Até 2020, o setor da tecnologia crescia, em média, 12% ao ano no Brasil. Em razão da pandemia e da digitalização acelerada de processos, a área registrou um aumento de 22,9% no primeiro ano de covid-19, com investimento de R$ 200,3 bilhões. Os dados fazem parte do levantamento Mercado Brasileiro de Software — Panorama e Tendências 2021, realizado pela Associação Brasileiras das Empresas de Software (Abes), com informações reunidas pela consultoria IDC.
Tamanha expansão explicitou um problema grave: a falta de profissionais qualificados para o setor. Em 2019, chegou-se a falar em um déficit anual de 24 mil profissionais de TI por ano. O levantamento, feito pela Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) e de Tecnologias Digitais (Brasscom), estimou que o número de formados chegava a 46 mil alunos por ano, enquanto a demanda entre 2019 e 2024 deveria alcançar aproximadamente 70 mil.
A fim de analisar os avanços tecnológicos e as possíveis maneiras de driblar a escassez de profissionais, o Correio promoveu, em parceria com a Senac Faculdade de Tecnologia e Inovação, o CB Talks Live ontem. Especialistas convidados trataram do tema "Os impactos da revolução tecnológica na vida das pessoas".
"Não há mais como voltar atrás. A tecnologia, após 20 meses de pandemia, está entranhada em nossas veias. É algo que vai permanecer", destacou o presidente do Sistema Fecomércio-DF, José Aparecido da Costa Freire, na abertura do evento. Freire ressaltou que, para promover a tecnologia no mercado de trabalho, a organização busca atender às demandas em cursos e treinamentos conforme o que é pedido pelos sindicatos. "Os sindicatos demandam o que as empresas da sua base precisam", explica.
Este diálogo entre o Sistema Fecomércio, o Serviço Social do Comércio (Sesc) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac) com o mercado de trabalho é prioridade, para que as necessidades sejam de fato atendidas. "A gente busca o setor produtivo para saber o que está acontecendo lá na ponta, fazendo profissionais capacitados para que o mercado de trabalho possa voltar a acontecer", comenta a diretora regional do Senac-DF, Karine Câmara.
O evento recebeu três especialistas em tecnologia e futurismo. Eles expuseram as perspectivas da realidade digital no cotidiano dos brasileiros e como será suprida a demanda por inovação e desenvolvimento tecnológico em um mercado com baixa disponibilidade de pessoas qualificadas. Fábio Galvão, coordenador de Inovação do Senac-DF, abordou o futuro da educação diante da inovação tecnológica. Para o combate da escassez de mão de obra na área da tecnologia, ele acredita que a resposta é a educação.
Segundo o coordenador do Senac-DF, as empresas de tecnologia e inovação exigem uma capacitação cada vez maior de seus profissionais, e a educação é um diferencial no currículo: "Acreditamos que, dentro do ensino, existem conhecimentos particulares e específicos que vão ser um diferencial para a contratação do profissional. A partir do momento que ele procura educação, ele é um profissional mais bem posicionado dentro do mercado", explicou.
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Faculdade do Senac
Para acompanhar as demandas do mercado, o Senac-DF inaugurou a faculdade de Tecnologia e Inovação Senac-DF. A ideia, segundo Galvão, é "trazer essas tendências tecnológicas que estão vindo de outros países e batendo em nossa porta". Com a estrutura ampliada, mais cursos passam a ser ofertados, com ênfase nas áreas de comunicação, ciências de dados, tecnologia da informação e gestão de negócios digitais.
Tony Ventura, especialista e pesquisador de novas tecnologias, comentou sobre a maior feira de tecnologia do mundo — a CES Las Vegas. Ele ressaltou a importância das novas tecnologias serem impulsionadas pelo marketing. Citou o exemplo de empresas de educação que visitou. As instituições compravam as melhores tecnologias, mas os professores, ao tentarem utilizá-las, não conseguiam acompanhar as inovações e acabavam retornando ao método convencional. "A tecnologia também precisa de marketing para deixar as pessoas mais tranquilas e quebrar a barreira", complementou.
Já o consultor, futurista e palestrante Gilberto Lima Jr. ressaltou o futuro do comércio. Destacou o impacto da tecnologia em etapas importantes de atividades comerciais, como o tempo de entrega de uma mercadoria, ou até mesmo o consumo de alimentos. A grande responsável por tornar possível toda a revolução tecnológica é a rede Blockchain, que ajudará a promover uma tokenização da economia brasileira, um processo em que "coisas" são transformadas em ativos digitais.
"Em vez de ter todos os dados concentrados numa máquina, haverá uma computação distribuída. Fragmentos de informação antes reunidos em um banco de dados serão espalhados", explicou. A rede Blockchain garantiu, por exemplo, segurança ao sistema de criptomoedas, lembrou Lima Jr. Esse modelo inovador tenderá, segundo o especialista, a se consolidar nas atividades rotineiras de consumo.
Mercado em expansão exige preparo
Com o crescimento do setor de tecnologia em mais de 22% na pandemia, o Brasil chegou à nona posição no ranking mundial de TI em 2020. Trata-se de um mercado em expansão, que exige muito conhecimento e capacidade e começa a ser visto pelos trabalhadores brasileiros como uma aposta.
Considerando a demanda crescente por profissionais de inovação e a evolução exponencial de tecnologias, o especialista Gilberto Lima Jr. destacou que o "profissional do futuro" precisa ter a capacidade de se adaptar às mudanças por meio do aprendizado constante:
"O profissional do futuro é o que trabalha com foco, que não deixa perder a oportunidade de se conectar com o que há de mais novo na tecnologia, e que tem a capacidade de percepção de mudança, para onde estamos indo, o que está acontecendo", disse.
Além destas qualidades, existem habilidades extremamente solicitadas no mercado de trabalho da tecnologia, para as quais os profissionais que almejam atuar no setor precisam olhar com atenção. Segundo levantamento da PageGroup, empresa especializada em recursos humanos, o domínio de machine learning, data science, mineração de dados, bem como a autogestão para o trabalho (uma vez que uma parcela considerável das oportunidades surgem em regime de trabalho remoto) são essenciais para o profissional de TI.
No mercado de trabalho, empresas que põem inovações tecnológicas no centro de suas estratégias obtiveram o maior valor de mercado entre 2015 e 2020 no mundo. A informação integra a segunda edição do Technology Report, relatório global da consultoria Bain & Company. "A mensagem clara é que a tecnologia não é apenas uma indústria. Tornou-se a principal força disruptiva em toda a economia global", diz o documento.
Para as empresas que estão fora do setor tecnológico, lidar com as novidades da área ainda é um desafio. Segundo levantamento encomendado pela Dell Technologies a Forrester Consulting, metade das empresas brasileiras estão longe da transformação digital. Segundo o estudo, 73% das empresas no Brasil afirmam ter negócios orientados por dados, mas apenas 28% admitem que conseguem tratá-los adequadamente. "Hoje, a empresa que não conseguiu fazer essa adaptação digital está fadada, eventualmente, ao fracasso", frisou Fábio Galvão, do Senac-DF.