Depois que a Belarus anunciou a suspensão da comercialização de fertilizantes para o Brasil, devido ao bloqueio internacional imposto à Rússia, atualmente em guerra com a Ucrânia, o Ministério da Agricultura (Mapa) anunciou medidas estratégicas para manter a produção nacional de alimentos. Dependendo da importação para tocar a agricultura, a verdade é que o Brasil desistiu de investir no mercado.
A crise da Petrobras, em 2014, mudou os rumos da produção de fertilizantes. Em janeiro daquele ano, a companhia anunciou que era “a maior produtora de fertilizantes nitrogenados do Brasil”. Naquele momento, a empresa mantinha ativas três unidades da Fábrica de Fertilizantes Nitrogenados (Fafen) no Paraná, Sergipe e Bahia, e que o projeto era parte do Plano de Negócios e Gestão 2013 e 2017.
Em nota publicada à época, a empresa avisou o mercado que estava ampliando a carta investindo em novas unidades a fim de acompanhar o crescimento do mercado. A fábrica citada ficava em Três Lagoas, no Mato Grosso do Sul (MS). Além disso, pretendia construir unidades em Laranjeiras, em Sergipe (SE), Uberaba, em Minas Gerais (MG) e Linhares, no Espírito Santo (ES).
Ocorre que, após a crise da empresa em meio à convulsão política que culminou no impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT), a estatal decidiu sair do mercado de fertilizantes e fechou as fábricas ativas em todos os locais, e passou a tentar vendê-las.
“Até o final do primeiro semestre deste ano, as fábricas de fertilizantes nitrogenados da Bahia (Fafen-BA), localizada no polo petroquímico de Camaçari (BA), e de Sergipe (Fafen-SE), na cidade de Laranjeiras, serão hibernadas. A iniciativa faz parte do processo de saída integral da produção de fertilizantes, conforme anunciado pela companhia em setembro de 2016”, diz a nota da empresa divulgada em março de 2018.
Nesse contexto, em 2020, a estatal também acabou vendendo, para o grupo russo Acron, a fábrica de fertilizantes em Três Lagoas (MS), com cerca de 80% das obras concluídas para produzir uréia fertilizante, uréia para uso industrial, amônia, gás carbônico e sulfato de amônio.
Mais uma vez por meio de nota, a empresa divulgou no último dia 4 de fevereiro que havia chegado a um acordo para as minutas contratuais e “para a venda de 100% de sua Unidade de Fertilizantes Nitrogenados III (UFN-III), no município de Três Lagoas, no Mato Grosso do Sul, com o grupo russo Acron”.
A nota dizia ainda que a “assinatura do contrato de venda depende ainda de tramitação na governança da Petrobras, após as devidas aprovações governamentais”. Enfim, a guerra entre a Rússia e a Ucrânia travou este segmento em “desinvestimento” da Petrobras.
No contexto do conflito, sanções impostas por países contrários à guerra impuseram o banimento da Rússia do sistema bancário internacional. Procurada, a Petrobras ainda não respondeu se levou tombo.
Caminhos para o Brasil
A questão dos fertilizantes não é problema recente para o governo federal, que articula governos e empresas para destravar o setor, que esbarra, inclusive, nas dificuldades da exploração mineral em territórios protegidos por legislação específica, como as terras indígenas. Em tese, o problema não é a escassez de minerais utilizados na produção de fertilizantes, mas da articulação dessa cadeia de interesses.
Procurado, o Ministério de Minas e Energia (MME) explicou que o tema é motivo de ações estratégicas da pasta. Por meio de nota, o MME informou que, em parceria com a Secretaria Especial do Programa de Parcerias e Investimentos (PPI), instituiu, pelo Decreto nº 10.657, de 24 de março de 2021, a Política de Apoio ao Licenciamento Ambiental de Projetos de Investimentos para a Produção de Minerais Estratégicos - Pró-Minerais Estratégicos.
A norma, diz o ministério, tem “a finalidade de articular ações entre órgãos públicos no sentido de priorizar os esforços governamentais para a implantação de projetos de produção de minerais estratégicos para o desenvolvimento do País”.
Além disso, o ministério ressalta a elaboração do Plano Nacional de Fertilizantes, coordenado pela Secretaria Especial de Assuntos da Presidência da República, que ainda será implementado. Para isso, atua em conjunto com o Serviço Geológico do Brasil para ampliar o conhecimento geológico, como forma de estimular a descoberta de novos depósitos de agrominerais.
O órgão firmou parceria com Embrapa Cerrados para o desenvolvimento da cadeia de agrominerais regionais para a região Centro-Oeste; e atua na estruturação de políticas de apoio à pesquisa e disseminação do uso de remineralizadores na agricultura nacional.
O Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), uma organização nacional privada e sem fins lucrativos, representa as empresas e instituições que atuam no setor, diz que o “déficit na balança comercial brasileira de fertilizantes é função não apenas da demanda aquecida do setor agrícola nacional, mas também da estrutura de produção e da deficiência de insumos domésticos. O setor envolve altas economias de escala e, embora o país tenha potencialidades, não conta com o nível adequado de investimentos”.
Assim, entre as “oportunidades” que merecem destaque está o Projeto Silvinita, no Estado do Amazonas, embargado atualmente para o cumprimento de exigências do Ministério Público Federal (MPF). Para o Ibram, o projeto “tem elevado potencial para reduzir a dependência externa do potássio, cuja implementação vem sendo buscada há vários anos”.
O instituto critica a leniência a respeito do embargo, dizendo que o projeto no Amazonas enfrenta desafios para o licenciamento, que poderiam ser equacionados no plano interno nacional, por meio de sua priorização como elemento estratégico para a soberania nacional”.
Por fim, para destravar a produção de silvinita no Amazonas, o Ibram sugere ao governo federal a criação um grupo de trabalho no âmbito da Casa Civil da Presidência, envolvendo a empresa Potássio Brasil, o Governo do Amazonas, Secretaria de Assuntos Estratégicos, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), a Fundação Nacional do Índio (Funai), Agência Nacional de Mineração (ANM), Serviço Geológico do Brasil, Petrobras, Comissões de Agricultura da Câmara e Senado, e o próprio IBRAM.
Remineralizadores
Silvinita também é chamada popularmente de potássio, mineral que está ficando escasso em Sergipe, onde ainda é explorado pela Vale, e que a reserva no Amazonas é o caminho mais animador, uma vez já identificada, de acordo com a Agência Nacional de Mineração (ANM).
Enquanto todos falam em agrominérios - todos os subprodutos que podem ser usados na agricultura de forma segura-, o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC) defende a pauta da remineralização, uma “tecnologia fundamental”, de acordo com o diretor de Geologia e Recursos Minerais do Serviço Geológico do Brasil (SGB-CPRM), Marcio José Remédio.
“Imagine que nós temos, no nosso país, centenas de milhões de hectares de pastagens. Acredita-se que cerca de 70% desse solo encontra-se em estado de degradação. A remineralização deste solo seria um passo fundamental para recuperar a área agricultável do nosso país”, comentou o diretor.
Remineralizadores de solo são insumos estratégicos que fazem com que ocorra uma maior disponibilização de nutrientes de plantas fixados ao solo – graças a eles, macro e micronutrientes podem ser repostos para as plantas. Na prática os remineralizadores de solos são produtos/insumos que promovem o aumento da eficiência dos principais nutrientes do solo.
A importância dos remineralizadores se dá principalmente na superação de dependência da importação de potássio, nitrogênio e fósforo, principais insumos para a fertilização das lavouras brasileiras. Com a remineralização, os adubos passam a ser menos necessários e a potencialização da eficácia do solo agricultável pode ser realizada apenas com insumos extraídos de dentro do Brasil. Aumenta-se a eficiência do aproveitamento dos nutrientes pelas plantas, melhorando o solo e sua atividade biológica.
“Para o Serviço Geológico do Brasil, a temática “remineralizadores do solo” é elevada a prioridade, com profundo compromisso”, explica o diretor.
Saiba Mais
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.