A elevação dos preços do petróleo no mercado internacional, em função da guerra na Ucrânia, aumentou o desgaste entre o presidente Jair Bolsonaro (PL) e a Petrobras. O chefe do Executivo tem pressionado a estatal para que a alta não seja repassada aos preços dos combustíveis nesse momento, embora as cotações do petróleo já tenham chegado a US$ 105 e, na previsão de analistas, podem ultrapassar o recorde de US$ 147,50 por barril alcançado em 2008.
A disparada dos preços é reflexo das sanções econômicas impostas à Rússia por nações ocidentais após a invasão à Ucrânia. O país é detentor da oitava maior reserva de petróleo no mundo, e deve reduzir a oferta a curto prazo. Com a alta das cotações, segundo especialistas do setor, a defasagem dos preços no Brasil em relação ao exterior deve crescer, pressionando a Petrobras para reajustar os valores cobrados no mercado interno. No caso da gasolina, a diferença é de R$ 0,50 por litro. A última vez em que a estatal modificou a tabela de preços foi em 12 de janeiro.
Na última semana, em evento no Palácio do Planalto, Bolsonaro aproveitou seus minutos de discurso para criticar a direção da Petrobras. "O diretor ganha R$ 110 mil por mês. O presidente, mais de R$ 200 mil por mês e, no final do ano, ainda tem alguns salários bonificados. Os caras têm que trabalhar. Têm que apresentar a solução e mostrar o que está acontecendo", disse o mandatário. "Ah, a gasolina tá alta... Cai no meu colo. Eu não tenho como interferir na Petrobras, mas cai no meu colo", disse, isentando-se de responsabilidade.
O professor do Departamento de Economia da Universidade de São Paulo (USP), Simão Silber, comentou que as diferenças entre o presidente da República e a Petrobras não tem razões econômicas, mas políticas. "Sendo este um ano eleitoral, e o presidente candidato à reeleição, o aumento no preço dos combustíveis tem um efeito desfavorável sobre a popularidade de Bolsonaro, que já está ameaçada pela inflação alta, pela chegada do Lula e a possibilidade de uma terceira via, que ainda está em gestação", afirmou.
Segundo Silber, o presidente e sua equipe devem criar algum tipo de subsídio para segurar os preços. "O ministro da Economia, Paulo Guedes, já declarou que aceitaria um subsídio de até R$ 20 bilhões este ano para conter o preço do diesel", observou. De acordo com o professor, "o Brasil está muito mal posicionado para enfrentar o aumento rápido do preço do petróleo".
À medida que o Brasil depende da importação de derivados de petróleo, dada a condição restrita de refino, fica sujeito às condições de oferta no mercado mundial e à variação do dólar. Segundo Otto Nogami, professor de economia do Insper em função da nova crise externa, a moeda norte-americana se valoriza e os preços dos derivados de petróleo aqui no país tendem a aumentar para cobrir os custos de produção e comercialização. "A Petrobras depende da importação destes itens para poder abastecer o mercado doméstico."
Nogami comentou que, partindo do pressuposto de que é uma empresa de mercado, apesar de ser empresa de economia mista, a Petrobras deve agir de forma a buscar uma rentabilidade que satisfaça os interesses dos acionistas. Nesse sentido, deverá manter os preços de acordo com os seus custos de produção. "Isso contraria os interesses do acionista governo. Mas, se sucumbir aos interesses governamentais para dizer que está ajudando o consumidor, a empresa pode ter perda significativa na rentabilidade, como aconteceu em passado recente", disse.
Para o economista José Kobori, do Ibmec, porém, a defasagem de preços não diz nada. "O que vale é a margem que a empresa pratica, ou seja, mesmo com o preço teoricamente defasado, a Petrobras tem uma margem líquida de quase 24%, o que é o triplo da média de margem das empresas internacionais, de 8%", afirmou.
Segundo Kabori, é necessário separar o que é o Brasil, e o que é a Petrobras. "O lucro da estatal foi de mais de R$ 100 bilhões em 2021, e isso é distribuído entre os acionistas da empresa. Já a economia do país é diretamente afetada pelos preços dos combustíveis, que são repassados para todos os setores e impactam diretamente na inflação", disse. Para combater a inflação, o Banco Central (BC) aumenta a taxa básica de juros, que esfria a economia, diminuindo o emprego e a renda. "É preciso avaliar o que esse lucro para poucos acionistas privados gera de negativo em termos de valor na economia como um todo, e na vida da população."
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