Na mesma linha de minhas colunas mais recentes, chamo a atenção para a última divulgação dos dados mensais do PIB pelo Banco Central, onde fica claro que nossa economia está operando em total banho-maria há quase uma década, com taxas médias calculadas para os últimos 12 meses ao redor de -0,6% a.a., ante média de 3,9% em 2004-13. A manutenção desse tipo de resultado é, obviamente, inaceitável, mesmo diante dos temores relacionados com novas vertentes da covid-19, que se espera não serem mais tão devastadoras para países como o Brasil, conforme se temia inicialmente. Diante desse quadro de estagnação total, é preciso que os candidatos a presidente comecem a explicitar com maior clareza o que pretendem fazer para nos livrar dessa letargia e de outras mazelas, como a inflação em aceleração. Na verdade, é preciso que consideremos a volta aos trilhos normais, e perguntemos com mais firmeza o que o país precisa fazer para voltar a crescer de forma sustentada.
Na visão de muitos, a causa básica da crise é o velho problema fiscal, que vem se deteriorando ao longo dos anos, para cujo combate Temer criou, emergencialmente, em 2016, um teto de gastos igual à inflação decorrida, para valer durante 20 anos, e o atual governo, após alardear muitas medidas que não se concretizaram, acabou aprovando uma correta reforma das regras previdenciárias via a EC 103 do final de 2019. Só que, como essa emenda teria um efeito menos incisivo a curto prazo, especialmente por falta, ali, de medidas complementares indispensáveis, a política de cumprimento do teto de gastos tem se limitado a ajustes precários dos gastos discricionários.
Diante do excesso de compressão desse minoritário item, tais gastos somam hoje apenas 7,2% do total, e é neles que se incluem os há muito fragmentados investimentos em infraestrutura, em contraste com os supermajoritários gastos obrigatórios, rota essa que, obviamente, chega ao esgotamento em velocidade tanto maior, quanto mais expressivas forem as novas fontes de pressão sobre os gastos que costumam aparecer no radar. (Refiro-me ao clamor por maiores gastos destinados à parcela mais carente da população e a despesas elevadas, líquidas e certas, com surgimento surpreendente, como as relacionadas com precatórios judiciais).
Até agora, a maioria dos candidatos tem se limitado a repetir o bordão pró-ajuste fiscal de sempre. Só que, além de deixar de lado a defesa do teto, agora praticamente morto, precisariam entender que, mantido o diagnóstico básico, terão de explicar detalhadamente como vão atacar o ajuste não mais dos exauridos gastos discricionários, mas especialmente dos gastos obrigatórios excessivos. (Ou, então, precisariam enfrentar a opinião pública e dizer que o diagnóstico que vem sendo majoritariamente apresentado não é o efetivamente correto, algo com que, a propósito, outros e eu nos perfilamos. No meu caso, penso que, para começar, dever-se-ia trocar o teto de gastos por outro de endividamento, a exemplo do que fazem os americanos — mais sobre isso, futuramente —, e promover o equacionamento do passivo previdenciário dos regimes de servidores, algo por que outros e eu vimos nos batendo há bastante tempo).
Nada obstante, forneço informações relevantes, difíceis de encontrar nos livros convencionais de estatísticas fiscais, sobre os números da nova estrutura do gasto federal que acabou emergindo após a implementação da reforma constitucional de 1988, apresentada aqui em porcentagem do gasto total, estrutura essa que precisa agora ser ajustada do jeito certo (com menor destinação ao que chamei de a Grande Folha e maior em investimento). Para isso, caberá, talvez, aprovar emendas constitucionais e/ou outras peças de difícil tramitação. Sem elas, se os candidatos apenas prometerem que vão ajustar os gastos, será chover no molhado. O aumento das participações percentuais de 1987 para 2018 foram: 1- Grande Folha: de 39% para 75,6% do total; 2 - Saúde, de 8% para 8,2%; 3 - Educação, de 2,5% para 2,6%; 4 - demais correntes obrigatórias: de 20,5% para 6,4%; 5 - Idem, discricionárias: de 13,9% para 4,4%; 6 - Investimento, de 16% para 2,8%, um óbvio absurdo. Sob a Grande Folha incluí os seguintes subitens: 1.1 Benefícios assistenciais e subsidiados: de 3,1% para 19,3%; 1.2 - Previdência INSS, de 13% para 34,2%; 1.3 - Previdência pública, de 6,2% para 9,4%; 1.4- Pessoal ativo, de 16,7% pra 12,7%.
Quanto ao equacionamento do passivo atuarial do regime dos servidores, devo repetir algo sobre que tenho falado bastante neste espaço, e que vale especialmente no caso de estados e municípios, que têm muito maior dificuldade de financiar deficits. A convivência com deficits previdenciários crescentes tem levado vários entes a praticamente zerar seus investimentos, algo que poderá acontecer mesmo com estados da dimensão de São Paulo, caso não se aplique a fórmula correta de correção do problema. Trata-se de criar ou fortalecer fundos de previdência mediante o aporte de ativos e recebíveis em geral, a exemplo da velha solução Previ adotada no Banco do Brasil.