De olho em 2022

Bolsonaro faz aceno para policiais com possibilidade de reajuste

Reestruturação das carreiras e aumentos salariais para integrantes das forças de segurança custaria R$ 2,8 bilhões em 2022, e chegaria a R$ 11 bilhões até 2024. Para o presidente, é preciso "corrigir injustiças"

De olho nas eleições de 2022, o presidente Jair Bolsonaro (PL) fez, ontem, um aceno a um grupo fundamental da sua base de apoio político. O chefe do Executivo se reuniu com o ministro da Justiça, Anderson Torres, o da Economia, Paulo Guedes, e dirigentes de órgãos policiais para discutir a reestruturação e o reajuste salarial das carreiras da segurança pública. Segundo proposta da Justiça, o reajuste terá um custo de R$ 2,8 bilhões para os cofres públicos apenas no primeiro ano. O montante previsto até 2024 é de R$ 11 bilhões. A promessa de reforçar o contracheque dos policiais foi feita no Palácio do Planalto, durante o lançamento do Programa Rodovida, voltado para a redução da violência no trânsito.

O presidente afirmou que a reestruturação das carreiras é uma forma de "corrigir injustiças". As mudanças deverão beneficiar integrantes da Polícia Federal (PF), da Polícia Rodoviária Federal (PRF) e do Departamento Penitenciário Nacional (Depen).

Thiago Fagundes - pri-1512-servidores Servidores Salário

"Algumas injustiças acontecem em nossas vidas, reconheço. Não quero me eximir de responsabilidade. Nós temos que buscar corrigi-las. Se Deus quiser, teremos uma reunião bastante profícua onde possamos atender a todos vocês", completou Bolsonaro, antes do encontro com os ministros e dirigentes das corporações.

O presidente ainda destacou que é necessário valorizar as polícias. "Temos que valorizar vocês também. Não podemos ficar apenas nos discursos e nas promessas. O Brasil vive um momento difícil, pós-pandemia que, se Deus quiser, chegou ao fim. Se bem que há como consequência a inflação, o aumento do combustível, entre outras. Mas a gente vai vencer esse momento", concluiu.

Entre os presentes na reunião ocorrida pela tarde estavam Tânia Fogaça, diretora-geral do Depen; Paulo Gustavo Maiurino, diretor-geral da Polícia Federal e Silvinei Vasques, diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF).

O ministro da Justiça disse que a reestruturação deve sair em 2022. "Nossa ideia é reestruturar a PRF, criar uma carreira de verdade para eles. Mudar algumas coisas nas carreiras da PF, de agente, escrivão, papiloscopista, delegado e administrativos. E regulamentar e organizar a polícia penal. São questões que estão pendentes já há algum tempo, de regulamentação, de reestruturação. A gente chegou agora, conseguiu finalizar e vai apresentar hoje (ontem), de forma oficial, para discutir com a equipe econômica", afirmou Anderson Torres.

Ainda segundo Torres, o ministro Paulo Guedes estava ciente da intenção do governo de conceder aumento às forças policiais. "Ele já sabia. Havia essa previsão de a gente fazer isso no governo, não é segredo para ninguém. Então, assim, reagiu bem, e a gente vai conversar", disse o ministro da Justiça.

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Medida provisória

Anderson Torres afirmou que ainda não há estimativas precisas de valores ou percentuais, e que será necessário enviar ao Congresso uma medida provisória com a previsão das novas despesas no Orçamento da União. "É diferente nas diversas categorias. A PRF apresentou o projeto dela, a PF apresentou o dela. São projetos distintos. Nada disso está fechado ainda. Tem que fazer a previsão orçamentária este ano para, no ano que vem, ser apresentada uma medida provisória", emendou.

"Nós não vamos fazer nada em desacordo, nós não vamos fazer nada desalinhado com os outros ministérios, nós vamos alinhar e depois pedir", acrescentou o ministro da Justiça.

No último dia 13, Guedes recebeu Torres e os diretores-gerais das polícias, que pediram reajuste salarial. Depois, por meio das redes sociais, o ministro da Justiça postou nas redes sociais uma foto do grupo ao lado de Guedes, relatando a entrega da proposta de reestruturação das carreiras e de um ofício com pedido de aporte financeiro.

Trilha aberta para outras categorias

Com a decisão de reestruturar as carreiras e aumentar os salários dos servidores da área de segurança, o presidente da República dá um péssimo sinal sobre a falta de controle das contas públicas, de acordo com analistas ouvidos pelo Correio.

"Essa é uma decisão claramente política. Bolsonaro busca atender a sua base de apoio mais próxima", destacou o especialista em contas públicas Murilo Viana.

Como contrapartida à liberação de recursos para reduzir os efeitos econômicos da pandemia da covid-19, os salários do funcionalismo federal e dos governos regionais foram congelados até dezembro deste ano. Policiais e militares, contudo, ficaram fora da restrição.

Segundo Viana, será muito difícil para o governo, agora, negar reajustes para outras categorias. "Mesmo com a aprovação da PEC dos Precatórios, que abre espaço de mais de R$ 100 bilhões no teto de gastos, o governo terá dificuldades para atender demandas de correção inflacionária da remuneração dos servidores. Basta ver a forte pressão do Congresso para viabilizar fartos recursos com as emendas do relator e mais verbas para o Fundo Eleitoral", disse o analista. Para ele, o governo já deu a sinalização clara de que pretende priorizar politicamente dois grupos de servidores: policiais e militares.

Prioridades

Do ponto de vista da qualidade do gasto público, esse reajuste para policiais "é bastante questionável", segundo o analista. "O governo deveria priorizar, por exemplo, zerar a fila de famílias cadastradas no CadÚnico que apresentam dificuldades de acessar benefícios sociais, como o Auxílio Brasil", defendeu. O Ministério da Economia não quis comentar o assunto.

Conforme dados do Painel de Estatísticas de Pessoal da pasta, apesar do congelamento salarial e da queda de quase 2% no número de servidores desde outubro de 2020, os gastos mensais com a folha não diminuíram na mesma proporção. "No caso da União, há uma queda associada às despesas com os servidores civis, mas, no caso dos militares, que tiveram reestruturação no sistema de proteção social e reforma na carreira, o gasto vem aumentando", destacou Viana.

A economista Juliana Damasceno, da Tendências Consultoria, não tem dúvidas de que as demais categorias vão pressionar por reajustes em 2022, porque "a inflação tende a ser mais prolongada no ano que vem". Na avaliação dela, o governo está dando um tratamento "diferenciado e seletivo" para os policiais e militares. "Isso mostra a falta de compromisso com a isonomia das rubricas dentro do Orçamento. Não é apenas o poder de compra dos policiais e dos militares que está sendo corroído pela inflação de dois dígitos, mas de toda a população e todos os servidores públicos", afirmou.

De acordo com Juliana Damasceno, o governo deveria rever a estrutura de gastos e cortar os mais custosos e ineficientes. "O governo está dando mais um sinal de que está caminhando na contramão da austeridade fiscal. A PEC dos Precatórios, por exemplo, só aumenta a despesa e não vai resolver o problema dos 22 milhões de famílias que ficaram desassistidas com o fim do auxílio emergencial", lamentou.