pri-1203-ipca (foto: Thiago Fagundes)

A variação do IPCA de fevereiro ficou acima das projeções do mercado, cujas medianas oscilaram entre 0,89% e 0,95%. O dado foi divulgado no dia em que entrou em vigor o megarreajuste da Petrobras nas refinarias. Analistas alertam que a pressão inflacionária deve continuar nos próximos meses, mesmo com o governo comemorando a aprovação, pelo Congresso Nacional, do projeto de lei que muda a regra de cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Na avaliação dos especialistas, ainda não há certeza de queda efetiva de preços na bomba para o consumidor.

Desde ontem, a estatal elevou em 16,01% o preço do gás de cozinha; em 18,77% o da gasolina; e em 24,93% o do diesel. O impacto desse megarreajuste não deverá ocorrer apenas neste mês, pois a defasagem na política de preços da companhia, pelos cálculos de Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), passou para 20%, no caso da gasolina, e de 19%, no diesel.

Pelas estimativas do economista Arnaldo Lima, diretor de Estratégias Públicas do Grupo Mongeral Aegon (MAG), apenas o impacto dos reajustes da Petrobras nos combustíveis será de mais de 1,0 ponto percentual no IPCA. "Se os reajustes forem repassados integral e rapidamente, apenas o impacto direto sobre o IPCA alcançaria 1,2 ponto percentual. Sob este cenário, o IPCA dos próximos meses deve saltar de 5,9% para 7,2% nas previsões do boletim Focus, do Banco Central", disse. Ele elevou de 0,55% para 1,25% estimativa para alta do IPCA de março.

Analistas lembram que vários efeitos indiretos do reajuste devem ocorrer ao longo do ano. O diesel, por exemplo, é o combustível mais utilizado no transporte de mercadorias. Logo, o frete deve subir, assim como outros custos de produção. A inércia inflacionária deverá aumentar, corroendo o poder de compra do consumidor.

Disseminação

Conforme dados do IBGE, a inflação de fevereiro foi generalizada nos nove grupos pesquisados e voltou a se espalhar pela economia. Após recuar em janeiro na comparação com dezembro, o índice de difusão passou para 75% em fevereiro. É o terceiro mês consecutivo que o índice de difusão do IPCA fica acima de 70%, patamar considerado pelos analistas como preocupante, porque fica mais difícil para a carestia diminuir.

"Esse espalhamento mostra que a proporção de itens com variação positiva está em um patamar bastante alto nos últimos três meses, o que é preocupante, porque vemos uma inflação mais persistente do que o esperado", explicou André Braz, economista do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre).

"Os dados do IPCA surpreenderam e apresentaram uma alta generalizada de preços que preocupa. Temos a indexação e a inércia voltando, e há pressão também sobre bens industriais e serviços. E a guerra na Ucrânia só tende a piorar esse quadro de choques inflacionários", alertou Roberto Padovani, economista-chefe do Banco BV.

Longo prazo

Dois grupos foram responsáveis por mais da metade da alta do IPCA (0,57 ponto percentual): Educação, por conta dos reajustes das mensalidades; e Alimentos e bebidas. Nesse último item, a cenoura despontou como o novo vilão da inflação. O preço do legume subiu 55,41%, apenas em fevereiro, e acumulou salto de 98,36%, no primeiro bimestre do ano.

"A alta dos alimentos é sazonal e tem a ver com o clima mais quente, que afeta as hortaliças, principalmente", explicou André Braz. Após o reajuste da Petrobras, o economista elevou de 6,2% para 7,5% a previsão de inflação deste ano. O economista reconheceu que o efeito da guerra ainda deverá pressionar os preços e destacou a surpresa com a inflação mais elevada dos serviços e de eletrodomésticos em fevereiro.

Fabio Romão, economista sênior da LCA Consultores, reconheceu que a aceleração dos preços dos alimentos não era esperada neste início de ano. Ele também demonstrou preocupação com o índice de difusão elevado do IPCA de fevereiro.

O economista da LCA prevê alta de 6,5% na inflação deste ano, mas reconhece que a inflação pode encerrar o ano em torno de 7%. "Apesar da perspectiva da redução da bandeira tarifária e das previsões de um dólar menos valorizado, há muito mais itens jogando a inflação para cima. Além do reajuste nos combustíveis, a guerra na Ucrânia está elevando o preço de várias commodities agrícolas, do petróleo e de seus derivados. Tudo isso e o rearranjo das cadeias globais jogam o mundo inteiro em um cenário inflacionário não apenas no Brasil", explicou.

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